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Entrevista: Manual do Jornalismo Musical

 

por Adriano Oshiro, outubro de 2013

Existem algumas maneiras de medir o sucesso na internet. Número de visitas, quantidade de menções, conteúdo relevante, etc. Agora, junte tudo isso e ainda seja convidado a falar de seu projeto digital ao lado do editor de um dos jornais mais importantes do mundo. Esse é o caso do Marcelo Costa, criador do Scream & Yell.

Nascido em São Paulo, mas crescido em Taubaté, Costa começou a escrever um fanzine de cultura pop nos anos 90, quando ainda fazia faculdade de Publicidade. Leitor assíduo da Bizz, NME, Ilustrada e tudo quanto fosse publicação cultural da época, o jovem estudante distribuía as revistas, que fazia com a ajuda de um colega, pelo campus da universidade e ainda enviava um exemplar para os jornalistas que costumava ler nas suas publicações favoritas.

Justamente por meio dessa divulgação, foi convidado a trabalhar em São Paulo, no IG, em 1998. Ao chegar na capital, levou o fanzine impresso para a web e, desde então, toca o projeto falando de música, cinema e até sobre cerveja e viagens, já que não se limita a abordar nenhum assunto que considere interessante.

Desde que migrou para a internet, o publicitário com alma de jornalista foi repórter, editor e designer do Scream & Yell. Mas, com o site crescendo e ganhando cada vez mais espaço, começou a receber colaborações de várias partes do país. Alguns colaboradores chegaram a ser tão freqüentes que acabaram se tornando parte integrante do Scream e amigos pessoais de Costa, porém, no dia a dia, é ele quem toca o projeto.

O Scream sempre foi desenvolvido paralelamente a outros trabalhos do autor, que também passou pela redação do Notícias Populares, IG e Terra, além de colaborar para as revistas Rolling Stone Brasil, Billboard e GQ. Ainda assim, o hobby nunca deixou de ser levado a sério e, raramente, fica sem atualização.

Antes de ter um domínio próprio na web, o Scream fazia parte da plataforma HPG, um dos maiores sites de hospedagem gratuito, da época. Entre 1998 e o início dos anos 2000, a maioria dos fanzines impressos começaram a se digitalizar, aproveitando as facilidades que as plataformas de gerenciamento de conteúdo ofereciam, o que permitiu que todos pudessem criar o próprio site ou blog rapidamente.

Desde o início do projeto, Marcelo Costa teve uma preocupação em manter uma linha jornalística, contextualizando informação e oferecendo entrevistas e reportagens. As opiniões mais pessoais, o autor passou a deixar no blog Calmantes com Champagne, o que não impede que muitos conteúdos publicados ali possam ficar em destaque na capa do Scream e vice-versa.

Do fanzine ao projeto digital já se vão mais de 15 anos. A recompensa disso tudo? Ganhar um público fiel, amigos e reconhecimento profissional pelo trabalho. Em 2010, foi convidado a participar de um seminário no Itáu Cultural, com Alex Needham, editor de cultura do The Guardian. Na ocasião, o blog e o jornal ficaram lado a lado para falar sobre como construir narrativas utilizando as novas tecnologias (veja o vídeo da palestra).

Hoje, com 43 anos, o jornalista deixou o trabalho fixo, no portal Terra, para tirar férias da jornada dupla. Entre um trabalho freelance e outro, pela primeira vez, Costa pode se dedicar ao site em tempo integral e tem a chance de pensar no futuro do Scream e, quem sabe, rentabilizá-lo, como contou na entrevista a seguir.

