DISCOGRAFIA COMENTADA
Nick Cave and the Bad Seeds

por Leonardo Vinhas
leonardo.vinhas@bol.com.br

Nick Cave costuma ser associado à canções depressivas, momentos lúgubres, narrativas macabras, etc. Se é verdade que muitas dessas ligações sejam procedentes, também é fato que essa é apenas uma das facetas desse muito comentado e pouco ouvido (no Brasil) compositor australiano. Em muitas ocasiões, ele apresenta um humor ácido e inusitado, alternando idéias musicais sempre dentro de um formato semi-acústico - as guitarras recebem o mínimo de efeitos, no máximo um wah-wah aqui, um chorus ali, um ou outro tremolo e olhe lá; baixo e bateria desempenham seus papéis sem "preparação" prévia ou alteração de timbres; as cordas e os teclados (órgão e piano, nada digital) são mais ousados nas harmonias que nos arranjos. Definitivamente, nada que permita o encaixe da banda em termos como "gótico", "pós-punk" ou clichês afins.

Comentar a discografia de Nick é tarefa capciosa, já que ele possui uma carreira extensa, iniciada em 1976 com a banda The Birthday Party e que se estende até os dias de hoje. Além da formação já citada, Cave também gravou álbuns, EPs e participações em discos com Lydia Lunch, Die Haut, Mick Harvey e outros. Aqui, será comentada sua discografia com os Bad Seeds, banda que o celebrizou e que também responde por sua maior e melhor produção musical. Sim, pois pelo que foi mostrado nas versões de Let It Be e Here Comes The Sun (você sabe de quem) presentes na trilha sonora do filme Uma Lição de Amor (I Am Sam, lançada no Brasil pela Sum Records), Cave desacompanhado não apresenta nada muito melhor que arranjos convencionais de churrascaria. Também está listada a formação que gravou cada disco, já que os Bad Seeds mudam de acordo com as necessidades musicais e relacionamentos pessoais de Nick, Mick Harvey e Blixa Bargeld (seus mais fiéis escudeiros).

A discografia toda de Nick Cave And The Bad Seeds possui edição nacional pela Paradoxx Music, com exemplares facilmente encontrados entre R$ 8,00 e R$ 12,00 nas melhores lojas - à exceção do mais recente, No More Shall We Part, lançado pela Sum e dificilmente custando menos que R$ 22,00. Que o texto abaixo ajude neófitos e até mesmo supostos conhecedores a terem uma visão mais ampla da obra de uma das melhores bandas do século XX.



FROM HER TO ETERNITY (1984)

Formação: Nick Cave (voz), Mick Harvey (bateria), Blixa Bargeld (guitarra), Barry Adamson (baixo), Hugo Race (guitarra), Anita Lane (parceria em algumas letras e na "concepção" do álbum).

A estréia das "sementes más" não ajuda em nada a dirimir a fama de Cave como um artista sombrio. O disco é opressivo, pesado, sufocante. Musicalmente sombrio e obssessivo, com letras que passeiam por ambientes sórdidos em companhia de personagens não menos. O único refresco melódico é a cover de In The Ghetto, celebrizada por Elvis em sua fase crooner de Las Vegas - mesmo assim, ela versa sobre uma criança abandonada que se marginaliza e termina assassinada pela polícia. Não que não existam ótimos momentos: a claustrofóbica Cabin Fever, o épico sombrio Saint Huck e a aterrorizante recriação de Avalanche (Leonard Cohen) respondem pela qualidade do álbum, sem contudo facilitar sua audição. O CD traz como bônus a muito superior regravação da faixa-título feita em 1987 para o filme Asas do Desejo, de Wim Wenders.

Sucessos: a regravação posterior de From Her To Eternity
Melhores faixas: Saint Huck, In The Ghetto, Cabin Fever.

Pior faixa: Well of Misery.

Preferida: Saint Huck.

