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A Nova Idade Média

“Você gasta um tempão e uma baita grana fazendo um disco e as pessoas pegam aquilo de graça.”
Jim Reid, Jesus and Mary Chain, na Revista Bravo (Novembro/2008) (aqui)

“Baixar a música pela internet é danosa, mas ajuda a divulgação. Música é fonte de renda para muita gente. Tem muitos profissionais por trás. O cara baixa e não vai comprar seu CD. Por outro lado, ajuda com a divulgação. Fazendo um balanço, ajuda mais do que atrapalha.
Zezé di Camargo na Folha de São Paulo (Novembro 2008) (aqui)

“No momento em que se vende menos música na história, escuta-se mais música do que nunca”.
Jesus Miguel Marcos, do Jornal Publico, de Barcelona (Julho 2008) (aqui)

A Nova Idade Média, por Marcelo Costa

A Indústria da Música está em coma, respira por aparelhos, mas continua vivendo em uma bela mansão repleta do bom e do melhor. Ela ainda sobrevive – e fatura milhões – em um mercado cujos dias estão contados, mas lamenta os dias de bonança que viveu décadas atrás, antes da Internet democratizar a distribuição da música e o MP3 derrubar o comércio de discos.

É interessante perceber que a discussão sobre a ética que envolve a distribuição de música pela Internet junta pessoas tão dispares quanto o frontman de uma das bandas britânicas mais barulhentas dos anos 80 com um dos baluartes da música brega sertaneja que dominou o mercado brasileiro no final da mesma década. Jim Reid e Zezé di Camargo simbolizam o homem desacostumado com os novos tempos, aquele que não percebe que o mundo mudou e que o passado é uma roupa que não nos serve mais.

O disco de vinil surgiu em 1948, substituindo os obsoletos discos de goma-laca de 78 rotações, que até então eram utilizados para vender música em série. A década de 50 marca o início da popularização da música de massa, mas foi nos anos 60 que o cenário tomou proporções estratosféricas. O disco mais vendido dos anos 50, “Elvis’ Christmas Album”, totalizou 7 milhões de cópias. Na década seguinte, o Álbum Branco, dos Beatles, somava quase três vezes aquele número: 19 milhões de cópias vendidas.

O que está acontecendo neste momento da história é que vivemos uma revolução sem precedentes, e muitas pessoas – principalmente as que vivem com os lucros da Indústria – ainda querem utilizar um método antigo e arcaico de comercializar e negociar música sem perceber que o mundo mudou, as ferramentas mudaram, e é preciso adaptar-se aos novos tempos. A Internet e as novas tecnologias facilitaram o ato de fazer música e distribuí-la. A cada dia que passa, a Indústria perde poder.

Mais do que qualquer coisa, é interessante observar que vinil, CD e fita K7 são suportes ultrapassados que só interessam a quem viveu os anos dourados da Indústria da Música. Adolescentes que desconhecem estes suportes e acostumaram-se a baixar músicas pela web nunca vão comprar um disco, pois aprenderam a ter isso de graça. Mais do que um problema ético, estamos diante de um símbolo de liberdade. Agora, cada pessoa ouve a música que quiser. Um disco a um clique do mouse.

“Como ganhar dinheiro com a minha arte?”, perguntam os músicos. Fazendo shows, caros amigos, fazendo shows. Estamos voltando à Idade Média. Estamos diante de um novo Renascimento. Naquela época, os artistas não tinham suportes que os permitiam vender sua música em série, e mostravam sua arte apresentando-se de cidade em cidade. Clichês repetidos a exaustão entram na pauta do dia: “O artista vai onde o povo está” ou “Quem sabe faz ao vivo”.

É por tudo isso que Matt Berninger, do grupo novaiorquino The National, agradeceu à Internet no show que fez em São Paulo, no Tim Festival. Foi ela quem possibilitou que as pessoas conhecessem sua música, e produtores os trouxessem ao Brasil, mesmo sem o grupo não ter tido nenhum de seus quatro discos lançados no país. O mesmo aconteceu com o grupo Spoon, show elogiado do Festival Planeta Terra, com nenhum disco lançado no Brasil, mas o público cantando em coro várias canções. Novos tempos.

