Entrevista - Ronei Jorge e os Ladrões de Bicicleta
por João P. Barreto
Foto: Divulgação
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24/10/2005

O rock na Bahia está apresentando faces surpreendentes. Visto por muitos como um Estado sem muita propensão ao rock'n'roll (mesmo tendo apresentado Raul Seixas e Camisa de Vênus, dentre outros), a Bahia está revelando artistas que poderiam fazer a diferença no mainstream do cenário nacional, caso o quesito de análise fosse qualidade e não verbas de patrocínio e divulgação (o popular jabaculé).

Nessa leva de boas bandas surgem nomes como Rewinders, Honkers, Retrofoguetes, Nancyta e os Grazzers e Brinde, dentre outras. E a Ronei Jorge e os Ladrões de Bicicleta. Muitos soltam um "quem?" ao escutar o nome deles, mas a banda já começa a alcançar um merecido destaque no cenário rocker atual com músicas sinceras e tão surpreendentes quanto seu nome.

Usando as palavras do cantor e compositor Paquito, um dos agitadores da cena baiana, a respeito de Ronei: "Ronei Jorge é um compositor pop de canções brasileiras. A sua prática de música foi amadurecida cantando em banda de rock, o que confere aquele tom de liberdade e frescor típico dos que foram influenciados pela urgência presente neste tipo de música. Só que essa liberdade, ao contrário do que fazem os incautos que dela se tornam prisioneiros, o fez voltar os ouvidos para a tradição da canção popular brasileira.".

Soa clichê ler isso já que hoje em dia, para parecer cool, tantas bandas se dizem influenciadas por MPB, mas no caso de Ronei a influência não soa pretensiosa ou falsa. Suas músicas não narram banalidades. Narram justamente detalhes que poucos reparam, como na canção Veja Só: "Paz, paz e mais paz/ Se a gente tivesse uma resposta/ Talvez de surdos nós nos fizéssemos/ Pois é do mistério que a gente gosta"; narram momentos de melancolia como em A Dois: "Vem meu amor/ Vem diferente/ Tenha compaixão/ Daqui pra frente"; e também momentos de dúvidas ínfimas que são jogadas com fúria na nervosa Sete-Sete: "Um batalhão de coisa nenhuma/ É o que ofereço, é o que tenho/ Quem é que pode te dar/ Mais possibilidades/ Quem vai ceder a esse desastre/ De poder te ganhar/ Se não eu?"

E os Ladrões de Bicicleta? O que esperar de uma banda que homenageia o cinema italiano e surge na Bahia? Paquito, a palavra é tua novamente: "E os Ladrões de Bicicleta, longe de serem meros acompanhantes, injetam nas canções de Ronei elementos de samba-jazz e brasilidade sem ser folclóricos e sem perder o punch. Refinamento e vigor, fúria e delicadeza, tudo se une pra dar o tom preciso e incômodo, mostrando que na Bahia o rock e a canção brasileira podem não só coexistir sem traumas e livremente, como formar um todo indissociável, como são indissociáveis hoje Ronei (voz e guitarra), Pedrão (bateria), Edinho (guitarra) e Sergio (baixo)".

A Ronei Jorge e os Ladrões de Bicicleta lançou o EP A Dois no primeiro semestre de 2004, e carimbou seu passaporte para a final do concurso nacional "Claro Que é Rock" ao vencer a etapa baiana do evento. O grupo se apresentará em São Paulo, na final do concurso, no mesmo dia (26/11) em que vão pisar no palco ícones como Iggy Pop & Stooges, Sonic Youth, Nine Inch Nails, Flaming Lips e Nação Zumbi. Enquanto se prepara para o show, a banda baiana projeta o lançamento de um álbum e arranja tempo para um papo animado com o S&Y pouco antes de um show onde qualquer um poderia constatar algo que há tempos precisava ser provado: Bahia é terra de Rock. E dos bons! Esqueça Pitty. Roney Jorge e os Ladrões de Bicicleta provam sem falsas atitudes o que realmente a Bahia tem a oferecer de bom. Confira o papo.

