Teorias do Mestre Opala
série em 07 capítulos por Eduardo Palandi
02/11/2001

Capítulo 05
Frank Sinatra: o maior rockstar de todos os tempos

Se o rock (argh) fosse um ser humano, já teria idade pra ser avô. Considerando que o marco zero de sua vida é a gravação do primeiro compacto de Elvis Presley (aquele que ele deu de presente pra mamãe, lembram?) em 1953, são quarenta e oito anos de muita história e muitos personagens. Um querendo levar mais vantagem sobre o outro, um rockstar mais pilantra e encrenqueiro com o outro (tirem o Chris Martin dessa afirmação). E se fôssemos parar pra pensar em quem é o maior rockstar de todos os tempos?

É, grande questionamento. Durante muito tempo eu acreditei que Steven Patrick Morrissey (que dispensa apresentações mas, vá lá, cantou nos Smiths de 1982 a 1987 e tem uma carreira solo que está em primeira marcha no momento) fosse o maior de todos. Mas são muitos nomes. Nos anos 1990 mesmo, que se encerraram com o paradigma da bundamolice chamado Coldplay, dava pra colocar Richey James, Billy Corgan, Kurt Cobain e os irmãos Gallagher como os grandes gênios da arruaça poética coberta por guitarras, sem contar o canalha que Bono Vox se tornou a partir de Achtung Baby, de 1991 (tão canalha que precisava de alter egos para plotar todo o seu cinismo).

Mas, depois de muito matutar, mestre Opala descobriu que nenhum dos supra-citados é o maior rockstar de todos os tempos, e que o título é de alguém que nunca tocou rock: Francis Albert Sinatra é o nome da fera. Pessoas podem estar se questionando ao ler estas linhas agora: "Frank Sinatra? Isso não tem cabimento." Tem sim, Poliana. Listo abaixo algumas razões pelas quais Frank Sinatra é o maior rockstar de todos os tempos:

1. SACANEIE SEUS INIMIGOS – Um dos requisitos básicos pra ser um rockstar é fazer piada dos outros rockstars. Sinatra não poupava seus desafetos na hora de fazer declarações: Bing Crosby, Gene Kelly, ninguém escapou de sua língua feroz, e ninguém teve mais fama do que ele em momento algum da carreira.

2. FAÇA GUERRA, MAS FAÇA AMOR COMIGO – Frank Sinatra foi o cara que teve a mulher que quis, na hora em que quis. Desde sua Nancy até Ava Gardner, passando por metade de Hollywood e pela alta-sociedade ianque, foram poucas as senhoritas (e as senhoras) que resistiram ao charme dos olhos azuis. Seja pelas letras que cantou, seja pelas técnicas de conquistas que tinha, como bom gaiato nativo de Nova Jérsei, Sinatra foi o Casanova do século XX. E isso é rock, entendeu agora?

3. MORRAM DE INVEJA, THOM YORKE E ROGER WATERS – Muito se falou nos idos dos anos 1970 sobre uma praga de nome disco conceitual. Recentemente, com o advento de OK Computer, o frágil e maravilhoso terceiro disco do Radiohead, a idéia de se fazer um disco com idéia central e fio condutor de canções teve um "revival". Não faltaram vozes pra dizer "o Radiohead não está fazendo nada que o Pink Floyd não faça desde 1972". Tá, tudo bem. Mas Frank Sinatra fez um disco conceitual bem antes do Pink Floyd: em 1955 saía In The Wee Small Hours, primeiro trabalho seu na Capitol/EMI, com dezesseis músicas que falavam sobre... fossa. Sobre estar sozinho nas primeiras horas da manhã. Não é experimentalismo, aqui é pioneirismo mesmo.

4. UM GÊNIO POLIVALENTE – Hoje são poucos os artistas que se arriscam em várias frentes. Harry Connick Jr. e Chris Isaak são dois deles, Ewan McGregor já mostrou que poderia ser um bom cantor, e Johnny Depp já mostrou que, como cantor, é um ótimo ex-namorado da Winona Ryder. Lembre-se: Frank Sinatra foi ator, dançarino e cantor, fazendo as três coisas com maestria. Na época em que o Oscar valia alguma coisa (entenda-se pré-O Guarda Costas), Sinatra foi agraciado com um.

5. NÃO SE APOSENTE NO TOPO, MORRA NO TOPO – Ok, quando nosso Frank partiu para o andar de cima, em 1998, não estava no número 1 da Billboard nem tinha público formado por adolescentes, mas, aos 83 anos, era o único octogenário do planeta a ter contrato com uma grande gravadora, novamente a Capitol/EMI. Como se isso não bastasse, cabe aqui a pergunta: que outro rockstar, aos 65 anos, levou 200 mil pessoas ao Maracanã?

