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Respostas sobre serviços de streaming

Respostas para Beatriz Arruda, do Jornalismo Júnior ECA/USP, para a reportagem “Serviços de Streaming: o fim da pirataria?” (leia aqui)

Na sua opinião, a que se deve a ascensão dos serviços de streaming pagos? Já que muitas pessoas, com a pirataria, não pagavam pelas músicas que consumiam.
Por estar tudo na nuvem. Essa é, definitivamente, a facilidade definitiva que os serviços de streaming propagam, ou seja, está “tudo” ali, há um clique do mouse. Claro, não é tão simples e não está tudo ali, mas é o que muita gente acredita, e talvez o que interessa a ela esteja mesmo, e dai o problema não é com o serviço, mas com a pessoa que se afundou em uma zona de conforto cultural. A questão da popularização da pirataria de MP3 no Brasil é muito fruto de não existirem bons serviços de streaming na época, e agora já existem vários. A coisa é meio análoga ao período em que decretaram a morte do jornalismo cultural, e depois se percebeu que a produção cultural é imensa e é preciso de um jornalista para fazer a curadoria selecionando o que é mais interessante. No caso da música, as pessoas começaram a baixar muita coisa sem perceber, num primeiro momento, que esses arquivos ocupam espaço, gigas, terabytes, e podem ser perdidos num bug de HD. Dai chega alguém e diz: “Olha, tudo o que você quer está aqui na nuvem”. Essa facilidade conquistou esse público porque, sinceramente, não acredito que as pessoas baixavam música só porque ela era de graça. Não, as pessoas baixavam música porque era a maneira delas ouvirem aquilo que elas queriam. Esse equivoco é mais uma pá de cal na indústria da música que nunca entendeu verdadeiramente o seu público.

Você acredita que os serviços de streaming vão acabar, de vez, com a pirataria no meio musical?
Não. 1) Porque os serviços de streaming sempre vão estar atrás nas datas de lançamentos oficiais. 2) Porque os serviços de streaming não tem todo o catálogo de música do mundo 3) Porque os serviços de streaming pagam pouco. Tudo isso pesa na balança, mas o público médio não se importa muito com tudo isso porque ele quer facilidade, e não é tão simples baixar um disco. Então quem baixa é o fã de música que quer ouvir aquilo antes, e já que a indústria é incompetente na maneira de liberar esse disco para o fã, ele dá um jeito e pega antes de que o disco saia. O livro “Como a Música Ficou Grátis”, do Stephen Witt, é recheado de exemplos que ampliam essa resposta, mas o que interessa é que o inimigo dos serviços de streaming não é a pirataria, mas sim a própria incompetência da indústria musical.

Por muito tempo as grandes gravadoras resistiram em aceitar as transformações do mercado, mas atualmente elas estão, cada vez mais, apostando na venda digital. O que impulsionou esta mudança de atitude?
Dinheiro. Na verdade, os formatos físicos ainda vendem, e muito. “25”, da Adele, está com quase 5 milhões de cópias vendidas. Isso é indústria cultural, cinco milhões de uma única matriz, é um baú de tesouro. Então mesmo quando a indústria estava reclamando muito ainda estava ganhando muito dinheiro. O problema é que quando se aprende a fechar o mês com 100 milhões de lucro e passa-se a fechar o mês com 20 milhões, o negócio complica, ainda que seja um lucro imenso. Nessa história toda é possível observar muito mais ego e incompetência do que estratégias de mercado. Se estão apostando mais na venda digital agora é porque viram algum pote de ouro no final de arco-íris. Se esse pote de ouro existe é uma outra história.

Apesar da popularidade, os serviços de streaming são constantes alvos de polêmicas, como a que envolve a cantora Taylor Swift e a questão da remuneração dos artistas. Quais as melhorias que precisam ser feitas para que se consolidem ainda mais?
Remuneração de artistas é um ponto a ser melhorado, mas é importante sempre lembrar que no mundo pós-moderno em tempos de internet nada é estanque. Estamos falando sobre streaming e tanto pode surgir um outro modelo de negócio musical que torne o streaming obsoleto na semana que vem como estamos vivendo um momento forte de volta às raízes na humanidade, o que por si só já questiona o modelo de um negócio em que, inevitavelmente, é preciso estar conectado. Talvez uma das saídas inteligentes fosse parar de observar formatos como concorrentes. Tudo é música. Claro que isso pouco importa para quem está ganhando dinheiro com isso, mas não é nessa pessoa que penso quando penso em música, e sim naquela que quer muito ouvir uma música, e vai ouvi-la de qualquer jeito. Essa pessoa – que entende a música como cultura – me interessa. O resto deixo para a bolsa de valores.

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novembro 2, 2016   No Comments