Nota: 6


THE FIRST BORN IS DEAD (1985)

Formação: Nick Cave (voz e gaita), Mick Harvey (baixo, piano e guitarra), Blixa Bargeld (guitarras), Barry Adamson (bateria e órgão).

Longe do clima sinistro do anterior, mas ainda com toques mórbidos, esse é quase um álbum de blues, com fortes pitadas de rock'n'roll. Nunca a admiração de Cave pelos Stooges ficou tão clara em termos musicais, originando canções que se resumem a três ou quartos acordes atacados com fúrias e intensidades. Dessa receita, saem grandes faixas, como a violenta Train Long-Suffering e Tupelo (baseada na obssessão de Nick com a morte do irmão gêmeo de Elvis Presley logo no parto, relacionando o tema com tradições bíblicas). Nessas duas faixas debutam os vocais de apoio que mais tarde seriam marca registrada da banda. Dentre os blues quase ortodoxos, Black Crow King e Knockin' On Joe são boas amostras do que o álbum oferece. E ainda uma versão de Bob Dylan (Wanted Man) envolvida num crescendo pesado que nunca chega a explodir. Disco f*.

Sucessos: nenhum.
Melhores faixas: Train Long-Suffering, Tupelo, Wanted Man.

Pior faixa: The Six String That Drew Blood.

Preferida: Train Long-Suffering.

Nota: 9


KICKING AGAINST THE PRICKS (1986)

Formação: Nick Cave (voz, órgão e piano), Mick Harvey (baixo, piano, violão, guitarra e bateria), Blixa Bargeld (guitarras), Barry Adamson (baixo), Thomas Wydler (bateria).

Primeiro álbum a ser lançado no Brasil e também o primeiro a trazer o baterista alemão Thomas Wydler (da banda instrumental Die Haut), que ao lado de Harvey e Bargeld mantém se fiel aos Bad Seeds até hoje. Um disco de covers, alterna muitíssimo bem os climas, indo do baladão deslavado (By The Time I Get To Phoenix, de Johnny Rivers, e Something's Gotten Hold of My Heart, de Gene Pitney) a canções tradicionais americanas (Long Black Veil e Sleeping Annaleah), incluindo ainda doo-wop magistral (Jesus Met The Woman At The Well, dos Alabama Singers, sobre o encontro de Jesus Cristo com uma samaritana em um poço), blues nervoso (Ï'm Gonna Kill That Woman, de John Lee Hooker, bem popular em São Paulo na época) e recriações inusitadas e perfeitas para All Tomorrow's Parties (Velvet Underground) e Hey Joe (aquela). A versão em CD acrescentou duas canções ao tracking list original do vinil: Black Betty (de Leadbelly) e Running Scared (Roy Orbison)

Sucessos: The Singer (de Johny Cash).
Melhores faixas: I'm Gonna Kill That Woman, Jesus Met The Woman At The Well, Black Betty, 

All Tomorrow's Parties, By The Time I Get To Phoenix.

Pior faixa: Long Black Veil.

Preferida: Black Betty.

Nota: 9


YOUR FUNERAL... MY TRIAL (1986)Formação: Nick Cave (voz, órgão, gaita e piano), Mick Harvey (baixo, guitarra e xilofone), Blixa Bargeld (guitarras), Thomas Wydler (bateria).

Um dos álbuns preferidos de Nick Cave, lançado originalmente como vinil duplo de 45 rpm. Aparentemente um disco muito sombrio, apesar do humor sarcástico e da melodia "pra cima" de Sad Waters. Procurando, percebe-se mais. Segue com o rock'n'roll furioso de The First Born Is Dead nas fortes Jack's Shadow, Scum e Hard On For Love, mas também investe em temas mais fúnebres e perversos - a contraposição de imagens de Santa Verônica e o Santo Sudário com uma prostituta dá uma idéia do que se apresenta lírica e musicalmente nessa obra. A faixa-título e Stranger Than Kindness são deleite para quem cultiva o baixo astral. Em resumo: as três facetas mais freqüentes de Nick Cave And The Bad Seeds - o rock furioso, o blues descarnado e as baladas funestas - separadas em nove fortes canções. É neste álbum que está o épico marcial The Carny, incensado por críticos (mas que não é tudo o que dizem).

