Entrevista - Ultramen
por André Azenha
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26/02/2006

Quantas bandas conseguem misturar inúmeros estilos musicais sem soarem esquizofrênicas e ainda por cima, durarem 15 anos? Tudo bem, tudo bem, os Titãs estão aí e tal, mas já lançaram trabalhos em que pareciam dez grupos diferentes no mesmo disco. O Clash fez álbuns extraordinários tocando de tudo; porém, não chegou nem a uma década de existência. No Brasil, mais precisamente em Porto Alegre, uma banda que faz parte da leva de Cachorro Grande, Vídeo Hits, Graforréia Xilarmônica e outros artistas, consegue passear por vários estilos musicais e lançar discos bacanas. Essa banda é a Ultramen.

Comemorando 15 anos de estrada, os caras (Tonho Crocco no vocal, Pedro Porto no baixo, Julio Porto na guitarra, Zé Darcy na bateria, Marcito e Malásia que mandam ver na percussão e DJ Anderson no tocas discos; além do tecladista convidado Léo Boff) se preparam para lançar o quarto álbum de inéditas na carreira (os anteriores foram Ultramen de 1998, Olelê de 2000, e O Incrível Caso da Música Que Encolheu & Outras Histórias (2003); além do Acústico MTV Bandas Gaúchas, junto com Cachorro Grande. Wander Wildner e Bidê ou Balde, lançado no ano passado). A expectativa é que o novo trabalho saia até o meio do ano. “Pode ser que seja lançado de maneira independente”, comenta Malásia.

Quando fundaram a banda em 1991; Zé Darcy, Júlio e Pedro Porto tinham a idéia de misturar som pesado com música black. Com o tempo e as mudanças na formação, incorporaram outros estilos como reggae, ragga e hardcore, e atualmente conseguiram uma cara própria que deu cria a pérolas que merecem chegar aos ouvidos do resto do Brasil como Dívida (de Olelê) e Santo Forte (do último disco), que possuem letras simples e que retratam do cotidiano nacional, sem soarem pretensiosas ou malas. Na primeira, Tonho costuma cantar: “A taxa é zero/ o juro é alto/ vamos conversar/ Ressarcimento/ pagamento/ vamos negociar/ Aquela dívida de uns anos atrás/ está bem viva/ Você não lembra mais”. Em Santo Forte a letra diz: “Pra que ficar/ Ficar aí parado/ Ou de braços cruzados/ Vendo o tempo passar/ Eu vou curtir/ Curtir o ano inteiro/ Pois Deus é brasileiro/ E também vai me ajudar”. Quer algo mais brasileiro e atual do que isso? E tudo embalado por um balanço delicioso que Tim Maia adoraria cantar.

Com muito suor, a Ultramen vai ganhando o merecido reconhecimento. Além da participação no Acústico MTV, um ano antes os sete foram premiados como a melhor banda pop/rock pela Secretarial de Cultura do Rio Grande do Sul. Um exemplo desse suor e desse reconhecimento é que os caras viajaram mais de 36h (ida e volta) para tocar em Santos e voltar para Porto Alegre, sem ganhar um tostão, já que o dinheiro da apresentação seria para cobrir os gatos da viagem, e encontraram o local com lotação esgotada.

Nessa passagem por Santos para o show, a banda bateu um papo com o S&Y no quarto do hotel e falou sobre o próximo álbum, a visibilidade que o Acústico trouxe à banda, cena gaúcha e o relacionamento em uma formação com sete caras, todos gente fina. Confira a conversa completa.

Por onde andou a Ultramen?
Marcito – Na verdade a coisa mais recente que aconteceu foi o Acústico MTV Bandas Gaúchas, que foi bem legal, já que a MTV utilizou a marca forte dela para mostrar uma determinada região do país na música com quatro bandas. Cada banda teve um convidado e no nosso caso foi o Falcão (O Rappa), que tocou Dívida com a gente. E nessa parceria, a música recebeu uma nova roupagem e começou a tocar de novo. Mas estamos fazendo vários shows, cara. Na verdade, nosso show tem músicas de todos os discos da Ultramen.

Anderson – Na verdade estamos mais pelo Sul, fazendo mais shows por lá. Até o final do ano passado fizemos bastante coisa por Santa Catarina, Paraná... Depois do Acústico fizemos alguns programas...

O Acústico serviu para dar uma maior visibilidade para a banda?
Marcito – Como a MTV é um veículo forte e o Acústico é uma marca forte mesmo, a divulgação é muito boa. Muita gente escutou Dívida pela primeira vez.

Surgiram mais propostas para shows?
Marcito – Estamos para fazer show no Rio de Janeiro. Dívida estourou por lá.

Anderson – Ultramen é uma banda conhecida da galera formadora de opinião.

Vocês estão completando 15 anos em 2006. Como está o projeto do novo CD? Alguma comemoração em especial?
Tonho – Bom, nosso projeto para 2006 é o quarto disco de inéditas da Ultramen.

Tem nome?
Marcito – Não tem nome ainda. Acabamos a demo agora e vamos trabalhar o álbum.

Qual a previsão para o lançamento?
Anderson – Acredito que até o meio do ano sai.

Por alguma gravadora ou de maneira independente?
Malásia – Pode ser que seja lançado de maneira independente.

Musicalmente falando, como será esse trabalho?
Anderson - Vem com aquele lance da mistura (de sons e ritmos). Deverá ter um pouco mais de ragga; mas seguirá o estilo da banda de misturar tudo, o reggae, samba-rock, hardcore...

