INSTANTE ANTERIOR
Soluções simples para um problema grave numa manhã qualquer
por Bruno Medina


Passeata contra a pirataria na Bolivia. No cartaz:
"Não mate a sua música. Não compre cds nem cassetes piratas"

Hoje vou tratar de um assunto recorrente nessa coluna, e isso provavelmente se deve ao fato desse assunto nos últimos dois anos ter tomado dimensão de urgência. A verdade é que tudo o que for falado sobre a pirataria, nesse ou em qualquer outro espaço, ainda será pouco visto o mal que está prática vem causando e a conseqüente necessidade de que alternativas surjam, e rapidamente. 

Pois bem, ontem eu estava conversando com um amigo também músico e ele me falava a respeito do último disco do Daft Punk que acenou com uma possibilidade de recurso anti-pirataria bastante interessante. No caso o cd vem com um cartão e um login único (a identificação pode ser feita num arquivo oculto dentro da sua própria máquina, evitando a re-distribuição da senha) de acesso ao complemento do produto disponível na internet. Ou seja, músicas, vídeos, entrevistas e uma série de conteúdos exclusivos são acessados pelo consumidor e considerados parte integrante do produto. No site da banda é possível baixar o "Daft Player", que é um aplicativo onde todo esse conteúdo, pode ser visualizado.

É claro que isso por si só não vai dar fim a pirataria, até porque, pelo menos no Brasil, a maioria das pessoas que compra cds pirata tem pouca afinidade com a internet e talvez nem se interessaria por um suposto conteúdo extra, mas acho que o que se pode concluir com essa iniciativa é a noção de que hoje em dia comercializar um produto que só oferece músicas é muito pouco. Num mundo de tanta oferta de informação e imagem o nosso velho cd parece mais um primo próximo do vinil do que pai do DVD. Talvez ele próprio não tenha percebido que o seu uso em larga escala pode estar com os dias contados, basta reparar que há uns dois anos atrás apenas grandes nomes da música internacional possuíam registros de áudio e imagem digitais e atualmente é possível até para nós do Los Hermanos termos o nosso. 

E assim, de repente, eu percebi que a pirataria indiscriminada de cds será vencida com maior oferta, com a melhoria do produto. Daí eu comecei a pensar em como essa melhoria poderia se tornar realidade rápido; Os cds poderiam por exemplo vir com cupons de desconto para outros produtos da mesma gravadora, ou até mesmo "vales" que seriam trocados por ingressos para shows daquele artista produzidos especialmente para os fãs. Acho que o preço, mesmo oferecendo isso tudo, ainda poderia ser menor. A tecnologia, o pro-tools, os plug-ins, vêm substituindo sistematicamente os grandes estúdios de gravação, burocráticos, desconfortáveis, impessoais, com dezenas de funcionários e mesas de som do tamanho de carros e essa revolução tecnológica também representa uma diminuição de custos que poderia e deveria incidir sobre o preço final do produto. É preciso também estabelecer uma política mais rígida de controle de preço final, ou seja, o preço que você paga pelo cd na loja, que anda caro e se torna um convite para o camelô da esquina. Nesse aspecto os Racionais MC's tiveram uma boa idéia que deveria se popularizar: no último disco deles o preço sugerido vêm impresso na capa o que torna mais constrangedor para o lojista sobretaxar o produto.  

Como vocês podem ver eu não sou um especialista no assunto mas estão aí boas idéias que poderiam ser colocadas em prática para pelo menos atenuar os efeitos da pirataria na crise do mercado. Eu continuo achando que o caminho é investir mesmo em educação para que as pessoas compreendessem que estão lesando seus artistas preferidos ao comprarem cds piratas. A pirataria hoje está presente em quase todos os países e o que diferencia os reflexos desse problema num lugar ou no outro é a população que adere ou não a prática. Quando não há procura a oferta diminui, não é assim que nos ensinaram na escola? O mercado mundial de música se acomodou e a tecnologia costuma ser implacável nesses casos. Tentando olhar por um viés positivo (se é que isso é possível) que a pirataria seja um sinal de que a era do cd convencional está acabando, de que é preciso continuar buscando meios de se oferecer um produto melhor. A outra parte a gente deixa na mão dos nossos ídolos. 

Bruno Medina, 23 anos, é tecladista da banda Los Hermanos e escreve neste espaço mensalmente. 


Leia as colunas anteriores

#1 - O Latifúndio Musical e a Dinastia do Essencial
#2 - A Bola da Vez
#3 - A Fábula do Submarino à Deriva
#4 - A Força de um Hábito
#5 - Apenas uma questão de números


Por que "Instante Anterior"? 

Conversando com uma amiga cheguei a conclusão de que a vida é a eterna iminência de algo bacana. Quando o que você mais sonhava acontece inevitavelmente você sonha com a próxima conquista e isso nos mantém vivos. Já viu um quadro do Hopper? Ninguém nunca retratou a eminência com tanto brilhantismo. Os quadros deles são como acordes tensos que não encerram uma música, como uma sétima maior que prepara o próximo acorde. "Instante Anterior" é mais ou menos isso. 


Sunday, de Edward Hopper, 1926. The Phillips Collection, Washington, D.C