Sucessos: nenhum.
Melhores faixas: Your Funeral, My Trial, Sad Waters, Jack's Shadow, Long Time Man.

Pior faixa: The Carny.

Preferida: Sad Waters.

Nota: 8


TENDER PREY (1988)Formação: Nick Cave (voz, órgão, gaita e piano), Mick Harvey (baixo, guitarras, xilofone e percussão), Blixa Bargeld (guitarras), Thomas Wydler (bateria), Roland Wolf (piano e órgão), Kid Congo Powers (guitarra).

Disco perfeito. Aprendidas todas as lições de composição dos álbuns anteriores, Cave e os Bad Seeds fazem seu primeiro disco de banda, com participação de todos (principalmente de Harvey), erigindo uma identidade sólida e atingindo um padrão insuperável de qualidade, igualado apenas por eles mesmos. Os backing vocals fortes, os vocais de Cave desdobrando-se do menestrel canastrão ao narrador passional, a riqueza instrumental, a diversidade de idéias - ingredientes de uma concepção musical sem par (e olha que o Crime And The City Solution, banda liderada por Harvey, bem que tentou copiar). The Mercy Seat, que narra as impressões de um condenado à espera da morte numa densidade de assustar góticos lúgubres, tornou-se a obra-prima deles, secundada por outros clássicos como Deanna (favorita dos brasileiros, um r&b rapidinho com letra assassina inspirada em I Don't Want Your Money, de John Lee Hooker), City Of Refuge (blues-rock repetitivo e pesado sobre paranóia urbana), Slowly Goes The Night (balada de piano bar semi-jazzística, com piano cafajeste e vocais cafonas, linda!) e Watching Alice (depressão traduzida em música). New Morning passou a fechar todos os shows da banda, talvez para que os concertos terminem com a idéia que existe a esperança mesmo entre a mais desconcertante desgraça, e é outro geande momento. Aliás, o disco todo é.

Sucessos: The Mercy Seat, Deanna, City Of Refuge.
Melhores faixas: The Mercy Seat, Deanna, New Morning, Watching Alice, Slowly Goes The Night.

Pior faixa: nenhuma.

Preferida: The Mercy Seat.

Nota: 10


THE GOOD SON (1990)

Formação: Nick Cave (voz, órgão, gaita e piano), Mick Harvey (baixo, guitarras, vibrafone e percussão), Blixa Bargeld (guitarras), Thomas Wydler (bateria e percussão), , Kid Congo Powers (guitarra).

Após uma bem-sucedida turnê brasileira em 1989, o artista ficou tão fascinado pelo Brasil (ele que já tinha grande interesse pelo país graças ao filme Pixote, de Hector Babenco) que resolveu gravar o álbum inteiro aqui (e casar com uma brasileira que conheceu durante a tour também deve ter pesado na decisão, claro). Gravado no estúdio Cardan, em São Paulo, e mixado por Flood (U2, Depeche Mode) em Berlim, The Good Son é o primeiro disco a se concentrar no lado "baladeiro" de Cave. Repleto de referências bíblicas, as faixas são plácidas, suaves, algumas até melodramáticas. A única exceção à "leveza" é a faixa título, que combina um refrão choroso com um riff grave e pesado, balizado por vocais de inspiração gospel (cantados pelos próprios Bad Seeds). Inclui ainda a transformação de um hino evangélico em refrão (Foi Na Cruz, cantado em bom português). Isoladamente, tem excelentes faixas; no conjunto, parece faltar algo - que mais futuramente se descobriria o que era: uma consistência maior em um formato (canções lentas entre esperança e melancolia) no qual a banda superaria seu ídolo Leonard Cohen.