6. QUALIDADE DOS DISCOS, EIS O MISTÉRIO DA FÉ – Até agora pouco foi dito por mestre Opala nessa coluna sobre a qualidade dos discos de Frank Sinatra. E um dos requisitos pra ser um grande rockstar, ao contrário do que se pensa, é fazer bons discos. Nosso ol’blue eyes fez isso aos montes. Seu primeiro período na Capitol (1953 a 1962), rendeu pelo menos onze discos excelentes, de onde se destacam In The Wee Small Hours, Songs For Young Lovers, Sinatra Sings For Only The Lonely e Come Dance With Me. Na Reprise, onde ficou de 1963 até meados dos anos 1980, gravou o disco com Tom Jobim e perpetrou a maioria de seus hits no Brasil, como My Way, Strangers In The Night, Come Fly With Me, Moonriver e Love And Marriage. E a revista inglesa Q, em seu website, aponta "apenas" nove discos de Frank Sinatra como essenciais, dignos de discoteca básica.

7. NASCER COM CARISMA É LEGAL – Frank Sinatra era uma (quase) unanimidade. Ainda o é. Do U2, que o homenageou em Two Shots of Happy, One Shot of Sad, e Elastica (Justine Frischmann é uma profunda conhecedora da obra do mestre), ao seu tio solteirão e sua sogra, é difícil achar quem não simpatize com ele. Muito por obra de suas canções, mas também pelo carisma: é como se fosse aquela pessoa querida, que pode tanto estar te dando conselhos amorosos quanto ridicularizando quem merece. Aposto que isso ele não adquiriu numa universidade.

8. ONDE OS RATOS NÃO VOAM – Nos anos 1940 e 1950, existiu em Hollywood o chamado "Rat Pack", um grupo de stars que contava também com Sammy Davis Jr., Dean Martin, Peter Lowford e Joe Bishop, e que se assemelhava a uma pequena máfia, mas com um único e peculiar interesse: comer todas as deusas do cinema norte-americano da época, além das cantoras de jazz e quem mais lhes dessem na telha. Melhor tradução pra expressão "amo todas, você é a próxima" não existe. E o grande líder da "Rat pack" era ninguém mais, ninguém menos que... Frank Sinatra.

9. FALANDO EM MÁFIA... – O sobrenome já denuncia: teria Francis Albert Sinatra ligações com a máfia? É vero, caro leitor. Nosso rockstar-mor esteve envolvido com os principais nomes da máfia italiana em Nova Iorque, além de ter visitado várias vezes a Itália para cantar para os chefões mundiais. Digam-me... alguém do Mogwai fez isso? E o Jonny Greenwood, do Radiohead? Não também. Michael Stipe? Passou longe. Na hora de se envolver fora do país natal, até mesmo os Beatles foram achar uns doudos indianos e passaram longe da máfia. E não era apenas pra cantar: os interesses de Sinatra eram defendidos pela máfia, e a CIA devassou sua vida nos anos 1950 e 1960 atrás de evidências que o ligassem aos mafiosos. Achou muitas, em documentos que foram revelados ao público a partir de 1996.

10. UMA HISTORINHA PRA ILUSTRAR – No começo dos anos 1990 (minha memória me trai, mas acho que foi em 1992), o diretor de cinema e nerd nas horas vagas Woody Allen deixou sua esposa à época, Mia Farrow (ex de Frank Sinatra) para ficar com sua filha adotiva, Soon-Yi Previn. Farrow, desconsolada, foi procurar abrigo nos braços de Frank. Depois de contar a ele o que havia acontecido, Sinatra virou-se pra ela e disse, serenamente: "quer que eu mande alguém pra quebrar as pernas dele?". Não pense que o Axl Rose faria isso. Provavelmente ele diria "que merda, hein?".

11. E CADÊ O ROCK AND ROLL? – Pois é. Antes do Jesus & Mary Chain e do Lenny Kravitz falarem mal do rock, Frank Sinatra já dizia que o gênero era uma merda (isso por volta de 1965, no auge da beatlemania). Morreu sem nunca ter gravado um rock. Mas mesmo assim é o maior de todos os rockstars.

Eduardo Palandi, 19 anos, está apenas começando a conhecer a obra do maior rockstar de todos os tempos, e fazendo uma vaquinha pra comprar as box-sets “Concepts: the Capitol years” e “The complete Reprise years”, com 20 CDs cada. E ainda tem a “Columbia years 1942-1953”, com mais doze. Todas importadas, dammit.