Matérias Antológicas
Romance com alma rock and roll
de Thales de Menezes
09/07/2003

Vitrine de loja de discos é sempre um horror. Só capas de megahits das FMs, pagode e música italiana. Nesta semana, elas estão inundadas de CDs românticos: "Love Hits", "For You" e outras preciosidades na linha "música para ouvir amando".

Para quem realmente quer encantar o namorado ou a namorada, a ordem é desprezar essas coisas melosas e escolher uma trilha sonora digna de seu amor: romance com alma rock and roll.

Patti Smith, musa punk e poeta dark do rock, canta no álbum "Easter" uma balada que penetra nos ossos: "We Three", mistura de rock e blues que abala.

Menos intensa e mais "para cima", Lucinda Williams gravou "Passionate Kisses", perfeita para cantarolar após o encontro com a pessoa amada. "Sou feliz porque tenho um sofá confortável para ficar com você", diz a letra.

Paul Westerberg, ex-líder da banda seminal Replacements, já compôs grandes canções, mas "Runaway Wind", de seu primeiro CD solo, é definitiva. Tudo aquilo que alguém gostaria de escutar bem baixinho no ouvido.

Às vezes, a música nem precisa ser uma balada. "The Waiting", do Tom Petty, é rock rasgado, mas fala tudo sobre a angústia de ficar longe da mulher amada. Está no álbum "Hard Promises", clássico obrigatório.

Falando em discos indispensáveis, "Lovers Who Wonder", da injustamente esquecida banda Del-Lords, é outro. Um álbum quase monotemático. Paixões arrebatadoras, noites quentes e muita dor-de-corno em formato rock. A capa, com a foto de um casal tomando café num bar de estrada, resume tudo. A faixa "You and I" pulveriza libidos.

Uma opção de presente carteiro para a data romântica é qualquer um do cantor Lyle Lovett, aquele que foi casado com a Julia Roberts. Ele é infalível. Alguém que escreve "eu só casei com ela porque era muito parecida com você" merece respeito. E um cara tão feioso que conquista uma musa do cinema deve realmente saber falar de amor.

Mas ninguém toca a alma como Bruce Springsteen. O "chefão" é mais conhecido no Brasil por seus rocks vigorosos e o jeitão de mecânico de oficina, mas seus álbuns estão coalhados de músicas que cortam corações apaixonados como faca na manteiga.

"Book of Dreams", do álbum "Lucky Town", é de arrepiar. A letra mostra a felicidade de um cara que aguarda a noiva no jardim da casa dos pais dela, com tudo pronto para o casório. Seria piegas, se Springsteen não tirasse poesia das coisas mais banais.

O álbum "Tunnel of Love" é, inteiro, uma coleção de grande canções de amor. Springsteen fez o disco para sua primeira mulher, que teve a manha de dar um pé no traseiro dele poucos meses depois. Enfim, coisas das quais nem um rockstar escapa.

Canções como essas tornam qualquer namoro muito especial. Se seu(sua) namorado(a) não gostar, não mude de trilha sonora. Troque seu objeto de desejo.

Texto publicado em 08/06/98 na coluna "Escuta Aqui" do caderno Folhateen do jornal Folha de São Paulo. Já republicado pelo S&Y na versão on paper número 4, especial sobre... relacionamentos.