Sucessos: The Ship Song.
Melhores faixas: The Ship Song, The Good Son, Lament.

Pior faixa: Lucy.

Preferida: Lament.

Nota: 7


HENRY'S DREAM (1992)

Formação: Nick Cave (voz e órgão), Mick Harvey (guitarra base, órgão e vibrafone), Blixa Bargeld (guitarra solo), Thomas Wydler (bateria), Martyn P. Casey (baixo), Conway Savage (piano).

Ciente que até os fãs se assustaram com o álbum anterior (alguns estrangeiros - alemães, principalmente - culparam a "má influência" do Brasil na suavização melódica e lírica), Cave retoma a fúria roqueira de The First Born Is Dead sem violentar tanto os ouvidos. O resultado é excepcional: as quatro primeiras faixas estão entre as melhores produções do combo. A abertura se dá às trovoadas de violão, guitarra e órgão (Papa Won't Leave You, Henry), seguindo-se uma canção furiosa (I Had A Dream, Joe), quase punk, distorcendo a tradição vocal dos spirituals no refrão (o canto das igrejas evangélicas negras dos EUA). Na seqüência, a faixa mais pop de sua carreira, Straight To You, uma balada dilacerante que poderia ser associada ao britpop (Morrissey, notadamente), não fosse a letra de amor incondicional à beira do Apocalipse ("E as carruagens de anjos estão colidindo / E os santos estão todos bêbados e uivando para lua / E a angústia vem à galope / Mas eu gritarei, amor, e virei correndo / Direto para você"). Fechando o bloco, Brother, My Cup Is Empty saracoteia guitarras acústicas numa canção sobre um bêbado de saco cheio com sua esposa, sua cidade e até com o garçom que o serve. Encerram o álbum outras três fortes canções repletas de álcool, desespero e assassinato, precedidas pela delicadeza de When I First Came To Town (com curioso dueto entre Cave e o pianista Conway Savage) e pela funesta Chrstina The Astonishing, que contém o verso "o fedor do pecado humano vai além do que consigo suportar".

Nota: a partir desse disco, a formação se estabilizaria com os músicos acima listados, recebendo outros a partir de 1996, mas sem ninguém abandonando o barco.

Sucessos: Straight To You.
Melhores faixas: Papa Won't Leave You, Henry - I Had a Dream, Jo - Straight To You.

Pior faixa: Loom Of The Land.

Preferida: Straight To You.

Nota: 7,5


LIVE SEEDS (1993)

Formação: Nick Cave (voz), Mick Harvey (guitarra e xilofone), Blixa Bargeld (guitarra), Thomas Wydler (bateria), Martyn P. Casey (baixo), Conway Savage (piano e órgão).

Disco ao vivo dificilmente é legal para quem não esteve na platéia no dia, e esse não é exceção. Sem exibir metade da vitalidade habitual, os Bad Seeds acabam deixando as cinco canções de Henry's Dream meio frouxas, sem peso - aliás, até The Mercy Seat perde impacto aqui. Pelo constato em vídeos e até pela apresentação (excelente) no Brasil, eles não estavam num dia muito bom. Claro que sempre é bacana ouvir New Morning, aqui ainda mais intensa na interpretação, condição que também vale para The Ship Song e The Good Son - talvez por serem canções que exigem mais soul que garra. A única inédita, Plain Gold Ring, é um cover modorrento de um baladão obscuro e antigo, sem o brilho da clássica Five Hundred Miles, que seria apresentada em terra brasilis numa versão emocionante. Na edição importada, o CD foi lançado em um pacote especial com um vídeo que trazia o show na íntegra. Tanto um como outro são recomendáveis apenas para completistas.

Sucessos: nenhum.
Melhores faixas: The Ship Song, The Good Son, New Morning.

Pior faixa: Plain Gold Ring.

Preferida: New Morning.

