Nobody Loves You When You're Down And Out
editorial maio 2001

Mais uma atualização no ar, mais um novo editorial. Tanta coisa para falar, mas também tanta vontade de ficar em silêncio. O antagonismo anda reinando. Muito disso é fruto de tudo que eu e o Alexandre temos passado nos últimos meses. Garotas indies, empregos terríveis, poluição, psiquiatras, gente que só quer aparecer, comida de boteco, cerveja Kaiser e muito desânimo tem rondado a casa S&Y já faz um tempo e as marcas já começam a querer virar cicatrizes, afinal, a gente é meio filho da puta mesmo, mas a gente tem coração (e, importante: a gente só tem carne dentro do coração)...

Nadar contra a corrente cansa. Dar murro em ponta de faca machuca. A saída? Talvez, mudar de ares, quem sabe. Enquanto o Alexandre cogita a idéia de se esconder dessa loucura em algum cantinho das Minas Gerais, eu fico aqui pensando para onde ir, em que lugar armar a minha tenda e acender o cigarro que eu não fumo. Tem gente falando em Recife. Outros falam em Porto Alegre. Eu mesmo penso em procurar alguma cidade praieira no litoral nordestino, uma cidadezinha que nem conste do mapa, um lugar em que eu possa levar alguns livros, alguns cds (só as cópias, afinal os originais talvez entrem em um grande leilão via net – esperem) e minha vontade de escrever um livro (aí só irá faltar ter um filho, pois uma árvore eu já plantei).

O que isso tem a ver com você, caro leitor? Bem, nada. E tudo. Se algumas das coisas acima realmente acontecerem esse zine que a gente ama muito ficará aqui como lembrança bacana de muita coisa legal, desse quase um ano em que, acho, crescemos, ou como diria o grande amigo André Takeda, descongelamos. 

Eu sei que está soando com uma grande despedida, mas, acredite, não é, ou talvez até seja, e só o tempo poderá dizer. Quem sabe a gente não volta aqui no mês que vem afiados e reclamando com idéias e teclas dos jornalistas que escrevem sobre música e que só gostam do que não é cantado em português, das bandas que vivem fazendo som pra meia dúzia de pessoas e reclamam que falta união na cena independente (união não é açúcar?), dos indies que acham que a coisa mais maravilhosa do mundo são bandas que só meia dúzia de gatos pingados  conhecem ao invés de Buddy Holly, John Coltrane e Beatles, de nós mesmos e de todos. Quem sabe? 

O fato é que o mar não está pra peixe, que estamos passando um puta sufoco nessa cidade em que o mais eficaz é jogar os problemas para debaixo do tapete (como bem definiu Alexandre Matias no obrigatório texto sobre o Abril Pró Rock) e que estamos de saco cheio de tanta falsidade e hipocrisia. Basta. 

Aliás, o mar não está para peixe mesmo, afinal, o Ricardinho marcar um gol decisivo a 4 segundos de acabar o jogo é coisa que talvez só São Jorge explique, é coisa de quem conhece o mar, ou melhor, a praia, é coisa de quem está acostumado a morrer na praia. Santistas, me desculpem, mas até o ano que vem. Vai Curintia, ou como diria Vicente Matheus numa hora dessas, sobre esse editorial completo: “O jogo só acaba quando termina”.

Bola pra frente.

Ps.  Já há muito tempo eu estou devendo estas dedicatórias, e acho que chegou a hora. Esse editorial e esse zine são dedicados a três grandes amigos que eu tive e que já não estão mais aqui:

Irani Marcelo da Silva – O pessoal da minha turma conhecia ele por Marcelão. Ele tinha quase dois metros de altura, havia cantado em bandas heavy metal e era fã de Deep Purple, Black Sabbath e de uísque. Um belo dia tava eu em casa quando ele aparece com uma garrafa de Old Eight (é assim que escreve mesmo?) e a gente matou a garrafa ouvindo Deep Purple, Led Zeppelin e quebrando vinis do Costinha. Uma semana depois, num acidente bobo, ele se foi. E fez uma falta danada. Ele tinha 21 anos, a mesma idade que eu tinha na época. 

Douglas Mendes Souza – Meu irmão sem ser. Ele tentou me ensinar a andar de skate (e eu não aprendi) enquanto eu mostrava pra ele Echo & The Bunnymen e The Clash. A gente ficava horas e horas conversando sobre bandas, garotas e bandas e garotas e o Corinthians e garotas e bandas. Amizade roqueira das boas que durou até o dia em que sem ninguém entender ele se foi. Ele tinha 23 anos. Eu já tinha 26 e naquele momento tinha perdido meu melhor amigo. Se estivesse vivo com certeza vocês iriam conhecê-lo, ele iria escrever nesse zine. 

João Marcelo Gonçalves – Um cara muito inteligente e que gostava de gostar do que a maioria das pessoas que a gente conhecia não gostava, inclua aí Engenheiros do Hawaii e Metallica fase Load. Se não fosse ele, nada disso teria acontecido. Foi ele que em plena duas horas da tarde de 25 de dezembro de 1996 entrou no meu quarto, na mesma hora que Morrissey gritava que a rainha estava morta, e me fez o convite mais doido que eu poderia receber num dia de natal: “VAMOS FAZER UM ZINE?”. Eu só tinha folheado alguns zines até então, e tinha sufocado minha vontade de ser jornalista, porque no horário da faculdade que eu poderia fazer ($$$$) só havia curso de publicidade, e aquele convite me soou doido, mas é natal e o ano novo está chegando e é hora de fazer planos. Foi ele quem deu esse nome ao zine. E foi no computador dele que eu fui buscar (quase um ano depois) a matriz rascunho do primeiro exemplar que já estava praticamente pronto quando um carro atravessou o caminho da moto dele. Ele tinha 23 anos. 

Faz muito tempo que eu queria dizer isso a vocês três. 

Aos vivos, e principalmente ao amigo e sócio Alexandre Petillo, força sempre.

Marcelo Silva Costa
Editor
Maio/2001