O atual cenário rocker baiano tem alcançado níveis, em âmbito nacionais, bem diferentes daqueles vistos na década passada. Como você vê essa mudança?
Ronei - Eu acredito que o período atual é fértil para o rock. Nós temos boas bandas hoje e o cenário se tornou mais propício, um pouco melhor para que possamos mostrar o trabalho. A facilidade de se fazer um CD, também, né? As facilidades que se encontram com a Internet (também) facilitou a divulgação das bandas daqui de Salvador para Rio-São Paulo, ou seja, para o circuito de fora.

Você citou um ponto importante que é a Internet. Hoje em dia você consegue uma música de uma banda daqui (Bahia) bem fácil, assim como pessoal de fora...
Ronei - Isso! Antigamente era bem mais complicado. Nós tocávamos na década de 90 e era muito complicado mesmo. Era muito difícil alguém de São Paulo-Rio imaginar que aqui tivesse outro tipo de música que não fosse a de carnaval naquele período. Era difícil mandar qualquer material pra lá (RJ/SP)...

E essa importância que a gente dá ao sudeste? Isso soa desconfortável? Isso incomoda?
Edinho - Isso é mais pela quantidade de veículos de comunicação que tem lá, entendeu? O País está mais antenado no que acontece lá, digamos assim. Aqui nosso esforço é visto, claro, já que a gente acaba fazendo isso se propagar. Mas eu acho que lá é muito mais fácil para uma banda mostrar seu trabalho. É um pouco por isso também.

Pedrão - Mas eu acho que no final das contas é só querer mostrar um trabalho para o maior número de pessoas possível.

Ronei - Estávamos até conversando sobre isso no primeiro show que fizemos. Nós sentimos a empatia do público, e nós temos tido felicidade no retorno das pessoas que têm assistido aos shows e gostado. É muito difícil você explicar o motivo de alguma coisa dar certo e outras não. É algo complicado. Nós trabalhamos como boa parte das bandas daqui de Salvador trabalham e muitas outras também conseguem êxitos sensacionais, como Retrofoguetes, Theatro de Séraphin...

Ronei, você fazia parte da Saci Tric há alguns anos. Chegou até a gravar um disco no Teatro XVIII no Pelourinho, que foi um verdadeiro petardo. Naquela época, a banda era vista mais como underground, voltada mais para um público antenado, que buscava as coisas, que garimpava mesmo. Já a Ronei Jorge e os Ladrões de Bicicletas está começando a entrar no mainstream, está caminhando para isso...
Pedrão - (interrompendo) Opa! Que bom! (risos) Essa constatação aí eu já gostei... (mais risos)

Mas é verdade! (risos) É um ponto a ser observado. Então, diferente daquele período em que você esteve no cenário underground, onde o público tinha de buscar, tinha que correr atrás, hoje é mais fácil chegar até vocês, principalmente depois de abril, quando vocês levaram o Claro que é Rock e o prêmio de melhor banda do ano passado junto com o Honkers. Como vocês estão encarando essa nova realidade?
Ronei - Nós temos tocado com a mesma felicidade com que eu tocava com a Saci Tric. É óbvio que as coisas mudam um pouco. Essa coisa de tocar é meio louca, (mas isso) de underground é algo que rolou muito nos anos 90 por causa da dificuldade de divulgação, sabe? Não dizendo que a Saci alcançaria ou não o que a gente alcançou, mas eu acho que naquela época era mesmo mais difícil. As bandas estão conseguindo explorar mais essa coisa de se comunicar com o público.

O contexto da época também influenciava. Não existiam tantas facilidade como a Internet, MP3...
Ronei - Pois é. Não havia mesmo!

Pedrão - E dando um pitaco nessa pergunta, e que tem a ver com a outra, acho que são vários movimentos que têm feito com que o cenário seja mais favorável hoje em dia. Talvez, um deles seja o fato de o axé ter tido uma caída.

Ronei - É, caiu um pouco.

Pedrão - Existe um pouco mais de espaço na mídia para outra coisa na Bahia que não seja axé.

Ronei - A mídia também tem procurado um pouco mais.

Pedrão - Pô, dez anos atrás não tinha esse espaço. A Bahia sempre teve bons artistas dentro e fora do mainstream (enfático). Sempre! Desde Dorival Caymmi, Tom Zé, João Gilberto, Caetano, Gil. Você acha de tudo! A Pitty é o maior exemplo da conjectura atual, de alguém poder fazer boa música aqui e ter visibilidade nacional. O que mudou não foi a qualidade dos artistas, e sim o ambiente, o cenário. O fato de ser mais fácil gravar um disco hoje em dia ajudou muito. Nós somos do tempo em que gravar um disco chegava a ser impensável.