Como foi a ideia de deixar de fazer o fanzine impresso e ir para a internet?
Quando eu publicava opiniões em um site chamado Ivox, ainda em Taubaté, fiz amizade com um cara que lia os meus textos. O portal era um site de avaliação, você via um filme e escrevia uma resenha. Então, logo quando vim para São Paulo, fomos tomar uma cerveja e levei meus fanzines para ele e, uma semana depois, o cara disse que gostou e me perguntou se eu nunca tinha pensado em colocá-los na web. Tinha acabado de chegar na cidade e, por mais que já usasse a internet na faculdade, não era uma coisa que eu tinha muita facilidade. Mas, ele acabou fazendo um site para mim, no HPG, e me ensinou a publicar textos lá. Praticamente todo mundo que tinha fanzine em papel começou a migrar para a internet, nessa época. O meu foi mais um acaso. Talvez, se o cara não fizesse o site, eu tivesse chegado sozinho em algum momento, mas ele adiantou o processo em pelo menos um ano. E como era uma coisa nova, já que haviam poucos sites na época, o negócio tornou-se muito grande. Comecei a ter entre 20 e 30 colaboradores, mesmo o Scream tendo um layout completamente assustador (risos). Tinha duas capas, que trocavam minuto a minuto, então, um conteúdo ficava em um minuto par e dava lugar para outro no minuto ímpar. Era umas dessas coisas absurdas que a gente testava para brincar com a ferramenta (risos).

Depois do HPG, como você passou para WordPress?
Eu uso wordpress desde 2007, mas ele já é “.com.br” desde de 2003. Nessa época, eu trabalhava na redação do IG de manhã e no Notícias Populares tarde e noite. Chegava meia noite em casa e ficava até as seis da manhã tocando o site. O Scream já estava “grande”, concorrendo a prêmios, mas era muito exaustivo. Até anunciei que ia acabar, mas recebi centenas de e-mails reclamando. Naquele tempo, você saia para um show do universo indie e todo mundo conhecia o site. Fiz muitas amizades e muita gente pediu para eu não desistir. Acabei parando apenas por um ou dois meses e pensei, bacana, se as pessoas querem, vou voltar e fazer uma coisa legal com isso. Desde aquele tempo ele está no ar, mas, às vezes, fica sem atualizações devido ao tempo escasso para fazer as coisas.

Você é o único editor do Scream & Yell. Nunca pensou em formar uma equipe fixa?
Não. Até tive uma experiência com colaboradores em 2005 e 2006, com dois subeditores frequentes., o Diego Fernandes, do Rio Grande do Sul, e o Leonardo Vinhas, de São Paulo. Era uma época em que o site estava tendo muitas atualizações, tinha muito material chegando e muitas bandas novas procurando a gente, apesar que, hoje, o nível é maior ainda. Daí sugeri para os dois serem os subeditores do site. Eles aceitaram e fizemos essa experiência entre seis e oito meses. O problema todo é que sociedades são fadadas ao fracasso. É um casamento que uma hora as pessoas vão se separar. Todos os principais sites daquela época acabaram, com exceção do Scream & Yell e do Trabalho Sujo… exatamente porque o Trabalho Sujo é o Alexandre Matias que, de vez em quando, aceita alguma colaboração, e o Scream & Yell, que sou só eu.

E você recebe colaboração, mesmo sem pedir. Não tem um espaço no seu blog que você pede, certo? As pessoas mandam voluntariamente?
Uma coisa que me orgulho é de nunca ter pedido, e não é um orgulho do tipo “sou fodão”, muito pelo contrário: é um orgulho das pessoas chegarem ao site e tomarem a iniciativa de compartilhar um tempo delas com outras pessoas. Tem muita gente que colabora para o site que nem conheço pessoalmente. Mas há pessoas que já tenho liberdade de pedir. Por exemplo, me oferecem uma entrevista com o Interpol, aí acabo sugerindo para algum colaborador que queira fazer. Há uma ideia do Scream & Yell ser uma diversão, não uma obrigação. Acho que seria divertido conversar com um ídolo em uma posição de jornalista. Então, se alguém me procurar dizendo que gostaria de entrevistar tal cara, vou tentar conseguir essa entrevista e faço o possível para rolar para o site.

