Eu queria entender o silêncio
de Marcelo Silva Costa

Eu queria entender o silêncio. Queria. Você me olha. Desafia. Eu quero descobrir o que acontece no espaço. 
Eu quero aprender a esquecer o tempo. Eu queria entender o silêncio. Queria. Me explica? Meu coração partido apenas grita. E as memórias iluminam o inferno. Noite adentro de mãos dadas. Vamos esperar a última palavra. 
Vamos rescrever a história. Trocar de roupa. Eu queria sua boca. Sua nuca. Mas, nunca. Você me olha. Silencia. 
E eu não entendo o seu silêncio. Não entendo a mim mesmo. Nem o vento nos explica. Apenas nos leva. Nada nos guia.  
Eu quero descobrir o que acontece no carnaval da Bahia. No pôr-do-sol no Guaiba. 
Nas esquinas que existem mas não existem em Brasília. 
Nas estradas de terra que nos levam de lugar nenhum a nenhum lugar. Eu quero te encontrar perdida em alguma esquina. Em algum cinema. Em algum bar. Queria beijar suas pernas. Te banhar de cerveja. Beber-te inteira. Ficar de ressaca. 
Eu quero ouvir estrelas, Almir Sater e Belle and Sebastian. Descobrir o significado da palavra desejo. Eu quero um beijo. 
E eu queria entender o silêncio. Queria. Você conta até dez. Eu perdi minha vez. Era vinho branco. Mãos tocando. 
Conte de novo. Estou sonhando teus olhos. Olhando teus sonhos. Exorcizando meus fantasmas. Você não disse como acaba. Eu não sei como termina. Eu queria. Queria. Não aprendi a lidar com tempestades. Não me acostumei à calmarias. 
Mas coloco minha bermuda e vou caminhar na rua. Mas ligo meu walkman e vou andar na chuva. 
É doida essa loucura de se apaixonar verdadeiramente em três minutos. Me desculpo. Estou triste por seu louco. 
Vamos, fica mais um pouco. Uma noite e mais dois outonos. Chocolates e biscoitos. Livrarias e cafés de madrugada. 
Você pode beijar mas não pode esquecer. Eu posso ser tolo mas não posso me entregar. Eu quero ser seu coelho da páscoa. Eu quero ser sua árvore de natal. Eu quero aprender a entender seu silêncio. Eu sei onde marquei os sinais. 
E estou me rendendo. Quebrei as xícaras. Isso tudo é obsceno. Isso tudo é Michael Stipe. Estou triste por gostar de você. Deixa pra lá, não sei mentir. Mas venha beber comigo. Venha dançar comigo. Vamos ensaiar o romance. Exercitar saudade. Estou tentando te colocar em transe. E preciso acordar. Estou em transe. Vivi essa semana por você. Durmi por você.
Bebi por você. Ouvi música por você. Deixei de comer por você. E agora preciso voltar a viver por mim. 
Preciso aprender a respirar, de novo. Preciso reconhecer o gosto do gozo. Entender essa paixão pelo abandono. Esse sono. Preciso conhecer as manhas e as manhãs, o sabor das massas e das maças. E aprender a entender o silêncio. Eu queria. 
Eu quero. Estou surpreso. Estou surpreso com tudo isso. É dolorido e é divertido. Estar vivo estar vivo. 
Você partiu e fiquei morto. Mas continuo respirando. É preciso esperança. 
E algumas doses de pinga, ervas, calmantes, flores, perfumes, poetas, amores. Eu só não sei onde. Nem quando. Nem como. Talvez em Londres. Tanta fome. Eu quero sentir calor. Como quem ama. Quero me sentir amado. Inquieto. Como antes. Como em Londres. Nunca como antes do almoço. Não entendo o seu silêncio. Não desisto do amanhecer. 
Admiro as montanhas. Admiro você as admirando. Fico olhando teus olhos. Sonhando teus sonhos. Contando o gado. Admirável mundo novo. Alta fidelidade. Lua crescente em Amsterdã. Sagitário e Leão. 
Procuramos longe a felicidade que está ao alcance da mão. Mas a minha mão não te alcança. Me explica essa distância. Minhas mãos não te tocam. Nem tocam piano. Nem violão. Me explica esse amor. Me explica o seu silêncio. 
Te quero. Eu quero. E estou sozinho. E estou perdido. E não te encontro. E não te encanto. Mas você me olha. 
Escorre uma lágrima. Me abraça. O resto é história. O tempo passa. Em silêncio. 
E eu não uso relógio.