Ronei - Era a velha fitinha K-7 mesmo...

Pedrão - Imagina só: "Gravar um disco? Você é maluco?" Hoje em dia qualquer guri com um computador grava um CD ótimo.

Ronei - E daí tudo vem agregado. Você faz uma capa legal. Você tem um site. Isso tudo agrega valor também, né?

Pedrão - Claro! E como (a queda d)o axé... Acho que é fato, né? Ninguém pode negar.

Ronei - É deu uma aquietada...

Pedrão - É, caiu um pouco. A industria do axé caiu um pouco então sobrou um pouco de espaço pra outras coisas aparecerem.

Ronei - É, isso é verdade.

E junto com isso surgiram novos espaços para o rock, outras casas dedicadas ao segmento...
Edinho - O engraçado é que a própria estrutura do axé - que era voltada prioritariamente para si mesma - acabou tendo que se adequar um pouco às bandas de rock. Casas como o Rock'n'Rio (popular casa de shows de Salvador que, pasmem, é voltada quase que exclusivamente pra tudo menos para o rock) que era voltada basicamente para o axé, agora recebe uma banda de rock que surpreende o local.

João - Mais surpreendente ainda é o nome da casa.

Edinho - (risos) Por mais irônico que pareça, né?

Pedrão - Uma aberração da natureza! (gargalhadas)

Edinho - Mas você tem ali um lugar bacana pra tocar, equipamentos de primeira...

Pois é. Vocês tocaram lá com o Gram e lembro-me de ter pensado na ocasião:
"Puxa, finalmente fazem jus ao nome da casa".

Ronei - Eu acredito que os lugares têm se preocupado mais com isso por aqui. O Rock'n' Rio já tinha um pouco essa estrutura, e é legal bandas como a nossa, o Teatro de Serafim, Sangria, tocarem em locais como aquele, assim como na Concha Acústica (local onde rolou o festival Claro que é Rock, com o Placebo), afinal nada mais justo que tocar, não ficar nessa coisa underground, já que tem um público interessado, que quer ver. Eu imagino que ninguém queira se underground. É só uma questão de você tocar e as pessoas poderem ver você, se encontrarem ali, gostar do som, voltar depois, ver de novo...

Nada mais esquisito do que aquelas perguntas que rolavam: "Cara, você foi pro show de ontem?". E o outro: "Show? Que show? eu nem ouvi falar..."
Ronei - (risos) É verdade. "Show? Que show?" era algo bem subterrâneo mesmo.

O show em Recife, no Armazém 14, fez você notar que o movimento do mangue-beat já não é o único por lá. Como você compararia essa perda do rótulo mangue-beat com o que a Bahia está "perdendo" em termos de identidade? Se bem que perdendo soa até como algo negativo, já que enquanto perde-se essa identidade do axé ganha-se uma bem melhor (no nosso ponto de vista). Nessa busca de identidade, os baianos estão ganhando uma cara mais rock. Como é que você está vendo essa nova ascensão do rock por aqui?
Ronei - Como o Pedrão falou antes, a música predominante aqui entre os jovens era o axé, enquanto que em Recife teve uma espécie de "buraco" nessa passagem de Alceu Valença para Chico Science. Teve uma lacuna ali que não foi preenchida, e que se preencheu com a chegada do Chico. O público de Recife estava faminto por algo novo e isso foi ocupado pelo mangue-beat, que abraçou esse público enquanto aqui o público jovem consumia axé music. Apesar de dizerem que só se ouvia isso por aqui no carnaval, eu acho que não: era durante o ano todo mesmo. É como o Pedrão falou também: quando um vai se esgotando, entrando em declínio, outras formas de música começam a surgir e outras figuras que não eram do axé começam a ressurgir. Isso se torna um ciclo. As coisas vão aparecendo e sumindo. Nada fica pré-estabelecido. A marca do mangue-beat para Recife ficará para sempre. Mas é engraçado, pois quando a gente chegou lá, algumas bandas comentavam: "Pó, aqui só tinha mangue-beat". Dá mesma forma que nós aqui na Bahia comentávamos: "Aqui só tem axé." Lá em Recife, alguém de uma banda comentou: "Aqui, se você não fosse mangue-beat, não rolava." Então, de repente, havia alguma queixa também em relação a isso. A banda poderia expressar outra linguagem e achava isso ruim.