Vivemos um momento extraordinário da história, um momento em que as novidades surgem todos os dias e qualquer coisa pode acontecer. É perfeitamente entendível que algumas pessoas queiram continuar vivendo como viviam há dez, vinte, trinta anos atrás, mas é preciso perceber que o mundo está mudando, e que certos dogmas precisam ser adaptados ao novo momento que está surgindo. E pensar que se a Indústria está morrendo, a Música está cada vez mais viva. O Rei está morto. Viva o Novo Rei.

novembro 16, 2008   No Comments

“Dirt Don’t Hurt”, Holly Golightly and The Brokeoffs

Quando alguém define a sonoridade de uma banda ou álbum como de garagem, uma névoa de pavor paira sobre muitos ouvintes. Holly Golightly, a dama britânica do folk que emprestou o nome da personagem principal do filme “Bonequinha de Luxo”, já avisa no título de seu novo álbum: “Sujeira não machuca”. “Dirt Don’t Hurt” é o segundo trabalho ao lado do músico Lawyer Dave (ele, sozinho, responde pela alcunha de The Brokeoffs), cuja estréia da parceria se deu em 2007 com o álbum de título genial “You Can’t Buy a Gun When You’re Crying”.

“Dirt Don’t Hurt” foi gravado na estrada, em um intervalo da turnê. O duo encontrou um estúdio na Espanha equipado com uma bela seleção de microfones vintage e de tesouros antigos para brincar, afastou os fantasmas do lugar e em cinco dias (um a mais do que no primeiro álbum) registrou as 14 canções de “Dirt Don’t Hurt”. Holly conta: “Nós estávamos um pouco cansados e sujos. Se você prestar atenção, ouvirá a lama em nossos sapatos em algumas faixas”.

Além da lama também fica audível/perceptível uma certa camada de poeira na sonoridade do duo. Os vocais são divididos enquanto Holly assume o violão e o banjo e Dave fica com a guitarra, a percussão e as demais coisas com cordas. Logo na primeira faixa, a ótima “Bottow Below”, percebe-se uma vasta semelhança do vocal de Dave com o de Mark Lanegan, o que aconchega ainda mais o ouvinte. “Up On The Floor”, o número seguinte, é uma deliciosa balada rancheira, daquelas para se ouvir por tardes a fio.

“Burn Your Fun”, com seu refrão empolgante, e a suingada “Slow Road” fazem a cama para jogar o ouvinte sobre o primeiro single do álbum, o country acelerado “My 45” que avisa no refrão empolgante: “Querida, quando eu chamar seu nome, é melhor você correr, é melhor você esconder minha 45”. Há espaço ainda para um blues climático (“Indeed You Do”), countrys aceleradissimos (“Getting High For Jesus”) e músicas tradicionais rearranjadas no porão duo (“Cuck Old Hen”, “Boats Up The River”).

Entre os grandes momentos do álbum estão “Bottow Below” e “My 45”, o countryzinho sem-vergonha movido por banjo “Accuse Me”, a boa versão para “Hug You, Kiss You, Squeeze You” (que já havia sido gravada por Stevie Ray Vaughan) e a balada “For All This”, com Holly mastigando as silabas com seu fio de voz. Holly Golightly começou sua carreira no grupo Thee Headcoatees, mas ganhou fama quando estreou solo, em 1995, e principalmente quanto fez um ménage a trois musical com Meg e Jack White na canção  “It’s True That We Love One Another”, do álbum “Elephant”.

“Dirt Don’t Hurt” é daqueles discos bonitos em que um punhado de canções executadas com paixão se tornam-se atemporais em uma arte cada vez mais marcada pelo agora. As vozes de Holly e Dave combinam que é uma beleza, o que só amplifica a qualidade do material gravado pelos dois em cinco dias de folga de uma turnê de mais de 50 datas. Produzido pelo próprio duo, “Dirt Don’t Hurt” é daqueles álbuns que correm o sério risco de grudar no seu Windows Media Player, e ficar lá por um bom tempo. Eu, se fosse você, corria o risco. Vale a pena, afinal, a sujeira não machuca.

“Dirt Don’t Hurt”, Holly Golightly and The Brokeoffs (Damaged Goods)
Preço em media: R$ 55 (importado)
Nota: 8
My Space: http://www.myspace.com/hollygolightlyandthebrokeoffs

novembro 16, 2008   No Comments