Feedback - Rush
por Leonardo Vinhas
Foto - Rush.Com

lvinhas1@yahoo.com.br

04/10/2004


O Rush é uma das bandas mais cercadas de pré-conceitos (bons e ruins) que existe. Adoradores idolatram a banda quase sem juízo (como toda idolatria) e detratores detonam sem nunca ter ouvido um disco inteiro da banda. Não cabe dizer qual está certo ou fazer um retrospecto histórico da banda. Digo apenas que Feedback, seu novo disco, é muito dos bons.

Tá, é um disco de covers. O baterista Neil Peart pode dizer que é um disco que foi feito para comemorar os 30 anos da banda, que eles se sentiram como garotos novamente e etc.

De qualquer forma, vai ficar aquela pulga atrás da orelha de que o pique não é o mesmo, afinal até a regularidade de um disco ao vivo para cada quatro de estúdio foi quebrada com o lançamento prematuro do populista (e bom) Rush In Rio. Mas a idade chega e Peart e seus amigos lançaram um disco decente.

Não tão bom quanto os três excelentes discos dos anos 90, Counterparts (indispensável), Test For Echo e Vapor Trails, mas muito bom. Dinossauros como Led, Who e Floyd lançaram discos medíocres antes de se desmebrarem ou de seus integrantes baterem as botas. Eles, fora a fase pop sintetizada de Signals, Grace Under Pressure e Power Windows na primeira metade dos anos 80, não deram nenhum furo n'água. E Feedback honra a tradição.

Honra as raízes canadenses também: há dois covers do Buffalo Springfield. Mr. Soul é a única que não caiu bem no disco, é meio complicado transformar um country rock fossento num rockão estilizado e sombrio. Mas For What It's Worth virou rockão de primeira, com um crescendo que torna indelével os versos "hey, hey, what's that sound? Everybody knows what's going down. E aí são só acertos!

No geral, o pau come solto. For What It's Worth pode ser até mais cadenciada (mas não menos empolgante), mas The Seeker e Seven And Seven Is estão aí para lavar os ouvidos de quem está com saudades de uma guitarrona alta e cristalina, mas sem "polimentos".

O hit do Who virou uma bordoada saltitante, coisa de quem não tem saco para ficar com riff de folk rock sincopado, enquanto que a faixa mais manjada do Love dá espaço para Peart mostrar porque que é uma lenda nas baquetas e pedais. A abertura, a carga de Summertime Blues, também é uma britadeira só, rebimbando vitalidade e soando muito divertida na voz aguda de Geddy Lee.

Porém, a cereja está no final: Crossroads, de Robert Johnson, emulada da versão do Cream, circula e serpenteia de forma direta e aguda na guitarra de Alex Lifeson, enquanto a cozinha espalha o pavimento com uma jam acachapante. É curioso ver Lifeson, habitualmente o mais "cerebral" e contido instrumentista do Rush, soar tão barulhento e instintivo aqui. Um lance chamado feeling, sabe?

Há ainda duas rendições ao pop, ambas surrupiadas dos Yardbirds: Shapes of Things e Heart Full Of Soul, sendo a última a canção com a sonoridade mais evidentemente retro. É um disco preso ao passado? É. Nostálgico? Não. Ele recupera canções mais bacanas e lhes confere, mesmo à datada Heart..., uma roupagem atemporal (e não "moderna"). O Rush não é moderno, nunca foi. Bem produzido, tecnófilo, aí talvez sim. Mas é uma banda desvencilhada de convenções de tempo. Uma banda que consegue fazer um discão de rock em meros 27 minutos, lavado, direto e na cara. E divertidíssimo.

Site Oficial do Rush