Esses colaboradores te mandam uma pauta ou eles já enviam o texto pronto?
Muitos me mandam o texto pronto. Em média, 50 ou 60% me enviam o texto perguntando se cabe publicar. Outros chegam, assim, “escrevi para o meu blog, mas ficou tão bacana que eu acho que dá para publicar aí”. Tem muita gente que pergunta, “alguém vai escrever sobre o Nick Cave?”, num processo próximo ao de oferecer pauta, e a gente vai encaixando. Alguns temas eu debato, mas sem limitar. O Scream & Yell sempre foi uma provocação do tipo, “por que vocês estão publicando isso?”. Não tem restrições. Uma vez alguém falou assim, “por que vocês não falam de rap?”. Cara, o André Caramante foi colunista do Scream & Yell no começo. Todo mundo sabe quem ele é agora, mas ele escreveu de 2001 a 2003 para o site. A gente não tem essa coisa de “não posso falar de dança”. Há textos de dança no Scream, de teatro. Desde que esteja bem escrito e seja uma coisa um pouco mais aberta, porque é um público grande que vai ler e precisa ter umas chaves para entender tudo. Se for um texto bom e perfeitamente adaptável, cabe.

O que é adaptar um texto para o Scream & Yell?
O site tem um padrão jornalístico, um jeito de falar que é quase primeira pessoa, mas a primeira pessoa não aparece. Discordo completamente quando alguém fala que o jornalismo é impessoal, não tem como. Se você fizer uma entrevista com o Supla, por exemplo, vai sair uma coisa, se eu fizer, vai sair outra. E isso deriva do conhecimento que nós temos, que são coisas pessoais. Então, tem coisas que cabem, tem coisas que não. Tem textos que me mandam e eu transformo tudo em terceira pessoa, e falo, “olha, dá para publicar assim. Do jeito que estava, você pode publicar em um blog pessoal”.

Os textos do Scream & Yell têm limites de caracteres?
Não, quanto maiores, melhores (risos). Tem um mínimo de toques, menos de 3.000 não entra. Eu sempre tive a intenção  de provocar o leitor. No começo eram textos de 10, 15, 20 mil toques. O texto do diário de viagem do Leonardo Vinhas tem 27 mil toques, a entrevista com o Romulo Fróes tem quase 30 mil, com o Helio Flanders também. Eu sempre tento que seja no mínimo três mil e no máximo, a vontade (risos).

Você costuma acompanhar o número de visitantes do Scream?
Sim, diariamente. Tenho por volta de quatro e cinco mil visitantes diários, dá uma média de 45 mil visitantes únicos no mês.

Como foi o crescimento das visitas ao longo dos anos?
Depende do período. O recorde foi em dezembro do ano passado, que deu 68 mil visitantes únicos. No começo eram 300, 500 leitores. Só a classe indie lia mesmo. Hoje tem muita gente nova chegando e conhecendo. O Scream não tem amarras, você pode usar palavrão se ele valer a pena ser usado, ao contrário de uma grande redação, que você nunca vai poder fazer isso.

Você escolhe pautas se baseando nos seus leitores e no que poderá dar mais visualizações?
Não. Tenho uma birrinha das coisas fáceis. Quando falo mal de algo é porque eu preciso falar. Não para provocar ninguém. Gosto de provocar o leitor para tirá-lo de uma zona de conforto, me agrada muito fazer o cara pensar nos motivos de eu falar bem de tal disco e não do outro. Mas o acesso fácil não me agrada. Acho que é um leitor que vai e não volta. Mas há muitos textos polêmicos no Scream. Muitos. Desde os dez piores discos do rock nacional até textos de festivais. Só que  tento sempre puxar para uma análise crítica. No Lollapalooza, por exemplo, não interessa só ir e falar como foram os shows. Interessa o resto, o entorno. Entretenimento não é só o momento em que você está ali. Se você ver um show no Lollapalooza, no Coachella ou no Primavera Sound, o que cerca você é o que vai dizer se você vai gostar daquilo. Muita gente adora o Coachella, porque o entorno é uma vibe tão boa, te joga tão para cima que, quando você está no show, você já está extasiado. Muita gente vê um show no Brasil e fica puto porque o entorno é uma porcaria. Então isso influencia. E isso me interessa muito mais do que saber se o show foi bom ou ruim.

