Amor, rock e Yo La Tengo
por Marcelo Silva Costa

Você já se apaixonou por um disco ? À primeira vista (ouvida) ? 

Já sentiu que, naquele efêmero espaço de tempo, poderia viver o resto da vida ouvindo apenas esse disco ? 

É claro que outros discos surgem depois, mas naquele momento o tal disco parece eterno. Você já sentiu isso ?

Eu já. Várias vezes.

"Ocean Rain" do Echo & The Bunnymen foi meu fiel companheiro no distante ano de 1985, assim como "The Queen is Dead" dos Smiths me fez sonhar e voar alto em 1986. 

"Doolittle" do Pixies me deixou quase surdo em 1990 (só uma pequena perda de quase 15% de audição) tanto quanto me fez sorrir naquele ano difícil. E, impossível falar de paixão por discos sem citar "London Calling" do Clash, afinal, é por culpa dele que estou aqui, numa manhã de sábado, escrevendo sobre rock and roll. E sobre amor. Merece destaque também "Carnaval na Obra" do mundo livre s/a pois foi esse disco que fez renascer das cinzas o zine Scream & Yell...

A lista é enorme ("Monster" do R.E.M., "Soft Bulletin" do Flaming Lips - que me fez comprar outros três dos Lips em menos de dois meses) e nessa manhã ensolarada de inverno ganha um novo nome: Yo La Tengo.

O novo álbum do trio americano, "And the nothing turned itself inside-out", é completamente apaixonante, apaixonado e, disparado, o melhor álbum do ano, até agora. 

Eles conseguem isso fazendo um cruzamento mágico e assombroso de Cocteau Twins e Velvet Underground. 

Conseguem isso com pouca percussão, teclados sonhadores e guitarras, meu deus, guitarras.

Conseguem isso repetindo ao infinito aqueles três acordezinhos básicos do punk.

Conseguem isso criando melodias perfeitas cheias de vocais sussurados que consquistam qualquer um que tenha sangue nas veias, sonhos na cabeça e cds do Spiritualized, Afghan Whigs, The Cure ou Lou Reed em casa.

São treze faixas em 77m e 33s de puro delírio. 

Canções mágicas para um dia frio e ensolarado. Canções para se apaixonar. E eu estou apaixonado. Apaixonado pelo Yo La Tengo. E por uma garota que lia, caminhando e tropeçando, Neruda, ontem à tarde, no centro da cidade, e que eu acho que nunca mais vou ver. 

Acho... mas acordei sorrindo, ao som de "Everyday" do Yo La Tengo. E continuo apaixonado. 

Você entende isso ? Você já se apaixonou por um disco ?

Marcelo, 29, é editor do zine Scream & Yell, poeta nas horas vagas e roqueiro mesmo quando está dormindo.