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Europa: A saga do computador perdido

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Ou, como diria o Capitão Moreira, chefão da Companhia de Infantaria do BAVEX, no ano em que servi: “Se a cabeça não pensa, o corpo padece”.

Ao lado da pista, vaquinhas pastam e patos tão brancos quanto leite nadam. As cidades com nomes estranhos vão passando pela janela. São 7h30 da manhã e estou indo de Amsterdã para Paria via Eurolines, companhia de ônibus que liga várias capitais da Europa via ônibus. Os preços são sempre convidativos, mas o tempo é longo. Até onde eu previa, essa viagem deveria durar cinco horas. Deveria.

Após uma hora e meia, o motorista para em um posto de beira de estrada que oferece uma promoção de diesel pra caminhoneiros: mil litros por 15 euros. Lembro-me de ter lido que Amsterdã tem 740 mil habitantes, 600 mil bicicletas e 8 caminhões. Humm. Desço e compro um energético (não espero que ele me de asas, apenas que me mantenha em pé), chicletes e uma barra de bala de goma, a pior que já provei na vida, uma borrachinha sem graça que solta uma referencia de sabor e parece com o dia lá fora: pálido.

Ao mesmo tempo que coloco os fones de ouvido e dou play no iPod, surge a voz de Roddy Woomble e um solzinho tímido, mas que me arranca um sorriso. Uma placa na estrada avisa que estamos a 19 km da Antuérpia e começo a ter uma ideia do trajeto que estamos fazendo. Logo mais surgem placas para Gent, Brugge e Brussels. A estrada é um tapete persa. Rumst. Mechelen. Leuven.

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As 10h entramos em Bruxelas e passamos por alguns pontos turísticos da cidade (o trajeto só não passou pela Grande Praça porque não tem como, senão com certeza teríamos invadido a praça mais bonita do mundo, segundo Victor Hugo – foi ele mesmo quem disse isso? Dúvida). O ônibus para em Brussels Noord e troca de motorista. Na parada, que dura uns 25 minutos, presto atenção na rádio, que vai de Jacque Bruel e David Bowie (“This Is Not America”, e não é mesmo) até Chico Buarque (Essa Moça Tá Diferente”) e ABBA (“Mamma Mia”).

Demoramos quase uma hora dentro de Bruxelas e, na saída, passamos por dois restaurantes de comida brasileira: Exotic Afro e Pantanal Bar. Ruisbruk. Beersel. Bergen. Halle. Nesse trecho, a estrada continua excelente, apesar de exibir algumas ondulações (mas fico na dúvida se o problema é a estrada ou a condução do novo motorista). Liege. Namur. Mons. Chove e aproveito para tirar um cochilo.

Na fronteira com a França o ônibus para (nem vi quando terminou a Holanda e começou a Bélgica, mas os franceses demarcam bem seu território) e três guardas da Police Nationale conferem passaportes. Sou o primeiro, ele olha durante uns 10 segundos, folheia as páginas e diz ok. “Quem estiver ok pode ir na cafeteria enquanto conferimos”, é o que entendo do francês.

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Parto decidido a pegar uma cerveja, e na geladeira três tipos de Leffe me namoram (Blonde, Trippel e a nova Ruby), mas opto por um café. São 11h40 e só dormi três horas nesta noite. Os cubos de açúcar me fazem lembrar-se de “A Liberdade é Azul” (no making of, Kieslowiski dá uma aula sobre quanto tempo um espectador pode suportar uma cena e conta sobre a busca do cubo de açúcar perfeito que consumiria o café em 8 segundos) e voltamos pra estrada.

Aires des Enclosis. Vallenciennes. Solesmes Le Cateau. Reimes. No lado francês, tudo é mais exagerado. A grama entra na estrada (lembra a estrada pra Parati quando passamos da divisa São Paulo / Rio) e dezenas de placas de informação transformam o canteiro num shopping. Eles fazem questão de dizer a cada cinco quilômetros em qual área do país você está, e no que ela é especializada (brocados, apicultura, desenhos, aves).

A chuva aperta novamente, o cansaço me vence (mesmo após café e energético) e quando percebo já estamos nos aproximando de Paris. Estamos chegando a 7 horas de viagem, e começo a ter receio se vou conseguir pegar o setor de Achados e Perdidos do aeroporto Charles De Gaule aberto. O ônibus para em Galiani às 14h30 (após passar cerca de 10 quilômetros antes pelo Charles De Gaule), faço três baldeações para chegar a Gare du Nord, e pegar o trem para o aeroporto.

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Dou sorte e pego um trem direto. Chego ao balcão de informações, e sou desinformado. “Você tem que ir ao Terminal 3”. Chego lá, mostro o email pra outro cara de informações, que liga para o setor de Achados e Perdidos. “Você tem que ir ao Terminal 1”. Quando chego ao setor, um velhinho simpático já está me esperando. Digo em inglês que eles encontraram meu computador. “Eu não falo inglês, pardon”, ele responde em francês. Não perco a deixa: “Eu não falo francês. No problem”.

E dai em diante todas as frases serão seguidas por “no problem”: “Assine aqui: no problem”. “Olha o seu laptop: no problem”. “Tem que assinar aqui também: no problem”. “Obrigado: no problem”. Missão cumprida? Quase… agora é preciso voltar para Amsterdã. Decido abandonar a ideia do ônibus e gastar uma grana em um trem rápido, Thalys, que fará o mesmo trajeto de 7 horas do ônibus em 3 horas. Compro o ticket e parto para a Gare du Nord. O cara ainda me fala no guichê: “Ele vai direto”.

Ainda assim, na plataforma, sei lá o motivo, olho na placa de informações: “Paris, Bruxelles Midi, Brugge, Gent, Oostende”. E entro no trem. Não encontro meu vagão, e mesmo assim sento em uma cadeira como se estivesse tudo bem. Quando para em Bruxelles Midi, percebo que algo está errado. “Não era direto?”, a razão diz para o Tico (o Teco devia estar dormindo). Pergunto para um dos cobradores, e ele confirma: “Trem errado”. E me orienta. “Desce em Gent, e tenta ver se passa um trem para Amsterdã lá”. É o que faço. E não passa. Só em Antuérpia.

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Tenho 20 minutos e dou um rolê pela praça da cidade, e a primeira impressão é ótima. Volto e entro no trem para Antuérpia. Cada cidadezinha belga que passa pela janela me conquista, e fico impressionado com o tamanho da estação central de Antuérpia. Ainda tenho 10 minutos para o trem para Amsterdã (todos os cobradores foram bem compreensivos com meu vacilo), e não arrisco.

Chego a Amsterdã duas horas depois do horário que eu deveria ter chego realmente, e tenho que arrumar as malas porque meu voo para Verona é às 7 da manhã, e o primeiro trem para o aeroporto às 5h. Estou elétrico e, ao mesmo tempo, cansado. A luz do quarto se apaga às 2h13 e coloco o relógio para despertar ás 4h26, mas a muvuca na rua (a noite em Amsterdã é bem agitada, você pode imaginar) e a preocupação com o voo não me deixam dormir. Devo ter cochilado alguns minutos durante a noite, mas saio a toda para Amsterda Centraal. Penso em fotografar o lago em frente a praça, ou mesmo a estação, lindos a essa hora da manhã, mas a precaução vence. Entro no trem um minuto antes da porta fechar.

Agora, Veneza. A viagem (felizmente) está terminando…”

Ps. Entre hoje e domingo coloco em dia as histórias e os shows…

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