Falando nessa questão de festivais, o Luiz Cesar Pimentel criticou a cobertura desses eventos. O que você achou disso?
Acho que nesse caso do Pimentel houve, também, uma raiva implícita porque ele foi barrado (o que já aconteceu comigo, e agi praticamente como ele, reclamando). Jornalismo é uma coisa sensacional, só que é uma pena que o público não saiba o que acontece por trás dele. É interessante você pensar por que a Folha de São Paulo colocou uma noticia na frente e o Estadão colocou outra. Cada um puxa por um gancho. Então, é legal saber por que ele [Pimentel] pegou no pé, mesmo tendo coisas interessantes naquela crítica. Mas, tem um comentário sensacional do Pedro Só, na comunidade da Bizz sobre esse texto, que daí você percebe que tudo depende. A equipe da Rolling Stone, por exemplo, leva cinco pessoas para cobrir um festival. Uma grande revista não é como o Scream & Yell, que só fui eu e uma fotógrafa. Neste caso, você vai ficar na pista o dia inteiro, porque você é só um. A Rolling Stone tem cinco repórteres, daí um vai cobrir dois shows, outro mais dois e assim por diante. A pessoa, de repente, nem queria estar ali, só que ela tem que estar por que ela tem que trabalhar. Então, onde ela vai ficar quando não estiver cobrindo? Na sala de imprensa. O resto do tempo ela vai ficar lá porque ela não quer ver os outros shows, não interessa para ela. Por outro lado, a gente sofre de um mal sério na assessoria brasileira, há muita represália. Se você falar mal, o cara não vai te credenciar. Muito embora, credenciar não é um favor que ele esteja fazendo para você. É um dever. Só que aqui as pessoas não veem assim, mas como se você estivesse pedindo um favor. Então, vai ter o cara que vai ganhar o ingresso e só vai falar bem, assim como vai ter o outro que não vai ganhar e só vai falar mal. Tem sempre pesar o lado crítico. Você tem que saber a dificuldade que é fazer um show no Brasil, não dá, por exemplo, para você criticar a organização e falar do metrô. O metrô não é um problema da produtora, é um problema da prefeitura. Tem erros  que são cometidos pela assessoria, outros pela produtora e outros pelo próprio jornalista. Mas, de fato, precisamos discutir assessoria no Brasil à sério.

Você recebe muitos convites de assessorias de imprensa, discos e convites para shows?
Discos, relativamente. Muito mais de banda nova. Convite para assistir show eu recebo bastante. Tem muita gente que me manda coisas que eu vou ouvir só dois ou três meses depois. O compromisso que tenho é comigo e por mais que eu saiba que o artista está fazendo uma coisa nova e interessante, eu preciso lidar com o tempo que eu tenho. Sou muito mais movido por uma necessidade de exposição de ideias do que por trabalho. Se escrevo sobre o disco do The Decemberists, por exemplo, é por que eu precisava falar para as pessoas que aquele disco era sensacional.

A maioria das resenhas são motivadas pelo seu gosto pessoal?
Sim, bem provavelmente, para o bem e para o mal. Talvez com filmes eu tenha mais uma relação jornalística do que com música. Música não tenho essa pretensão, nem essa piração de ouvir a última música que vazou. O Scream sempre foi um dos últimos a escrever os textos, e sem nenhuma preocupação. Eu sei que as coisas que importam vão estar ali e não ligo para a concorrência. Acho que ninguém procura novidades no Scream & Yell, a pessoa procura uma boa ideia.

