Faixa a Faixa
Evil heat - Primal Scream
por Marcelo Silva Costa

O Punk Está Vivo. Yeah.

Bem, foi assim que, dois anos atrás, eu comecei minha resenha sobre "Xtrmntr", um álbum punk nos textos, porém, eletrônico e direcionado as pistas, antagonismo que dava ainda mais crédito ao Primal Scream depois de todas as aventuras que a banda já tinha passado na música pop. Da dobradinha de estréia com "Sonic Flower Groove" (1987)/"Primal Scream" (1989) amparada em rocks simples e inspirados, passando pela queda por grooves em um dos discos clássicos e obrigatórios dos anos 90, "Screamadelica" (1991), pela fase Rolling Stones em "Give Out But Don't Give Up" (1994) e o flerte com o jazzy/lounge/soul no cinematográfico "Vanishing Point" (1997), a turma de Bobby Gillespie sempre conseguiu manter a inspiração acima da média, independente da direção. 

Também, o que esperar de uma super banda que reúne um ex-baterista do Jesus & Mary Chain (Bobby Gillespie, aqui, lider e vocalista), um ex-guitarrista e um ex-tecladista do Felt (Robert Young e Martin Duff, respectivamente), um ex-baixista do Stone Roses (Mani) e um ex-guitarrista do My Bloody Valentine (Kevin Shields).

"Evil Heat", porém, deixa um leve gostinho azedo. Não que o álbum seja ruim. Não é. Apenas soa como uma seqüência do álbum anterior, um "Xtrmntr" número 2, mas um tiquinho menos inspirado. Se é menos político, porém, é mais sexy. Se é menos punk, porém, é mais psicodélico. 

O Sexo Está De Volta? Yeah!


Deep Hit Of Morning Sun

Jesus and Mary Chain. Pegue "Darklands", a música, desacelere um pouco e a jogue dentro de "Automatic" e teremos "Deep Hit Of Morning Sun". Uma guitarra conduz a melodia (melodia?) enquanto outra faz a microfonia. Efeitos eletrônicos preenchem o ambiente. Sob essa bagunça melódica, Gillespie praticamente declama a letra: "Hey there Girl, summer girl / Suicidal beautiful / I can see, death in me / Death in you, love is good / Shine on me / hine on everyone / Black is the colou / Deep hit of morning sun". Pop psicodélico dos bons. Quem esperava barulho (eletrônico ou guitarreiro, tanto faz) para a abertura do álbum vai estranhar. Mas a canção gruda no ouvido. 

Miss Lucifer

Sigue Sigue Sputinik. A batida eletrônica faz pensar que "Love Missile F1-11" pode começar a qualquer momento. Também lembra "Swastika Eyes" do álbum anterior, até na letra: "Skinny girl, dressed in black / Leather boots, nazi hat / Desert panther, of our keep / Sexy dancer, immaculate grace". Uma perfeita descrição da senhorita Lucifer, convenhamos. No refrão, provando que gosta do perigo, Gillespie pede: "Shake it baby". Primeiro single do álbum. 

Autobhan 66

Kraftwerk. Não só no nome. Longa introdução instrumental, teclados a frente, vocal cheio de eco, letra curta e repetida ao infinito: "Dreaming, I'm still dreaming / Dream of my life 'til the day that I die / Seeing, always seeing / Colour so beautiful, softer than skin". Gillespie em entrevistas diz que "Autobahn 66" é tão boa quanto Kraftwerk, mas não soa Kraftwerk. Ele está errado. Soa sim. 

Detroit

O espirito de Jesus e Maria baixa de novo, mas, agora, com justificativa: Jim Reid assume os vocais. Eletro-esquisita, "Detroit" caberia perfeitamente no álbum anterior, mas é uma faixa menor, apesar da letra excelente (uma das melhores de "Evil Heat"): "I destroy everyone i love / I destroy everything i touch" canta Reid no refrão.

Rise

Public Image. Na canção mais política do álbum, as guitarras de Kevin Shields enchem de peso o refrão e fazem a diferença trafegando por cima da melodia, claro, eletrônica. Gillespie começa pegando pesado com os sonhos capitalistas: "A life of work, is a life of crime / You pay your taxes, you serve your time / All the money, where does it go?". Essa era a tal que iria se chamar "Bomb The Pentagon" e que está circulando na web em uma versão ao vivo, no Japão, com o refrão título da música "Rise - Rise" no original "Bomb The Pentagon". Para não atrapalhar a carreira do álbum nos EUA, a gravadora pediu a mudança da letra. Eu, particularmente, acredito que todos os punks americanos iriam comprar... e ia vender muito mais...

The Lord Is My Shotgun

Blues eletrônico chatinho. Robert Plant alterna harmônica com o vocal de Gillespie repetindo "Bang yer alive". E só. 

Sick City

Sex Pistols. Kevin Shields enche de guitarras uma canção prima da ensurdecedora "Acellerator" do álbum anterior. Já havia aparecido em uma versão de David Holmes, no álbum "Bow Down To The Sign", mas aqui surge mais pesada, perfeita combinação com o retrato de uma cidade doente numa letra estilo Lou Reed. 

Skull X

Rolling Stones futurista. Seqüência da faixa anterior, mas com mais guitarras e mais clima rock and roll. Deve ensurdecer ao vivo. E empolgar. A letra, a lá William Blake, atira para todos os lados: "My eyes are burning stars" - "You're killing my dreams" - "Burn your children / Hate your parents" - "The fork on your plate / All those needles in your eyes / go to Jesus"

A Scanner Darkly

Joy Division. Uma instrumental longa, dark e bela. Os instrumentos vão entrando aos poucos. 

Space Blues Number 2

Felt. Cantada por Martin Duffy, "Space Blues N 2" remete a "Space Blues" de 1988 do Felt. Baladinha leve e cinicamente doce, com alguns barulhinhos eletrônicos. Destoa completamente de todo o álbum e, na verdade, lembra "About You" do Jesus and Mary Chain. O formato balada ampara a letra que procura acalmar o personagem: "From the judgement day / 
When your name is called / And the ocean's rise / And the mountain's fall / Will the blood of christ, santify your soul / Will you follow satan / And the hell below"...

Some Velvet Morning

Dueto de Gillespie e a super modelo Kate Moss. Uma eletro balada que deverá render um clip bacana com Kate, mas que, musicalmente, é tolinha. Cover de uma canção de Lee Hazelwood escrita para Nancy Sinatra nos anos 60  e que já tinha ganho versão do Slowdive no álbum "Souvlaki".