Nota: 5


LET LOVE IN (1994)

Formação: Nick Cave (voz e órgão), Mick Harvey (guitarra, órgão e vibrafone), Blixa Bargeld (guitarra), Thomas Wydler (bateria e percussão), Martyn P. Casey (baixo), Conway Savage (piano).

Se o problema era tesão, isso vem de sobra nesse belíssimo disco, marcado pelo desespero e desencantamento com o amor em si (Nick estava se separando de sua esposa, e alguns Bad Seeds também não estavam exatamente felizes). É o mais rico musicalmente na discografia da banda e só apresenta uma faixa mediana: Do You Love Me? (Part 2) - até porque a (Part 1), cujo clipe foi gravado num puteiro classe Z em São Paulo,  é uma aterrorizante "chamada na chincha" para com a pessoa amada, com sinos e backing vocals ameaçadores. Thirsty Dog e Jangling Jock são rockões barulhentos, rápidos e furiosos. Loverman, gravada pelo Metallica no disco Garage Days Re-Revisited, é cínica, macabra e mistura o temor e o fascínio pelo cramulhão ao desejo por uma mulher. O tinhoso reaparece como O Corruptor em Red Right Hand, um micro-tratado sobre o demo (de deixar teólogo de queixo caído) em forma de canção pop, tanto que é o maior hit dos Bad Seeds em terras americanas, constando na trilha do primeiro Pânico e no disco Songs In The Key Of X "dedicado" à série Arquivo X. Ainda tem uma balada pop com discreta incursão bluesy  (Nobody's Baby Now) e uma hilária predição da própria morte em Lay Me Low.

Curiosidade: um monte de convidados figuram nesse disco (membros dos Triffids e Beasts of Bourbon, o ex-Birthday Party Rowland S. Howard, os violinistas Robin Casinader e Warren Ellis), mas estão quase indedectáveis.

Sucessos: Red Right Hand, Do You Love Me? (Part 1).
Melhores faixas: Nobody's Baby Now, Red Right Hand, Lay Me Low.

Pior faixa: Do You Love Me? (Part 2).

Preferida: Nobody's Baby Now.

Nota: 9


MURDER BALLADS (1996)

Formação: Nick Cave (voz e órgão), Mick Harvey (guitarra, percussão e órgão), Blixa Bargeld (guitarra), Thomas Wydler (bateria), Martyn P. Casey (baixo), Conway Savage (piano), Jim Sclavunos (percussão).

O título revela tudo sobre as letras, todas narrativas sobre assassinatos mais ou menos passionais, mas não denota o lado musical. Nem tudo aqui é balada - tem um "quase-country" fantasmagórico e chato (Crow Jane), névoas harmônicas em tons muito graves (Song of Joy), minimalismo pesado e pervertido (Stagger Lee) e até tentativas frustradas (ainda que passáveis) de revisitar Tender Prey: Lovely Creature e O'Malley's Bar. Das baladas proprimanete ditas, foram extraídos dois hits maciços na Austrália que também se tornaram populares na Europa: os duetos Henry Lee (com PJ Harvey, na época esposa recém-casada com Cave) e Where The Wild Roses Grow (com Kylie Minogue, sobre uma garota inocente assassinada por um namorado perturbado que enlouquece com sua castidade). Os simples e ótimos clips dessas canções favoreceram bastante seu sucesso, talvez por exibirem belas mulheres (as cantoras que participam das faixas - até PJ está linda) em histórias envolventes e surpreendentes. As duas moças se juntam ao bebum Shane McGowan (ex-The Pogues) e à poetisa Anita Lane para dividir com Nick os vocais da irônica Death Is Not The End, que encerra o álbum legando uma sensação bizarra ao ouvinte, que não consegue decidir se gostou, se achou meio depressivo ou se ficou assustado. E isso porque nem falamos da suíte de choros The Kindness of Strangers... Lúgubre.