Você recebe muitos comentários de leitores?
Muita gente me escreve coisas assim, “o que você achou do disco do Nick Cave?”, “o que achou do disco dos Strokes?”…

Mas as pessoas procuram saber a sua opinião sobre o disco? Porque muita gente contesta a relevância de uma resenha crítica diante das novas mídias.
Sim, e eu acredito que isso vá acontecer cada vez mais. Chegamos em um momento em que o jornalista é, principalmente, o cara que vai selecionar o que as pessoas vão ouvir. Antigamente, ele tinha que fazer isso porque os discos não chegavam para as pessoas. Agora não. No meio de tantos discos, ele tem que dizer, “ouve isso aqui”. É a função de curadoria. Se 100 discos vazaram no último mês, ninguém vai conseguir ouvir os 100, além de nós, os malucos que escutam discos para caramba. Acho que a função do jornalista vai ser essa de filtrar, nós caminhamos para isso. É muita coisa para as pessoas, que não ouvem tanta música com a febre que a gente ouve, conseguirem acompanhar. Então, elas vão esperar alguém que avise qual é a nova banda legal.

Por que você acha que o Scream faz tanto sucesso?
Não é tanto sucesso assim, mas tem um certo respeito. Eu lembro que uma vez ouvi de um jornalista, “na internet o parágrafo é dividido em três, os textos têm que ser curtos, as pessoas não querem ler muito, etc, etc”. Mas no Scream & Yell as pessoas entram para ler textos grandes. Quando a gente começou a fazer 500 toques, a galera começou a reclamar. O público entra no Scream porque gosta do site e quer ideias para pensar. Acredito muito na vontade que as pessoas têm de ler. Talvez, não a grande maioria, mas é um público interessado e interessante.

O layout que você usa é gratuito?
Sim, o free do WordPress, que peguei e remodelei para deixar com a cara do Scream. No original, não tem aquelas quatro fotos em cima, que eu coloco na mão, no HTML.

Quais outros blogs e sites de música você costuma acompanhar?
Leio a Popload, porque adoro o Lúcio. Temos gostos diferentes, mas respeito muito o que ele faz, ele tem umas sacadas muito bacanas. Gosto muito do Floga-se, que é um cara novo na web, está aí há um ano e pouco, e tem uma opinião fortíssima, dá muito a cara a tapa e não pede credencial: ele prefere pagar o ingresso para ter isenção crítica. É interessante! O Na Mira do Groove, do Tiago Ferreira, um cara que faz umas coisas que fogem dos indies, de ficar babando por Toro y Moi. Ele é um pouco mais profundo do que isso. O Matias, do Trabalho Sujo, que é um grande parceiro, O La Ruta Norteamericana, um blog de musica do El País, que é o melhor caderno de cultura do mundo, hoje. Bate o Guardian, que está patinando há uns quatro anos. Também leio a Rolling Stone americana, argentina, mexicana e italiana.

E a brasileira?
Eu escrevo de vez em quando para a Rolling Stone brasileira, são amigos meus amigos que fazem e, muito do que a gente discute, vai parar ali.

Você pensa na divulgação dos links do Scream na página do Facebook e no Twitter?
Não, menos do que deveria. No Facebook, o Scream está chegando a 5 mil curtidas, porque não uso muito. O Twitter acho espetacular exatamente para postar links diversos, mas sem muito compromisso. Sou meio preguiçoso em atrair leitor. Gosto de cativar o leitor quando tenho um texto bom.

Você pensa em começar a monetizar o Scream & Yell?
Não só monetizar, mas sair de uma coisa independente para algo profissional. Pagar o meu salário, o dos freelas, o provedor, webmaster para melhorar as coisas. O problema é como conseguir fazer isso. Não é fácil.

