Beatles 1 
por Alexandre Matias
Não confiem em 1
Apesar de estrategicamente eleita representante oficial da história do movimento cultural mais importante do século passado, a coletânea deturpa a imagem dos Beatles em detrimento de seu integrante mais perverso: 
o gênio (do mal) Paul McCartney.

Aqui não é espaço, e talvez nem haja, para questionar a importância do beatle na história da música gravada (afinal, o cara é o Paul McCartney), mas todos sabemos que, na verdade, Paul é o Felipe Barreto da história. 
Sorridente, gente boa, ativista político, pagador de impostos, Paul é o genro que toda sogra queria ter. 
Mas, para usar um termo recorrente, não dá pra confiar num cara que usou 
um mullet daqueles por tanto tempo.

E, você sabe, Michael Jackson, aquele jeito de falar gesticulando e fazendo onomatopéias, o curto luto por Linda, toda aquela grana, vegetarianismo... Paul McCartney é político até a medula, o título de Sir era uma obrigação que a Inglaterra lhe deveria conferir. E, na boa, um cara que consegue deixar o George Harrison com uma mágoa daquelas não deve ser flor que se cheire. Vamos lá, George Harrison: o cara que quebrou financeiramente pra bancar os filmes do Monty Python. Sacanear um cara desses é prova de falta de caráter. Taí o Eric Clapton que não me deixa mentir. 

Pois é, Paul McCartney transformou o único formato que os Beatles não haviam se aventurado oficialmente (a coletânea de hits em um único disco) e transformou-o em sua caneta da história. Como outros ditadores antes dele, Sir Macca reescreve sua trajetória moldando ocurso secular à sua vontade. 

Comecemos pelo critério escolhido para a compilação, de escolher apenas as faixas para compactos. Isso elimina a possibilidade de entrarem músicas dos álbuns Rubber Soul, Sgt. Pepper’s e do Álbum Branco, onde o papel de Lennon é tão fundamental quanto o de Paul. Isso quer dizer que não há nada de Girl, A Day in the Life, Norwegian Wood, In My Life, Being for the Benefit of Mr. Kite!, Happiness is a Warm Gun, Drive My Car, Nowhere Man ou Lucy in the Sky with Diamonds. Em seu lugar, surgem faixas mais populares (às vezes nem tanto), mas menos inspiradas. 

Assim, Lennon surge aos novos ouvidos como um maluco (Come Together) pacifista (All You Need is Love) casado com uma japonesa (The Ballad of John & Yoko) e só. Não há nada aqui que mostre o Lennon político, psicodélico, introspectivo. Aí entramos em outro porém. Muitos compactos dos Beatles eram assinalados como “duplo lado A”, sem modéstia mesmo (pra quê, né?), explicando pros disc-jóqueis tocarem o que quisessem. E é aí que Paul McCartney se revela mais nojento. A forma que a coletânea é editada distorce a história com requintes maoístas. Por quê? Porque tira Rain e deixa Eleanor Rigby ou Yellow Submarine. Tira Don’t Let Me Down e Revolution em favor de Get Back e Hey Jude. Permite Hello Goodbye, mas veta I Am the Walrus. Mas a ausência mais sentida é Strawberry Fields Forever. Qualquer beatlemaníaco sabe que a dobradinha Strawberry Fields/Penny Lane é o compacto mais importante da história do grupo e qualquer ouvinte consegue perceber que não é por causa de Penny Lane

Tudo bem, Paul vendo os bombeiros e barbeiros quando era criança é engraçadinho, mas não se compara à descida vertiginosa e psicodramática que John nos faz à infância da razão, nesta que ocasionalmente divide o título de melhor música de todos os tempos com Good Vibrations ou God Only Knows. 

1, então, ganha com isso quatro estrelas e meia - uma mancha, num céu acostumado às cinco. 

Outro 1 

Minha versão para uma coletânea ideal 

1) Love Me Do 
2) From Me To You 
3) She Loves You 
4) I Wanna Hold Your Hand 
5) Can’t Buy Me Love 
6) A Hard Day’s Night 
7) I Feel Fine 
8) Eight Days a Week 
9) Ticket to Ride 
10) Help! 
11) Yesterday 
12) We Can Work It Out 
13) Paperback Writer 
14) Rain 
15) Yellow Submarine 
16) Strawberry Fields Forever 
17) Penny Lane 
18) All You Need is Love 
19) I Am the Walrus 
20) Lady Madonna
21) Hey Jude 
22) Revolution 
23) Get Back 
24) Don’t Let Me Down 
25) The Ballad of John & Yoko 
26) Something 
27) The Long and Winding Road