Sucessos: Henry Lee, Where The Wild Roses Grow.
Melhores faixas: Henry Lee, The Kindness of Strangers, Where The Wild Roses Grow, Death Is Not The The End.

Pior faixa: Crow Jane.

Preferida: Henry Lee.

Nota: 6,5


THE BOATMAN'S CALL (1997)

Formação: Nick Cave (voz, órgão e piano), Mick Harvey (guitarra e órgão), Blixa Bargeld (guitarra), Thomas Wydler (bateria), Martyn P. Casey (baixo), Conway Savage (piano), Jim Sclavunos (percussão), Warren Ellis (violino e acordeão).

Outro relacionamento encerrado (com PJ dessa vez), outro grande disco como exercício de terapia e exorcismo interno. Porém, se em Let Love In o desespero dava o tom, aqui a esperança é fundamental, e o endeusamento da mulher, superior a Deus e o Diabo ("Nenhum Deus no mais alto dos Céus / Nem demônio algum sob o mar / Poderia fazer o tento que você fez / De me colocar de joelhos", canta Cave em Brompton Oratory) chega a ponto de menosprezar o ser masculino (em Idiot Prayer). Musicalmente, o álbum é composto por canções conduzidas ao piano (às vezes, com o baixo preciso de Casey acompanhando com maestria), recebendo intervenções discretas e certeiras dos outros instrumentos, que sutilmente fazem a canção acontecer e revelar-se de rara beleza. Assim acontece a guitarra em Brompton Oratory, com o violino em Far From Me e com o órgão em (Are You) The One That I've Been Waiting For? e Lime Tree Arbour. Wydler surpreende por saber quando não inventar na bateria e prova que nem todo bom baterista precisa ser uma máquina de viradas (coisa que ele também faz bem). Completamente composto por Cave (letra e música), esse discão se define a partir da faixa inicial, Into My Arms, que ganhou o clipe mais angustiante da história (apenas closes p&b em faces aos prantos). A letra? Fé e amor sendo distinguidos para logo ser provado que eles são todos parte de um único todo, deixando a esperança de reconciliação. Ouça e tente ficar alheio - mesmo que não entenda a letra, o baixo, o piano e a voz de Nick se encarregarão de deixá-lo sem palavras.

Sucessos: Into My Arms, (Are You) The One That I've Been Waiting For?
Melhores faixas: Into My Arms, (Are You) The One That I've Been Waiting For?, Brompton Oratory, 

Far From Me, Lime Tree Arbour
.
Pior faixa: Green Eyes.

Preferidas: Into My Arms, Brompton Oratory.

Nota: 9


THE BEST OF NICK CAVE AND THE BAD SEEDS (1999)

Coletânea que traz os lados A de todos os singles de The First Born Is Dead a The Boatman's Call, menos os de Kicking Against The Pricks. Serve aquele lugar-comum: nem tudo que deveria constar está aqui, mas tudo que aqui está é obrigatório (à possível exceção de The Carny, substituível por pelos menos 35 outras faixas mais interessantes). A primeira edição trouxe como bônus um disco ao vivo da turnê do álbum de 1997, bastante superior ao registro de Live Seeds. Com sorte, ainda é possível encontrar essa edição dupla em sebos e até alguns encalhes de boas lojas.


NO MORE SHALL WE PART (2001)

Formação: Nick Cave (voz, piano e órgão), Mick Harvey (guitarra, percussão e órgão), Blixa Bargeld (guitarra), Thomas Wydler (bateria), Martyn P. Casey (baixo), Conway Savage (piano), Jim Sclavunos (percussão), Anna McGarringle (vocais), Kate McGarringle (vocais).