Nesses 15 anos, o que você acha que o Scream & Yell trouxe de bom para a sua vida?
Só existo por causa do Scream Yell (risos). Estou aqui conversando com você porque, um dia, eu mandei fanzines para um monte de jornalistas: Ana Maria Bahiana, Lúcio Ribeiro, Marcelo Orozco, André Forastieri, Soninha, na época da MTV. O Orozco e o Lúcio que me trouxeram [para São Paulo] por curtir os meus textos e, quando pintou uma vaga, me chamaram para vir para cá. E também tem todo o entorno. Se fui jurado do prêmio da MTV, se integro a APCA, o júri do Multishow e do prêmio Bravo foi por causa do Scream & Yell. Palestro três ou quatro vezes por ano, faculdades me chamam para discutir cultura independente por causa do Scream. Recebo alguns e-mails que me fazem chorar, de pessoas que decidiram se tornar jornalistas por causa do site. Porra, é muito mais lucro do que prejuízo. Valeu muito as noites não dormidas.

Você acha que o Scream & Yell contribuiu para o jornalismo musical brasileiro?
Não sei (risos), mas espero que sim. É muito complicado achar que contribuiu de alguma forma. Acho que nós falamos de muitas bandas legais, registramos algumas coisas ali, discutimos ideias. Mostramos que é possível fazer jornalismo sério sem ser tendencioso e sem trabalhar a favor do capitalismo do mercado, da venda por pura venda.

Como você vê a cena do jornalismo musical agora?
Estamos em uma fase muito complicada. Existem pessoas escrevendo muito bem e muita gente na festa de confundir o que gosta com uma crítica. Mas tem nomes muito bons por aí, na gringa também. Estamos vivendo um furacão histórico, onde a sociedade ainda está se adaptando com a chegada da internet. Por mais que ela tenha se popularizado há uns 20 anos nos EUA e uns 12 no Brasil, a gente ainda não se acostumou a lidar com ela e isso está fazendo com que o jornalismo musical mude. A função dele, hoje, acaba voltando ao inicio, que é a de destacar o que o público precisa ouvir. Estamos com uma cena independente vastíssima em um momento em que as rádios e o mercado brasileiro de música, como a gente conhecia, estão falidos. Nenhum dos grandes jornais se relacionaram bem com a web, não conseguiram fazer um projeto do material impresso para a internet que seja relevante. Mesmo assim, acho que a profissão do jornalista cultural está cada vez mais rica. Tem muita área para trabalhar porque tem muita gente trabalhando no raso. Se você fizer um pouquinho diferente, você vai se destacar. Só que é uma batalha, não é uma coisa para você começar agora e daqui a seis meses reclamar que não estão te reconhecendo. Dei sorte de chegar em um momento em que tinham apenas três ou quatro sites bons de música na internet. Hoje você tem um monte e um melhor do que o outro. A profissão está boa e o caminho está aberto, só que as pessoas precisam ter vontade. Mais do que nunca, é preciso ter vontade.

Quais dicas você pode dar para quem está começando um blog de música?
Fugir do óbvio, do que todo mundo faz. Mas, sobretudo, um blog é um veículo de ideias. Então, você tem que ter uma luta diária para entender o que aquela obra de arte faz no seu mundo. Você tem que entender por que o Criolo estourou, por exemplo, e não falar só que a musica é boa. Musica boa tem milhares por aí. Você tem que falar sobre o contexto social, o porquê do publico pedir aquilo. Isso interessa muito mais do que saber se o disco é bom ou ruim, que é o que quase todo mundo faz. Mas isso são coisas que você só consegue chegar escrevendo.

Se você pudesse definir o Scream & Yell em algumas músicas, quais seriam?
Nossa, nunca pensei nisso, mas é uma coisa bem bacana (risos). As pessoas têm uma visão indie do Scream, que é legal, mas a gente já entrevistou o Renato Teixeira, já falamos de rap. Talvez, “Rotomusic de Liquificapum”, do Pato Fu, por ser uma canção que tem várias caras. Poderia ser também uma do Miles Davis, uma do “Bitches Brew”.

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