A Ultramen é uma das poucas bandas que consegue unir vários estilos sem soar esquizofrênica.
Marcito – Isso é legal. Eu acho que a gente conseguiu fazer isso. Mas isso é bom e pode ser ruim também. Por exemplo, para alguém que goste só de hardcore, não dá para tocar um reggae.

É difícil uma banda que dure 15 anos...
Anderson – Rolam discussões, rola de tudo...

Tonho – A banda quase acabou no sétimo ano de existência. A gente não conseguia lançar o que gravava. O primeiro disco foi gravado por conta própria e íamos lançá-lo de maneira independente. Demos o álbum para um monte de gravadoras e a gravadora (Rock It!) do Dado Villa Lobos resolveu lançá-lo. Desde então passamos a tocar e trabalhar bastante.

Todos vivem apenas da banda?
Malásia – Hoje vivemos da banda. Teve a primeira fase da banda que era bem legal, com fita demo e tal...

Marcito – O mercado não era como agora. Bandas cover eram mais valorizadas até... São sete (pessoas) na banda, rolam brigas e tal, mas o que importa é que quando estando juntos funciona, rola música.

Tonho – Você até perguntou por onde andávamos. Há uns três anos estávamos mais por aqui. Mas o Sul tem um mercado incrível.

Pedro – Não só para bandas gaúchas, mas as coisas dão certo lá.

Muitas bandas do Sul são elogiadas em outras regiões do Brasil, como vocês, o Cachorro Grande... O que falta para essas bandas estourarem de vez e ganharem o grande público no resto do país?
Pedro – Na minha opinião é proximidade geográfica mesmo... Por exemplo; as bandas que tentam mudar para São Paulo, conseguem mais... O Cachorro Grande, o Dead Fish...

Tonho – O complicado é a banda estar na mídia. Uma banda como a Ultramen, com sete pessoas, é difícil e caro montar uma estrutura, fazer shows o ano todo.

Como está a freqüência de shows?
Marcito – Em janeiro deu uma diminuída. Geralmente são de quatro a cinco shows por mês. Em novembro e dezembro fizemos muitas apresentações.

Vocês gostam ou tiveram alguma influência das bandas gaúchas que surgiram nos anos 80 como Engenheiros, Nenhum de Nós, De Falla?
(todos) – De Falla... (Tonho Croco, inclusive, foi vocaista da banda no álbum Top Hits, que não contava com o maluco Edu K na banda).

Tonho – O primeiro disco dos Engenheiros é legal. Mas teve o TNT também. Antes desses caras, teve o Teixeirinha...

Querem deixar um recado para os fãs da banda?
Tonho – A galera que curte a gente... Esperem e aguardem o quarto disco da Ultramen.

Terá quantas músicas?
Tonho – Entre treze e quatorze. Todos nossos discos têm treze músicas... Mas acessem nosso site. Lá tem os discos, músicas, agenda.


Ultramen - Ao vivo no Sesc de Santos - 09/02/2006
por André Azenha


Antes da entrevista, o percussionista Marcito e o DJ Anderson perguntavam se a casa estaria cheia para o show. Quando avisados de que todos os ingressos tinham sido vendidos, eles ficaram surpresos. Os caras, que enfrentaram uma viagem de mais de 18h de Porto Alegre a Santos, apenas para essa apresentação e depois retornariam para a cidade natal, não decepcionaram o público.

Por volta das 22h, eles deram partida a uma noite de muito suingue, guitarras altas, black music, reggae e diversão. De prima, emendaram Olelê, De Canto, Erga e o sucesso do último álbum, Máquina do Tempo, um reggae delicioso e fácil de cantar junto, que ao vivo se torna psicoldélico. Nessa canção, o grupo mostra talento para criar letras bacanas e mandar um recado, sem cair na pretensão ou na pieguice. A letra diz: "O homem julga - joga - brinca de juiz/ Condena - poda - é foda - corta a raíz/ Em vez de regar - em vez de cultivar/ Prefere ver a vida se acabar".

Aliás, é possível fazer uma comparação entre a Ultramen e algumas outras bandas mais conhecidas do público. Enquanto os pampas mandam ver letras desse porte, e que ainda assim divertem e fazem dançar, o Natiruts, por exemplo, é capaz de fazer alguém dormir com suas letras "cabeça". Enquanto os gaúchos fazem black music deliciosa, o Jota Quest enche o saco e destrói os ouvidos alheios com seu pop "influenciado" por música negra. E enquanto a Ultramen mistura todo tipo de som; de reggae a hardcore, de ragga a hip-hop, e cria canções deliciosas, o Charlie Brown Jr. (vou apanhar do Chorão?) empesteia as rádios brasileiras com uma mistura de causar danos cerebrais aos mais jovens. E fica a questão: qual o motivo para as grandes gravadoras investirem em artistas como esses três e ignorar gente bacana. E a Ultramen faz um som que provavelmente venderia bastante se rolasse uma boa divulgação. Vai saber...

Voltando à apresentação, Bem Mal e Compromisso continuaram fazendo a galera dançar. E os grandes momentos da noite ficam para Santo Forte e os sucessos Preserve e Dívida (essa última acompanhada por berros do público). Ainda houve tempo para Peleia e para o guitarrista Júlio, o baixista Pedro e o batera Zé Darcy improvisarem um rock pesado e rápido no final. Os músicos da banda são excelentes.

Fim de noite, e após uma hora e meia de música, os caras ficaram autografando CDs e conversando com os fãs. E depois, rolou um papo bacana, embaixo do hotel onde os sete estavam hospedados, junto com o guitarrista Júlio Porto (fissurado em Bob Marley) e os caras do Radiola Santa Rosa, até às 02h. Dia bacana e fica a torcida para que o grande público conheça o som da Ultramen.


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