Outra obra-prima, quase da mesma cepa de Tender Prey (um tiquinho inferior). Já foi comentado faixa-a-faixa e também resenhado por Nick Hornby neste mesmo site, mas tentemos sumarizar: nas letras, Cave está mais religioso que nunca, e na música, os Bad Seeds estão 100% Bad Seeds, ou seja, bateria fazendo harmonia, piano fazendo percussão, violino descendo às saraivadas guitarras econômicos numa força bruta que parece ser contida para não pesar mais que os poderosos vocais (de Cave e das irmãs Anna e Kate McGarringle, essa última mãe do ícone pop-gay Rufus Wainright). Da delicadeza quase pop de Love Letter (que letra!) à surpreendente Fifteen Feet Of Pure White Snow ("Levante suas mãos ao mais alto dos céus / É de se duvidar? / Oh, meu Deus!", brada um Cave irado em meio ao caos de uma cidade soterrada pela neve), uma obra que atesta a singularidade e excelência da proposta musical da banda. Se acabassem hoje, não teriam deixado nenhum fã com a sensação de que ainda haveria algo a se cumprir.

Sucessos: Fifteen Feet of Pure White Snow.
 Melhores faixas: Fifteen Feet of Pure White Snow, Love Letter, Oh My Lord, Hallelujah.

Pior faixa: Darker With The Day.

Preferida: Fifteen Feet of Pure White Snow

Nota: 10


NOCTURAMA (2003) - Por Marcelo Costa

Formação: Nick Cave (voz, piano e órgão), Mick Harvey (guitarra, baixo, percussão e órgão), Blixa Bargeld (guitarra), Thomas Wydler (bateria e percussão), Martyn P. Casey (baixo), Jim Sclavunos (percussão), Warren Ellis (violino).

Já na faixa que abre Nocturama, seu décimo terceiro álbum, o bardo australiano Nick Cave tenta nos arrancar uma confissão: "Come on, admit it, babe, It’s a wonderful life". Nos dias complicados que vivemos é meio difícil acreditar, mas a boa música é sempre um caminho a seguir. E é com boa música que Cave nos presenteia. Da balada inspirada que abre (Wonderful Life) até a incendiária faixa que encerra (Babe, I'm On Fire), Nocturama transpira rock and roll. E religião. E poesia. "Hide your eyes, hide your tears / Hide your face, my love / Hide your ribbons, hide your bows / Hide your coloured cotton gloves / Hide your trinkets, hide your treasures / Hide your neatly scissored locks / Hide your memories, hide them all / Stuff them in a cardboard box / Or throw them into the street below / Leave them to the wind and the rain and the snow / For you might think I’m crazy / But I’m still in love with you", canta o bardo na apropriada Still In Love. É uma outro disco de baladas, cuja melodia é assassinada apenas na barulheira da birthdaypartyana Dead Man In My Bed e da longa última faixa, Babe, I'm On Fire. Nocturama foi gravado apenas em uma semana e já circulava nas importadoras em uma versão especial trazendo de bonús um DVD e, a demora na edição nacional do álbum se deve a uma mudança de gravadora. Após anos trabalhando com a gravadora Mute (representada no Brasil pela Sum), Cave lançou Nocturama pelo pequeno selo Anti, por isso o motivo da demora no lançamento nacional.

Sucessos: Bring It On.
 Melhores faixas: Dead Man In My Bed, Wonderful Life.

Pior faixa: Rock Of Gibraltar.

Preferida: Wonderful Life

Nota: 7



Nick Cave And The Bad Seeds também podem ser encontrados em trilhas sonoras. A de Pânico traz Red Right Hand e a de Asas do Desejo, a regravação de From Her To Eternity que também consta na versão CD do álbum homônimo. Faixas inéditas podem ser encontrados na trilha de outras duas películas de Wim Wenders: Até o Fim Do Mundo (a deliciosamente cafona (I'll Love You) Till the End Of The World) e Tão Perto, Tão Longe (a derramada Faraway, So Close).

Leonardo Vinhas já conseguiu passar um Carnaval ouvindo Murder Ballads antes de sair para a farra. Ele insiste que os Bad Seeds só soam 100% mórbidos para deprimidos contumazes.