Beatles, Beatles e mais Beatles
por Marcelo Kbla Orozco

2000 é um ano zero. Os Beatles estão cheios de anos zero e "aproveitaram" para o que todo mundo chama de "hora de encher o caixa". 60 anos de nascimento de Lennon e Ringo, 30 anos do fim oficial da banda, 20 anos da morte do John, 10 anos de 1990 ...

Pois é, 2000 teve produto beatle pra qualquer bolso e gosto. Mas dá pra peneirar o que foi botado no mercado. Umas coisas servem para fanáticos e iniciados. Outras servem bem para quem quer saber por que ainda falam em Beatles na entrada do século 21.

Livros ?
Pena que só sai em inglês. Mas vamos lá. Saiu no começo do ano um dito demolidor chamado "Lennon in America", que primeiro declara sua admiração por John para desancar tudo que é bastidor obtido por segundas ou terceiras fontes. John é tudo: recluso, sadomasoquista, masturbador, espancador de esposa japonesa, explosivo, temperamental, manipulado pela mesma esposa japonesa ... Vale por ser um enfoque diferente da maioria do material publicado. 

Ok, onde há fumaça, há fogo ... Mas seu autor Geoffrey Giuliano é de duvidosa confiança: já fez uma fraca "biografia" de Pete Townshend (do The Who) cujo ponto alto era "o dia em que me encontrei com Pete". Bom pra ele.

"Anthology", a autobiografia oficial dos Beatles, é maravilhosa para fãs. E um defeito: como os assuntos "pulam" sem explicação porque o texto só tem depoimentos, quem não conhece previamente a história dos Beatles fica boiando. Mas as fotos de arquivos pessoais dos moços de Liverpool encantam.

"Lennon Remembers" é um livro pequeno com a íntegra da famosa entrevista "o sonho acabou" de Lennon para a revista "Rolling Stone" na virada de 1970 para 1971. As fitas foram reouvidas para esse relançamento. Machucado pelo fim dos Beatles e outras coisas, Lennon é politicamente incorreto, fala palavrão, chuta todos os baldes que aparecem pela frente.

Hoje, quando astros pop respondem perguntas já calculando se a resposta vai ou não prejudicar as vendas, é absurdo que Lennon tenha se prestado a tal papel. Graças a Deus, ele se prestou.

Discos ?

Lançaram a coletânea "1". Pra quem não tem nada, é ótima. Tem muito do básico. Mas, pra quem gostar, vale recomendar a compra dos álbuns "normais" ou das mais completas coletâneas com dois CDs "1962/1966" (o "álbum vermelho") e 1967/1970" (o "álbum azul").
Também foram relançados dois álbuns solo do John Lennon. "Plastic Ono Band", de 1970, é humano ao extremo. Ele se abre além da conta em todo o álbum, expondo traumas de ser largado por mãe e pai e do fim dos Beatles, com um arranjo seco de voz-guitarra- (às vezes) -piano-baixo-bateria. Pra quem quer só diversão, não é recomendado. Pra quem quer música feita por gente, compre já! As faixas bônus não têm a ver com o álbum.
"Double Fantasy", o álbum que saiu dois meses antes da morte de Lennon, tem sete músicas de Lennon e outras tantas de Yoko Ono, que pedem pra serem puladas. Mas, entre os bônus, está a demo de "Help Me to Help Myself", um gospel caseiro de John que merecia ter entrado no álbum original, no lugar de qualquer das faixas de Yoko.

Por que é que eu lembro dessas coisas ?

Só me dei ao trabalho dessa pasmaceira toda por amar Beatles e porque meu grande amigo Petillo pediu, senão nem ia escrever tanta baboseira. Mas eu gosto disso, meus caros. Até já pisei em Liverpool, só para descobrir que é uma cidade que não tem nada para ver se você não gostar dos Beatles (ou, vá lá, do Echo & the Bunnymen).

E esse "mardito" desse Lennon aceitando uns tiros na frente de casa? Eu lembro que, no começo da madrugada de 9 de dezembro de 1980, eu estava tentando pegar no sono com o rádio ao lado da cama ligado na Bandeirantes AM. Tinha acabado de acabar um programa que eu, nos meus 13 anos, achava legal. O "âncora" era um tal Miguel Vaccaro Neto e o destaque do programa era um teste "Não diga não", em que ouvintes ligavam e não podiam falar a palavra "não" durante um minuto em que eram bombardeados pelas perguntas capciosas dele. Poucos conseguiam.

Após esse programa, entravam o jornalismo da emissora e músicas. Qualquer hit de 1980 foi seguido por um boletim especial que dizia que Lennon tinha sido assassinado. Eu ouvi, gelei, mas ficou nisso. Acordei no dia seguinte e aproveitei as férias escolares para passar o dia vendo o noticiário na TV. Chorei? Não. Eu era devidamente auto-reprimido pra isso. Fui chorar nove anos depois vendo as cenas da galera na frente do prédio Dakota no documentário "Imagine", dentro de um cinema escuro (claro... alguém já viu um cinema todo aceso durante o filme?).

Catzo! Lennon e os Beatles são um assunto complicado. Já li gente escrevendo que gostar de Beatles era um negócio de condicionamento igual a treinar ratinhos em laboratório para reagir de certa forma a algumas coisas. De acordo com a pessoa sensível que escreveu tal coisa, Beatles é algo impingido para provocar emoções. As pessoas são induzidas a reagir 
emocionalmente a uma música beatle. Eu anotei mentalmente quem escreveu isso, mas não vou entregar. Essa pessoa (se estiver viva) tem mais opções de diversão que eu ou você que está perdendo seu tempo precioso lendo isto. Portanto, ela está certa.

O ratinho se despede: tchau.

Marcelo Kbla Orozco, Conselheiro Crispiniano do "Scream & Yell", é jornalista do site www.elfoco.com

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Fotos, fotos e mais fotos (Próximo ao começo e perto do fim)