E hoje? Depois do "Claro que é Rock", depois de ter aberto pro Placebo? Como foi abrir aquele show? A concha lotada e você levando o prêmio da noite? Confesso que estava lá e cheguei a enviar uns torpedos votando em vocês.
Pedrão (interrompendo) - Pô, brigadão (risos)

E então? Todas aquelas bandas daqui, e no final a constatação: foi a Ronei Jorge. O show da noite.
Edinho - Foi uma coisa muito louca. A gente ver aquela concha lotada. A galera realmente respondeu ao fato da gente pisar num palco daqueles, ou seja, ver a felicidade das pessoas por terem bandas que elas gostam e num palco como o da concha, um lugar que a gente adora. Então, para nós foi espetacular! Nós adoramos tocar na concha acústica e aquele show foi maravilhoso...

Pedrão (interrompendo) - Virou até um hábito, inclusive. Tô brincando...

Para mim, a concha é o melhor lugar...
Pedrão - Sem dúvida. É maravilhoso.

Ronei - É "o lugar" para tocar.

Acho que essa pergunta aqui vocês já ouviram muito: Vittorio de Sica.
Cinema e neo-realismo italiano. Fala aí, cara.

Ronei - (risos) É, foi do filme sim. Na verdade, a idéia foi da minha namorada, a Greici (Schineider, produtora da banda). Ela que deu o nome e ficou.

Pedrão - A gente tinha pensado em Os Bebês de Rosemary, mas ficou esquisito... (risos)

Ronei - Acho que não ficaria muito legal (risos). A idéia surgiu assim (com a namorada), mas não tem muita relação com o filme não, sabe? Mas se alguém quiser enxergar isso, está livre. Engraçado é que a idéia do nome surge pra gente de forma esquisita, tipo, sei lá, Kid Abelha...

Pedrão - (interrompendo) Eu não diria isso (risos)

Ronei - É, acho que fui fundo demais (risos)

Pedrão - Eu não diria isso.

Quase como aquela história do "vocês serão Beatles com 'A' "
Ronei - É, a gente pensou: "pó, vamos colocar um nome?" Cara, nome é um negócio muito complicado. Esse veio e ficou. Tanto que hoje a gente já ouve o nome e não lembra mais da relação com o cinema, com o neo-realismo italiano.

João - Vira uma segunda referência para o nome.

Ronei - Exato. Eu mesmo, por exemplo, acho Paralamas do Sucesso o nome mais esquisito que eu já ouvi em minha vida. Mas hoje, eu acho que os caras têm cara de Paralamas do Sucesso. As palavras perdem seu significado e aquilo vira o nome próprio da banda.

Pedrão - (rindo) Nada mais engraçado que Insinuante (popular loja de Eletrodomésticos de Salvador). Ninguém quando entra numa dessas lojas pensa no significado do nome.

Ronei - Agora é que o papo ta parecendo com algo saído de um filme De Sica mesmo (risos)

E essa mistura na banda? Chileno (Pedrão), Baianos (Ronei e Edinho) Paulista...
Pedrão - (interrompendo) Paulista não! Paulista não! (risos) Tem carioca. (mais risos) Tem aquela coisa da aceitação, né? Não dá pra conviver com chileno, carioca, baiano (mais risos). Tolerância é a palavra!

Ronei - Mas todo mundo já é baiano.

Pedrão - Eu já sou baiano. Chile foi só um acidente geográfico. (risos)

Ronei - A gente vive aqui. Somos influenciados pelas coisas daqui, certamente...

Pedrão - (quase sussurrando) É, tipo Luis Caldas... (gargalhadas). Pô, nós somos de uma geração que é muito mais influenciada por U2 do que por Caymmi.

Ronei - É verdade. Nós ouvimos mais isso. É claro que Caetano, Gil, esses caras fazem a cabeça da gente...

Influências sempre soaram para mim como sendo algo muito pessoal, já que um artista pode ser influenciado por alguém, mas não deixar transparecer isso em seu trabalho de forma muito explicita. Já li em várias mídias que suas influências vão de Jorge Benjor à Led Zeppelin passando por Belchior e Altemar Dutra. Você até canta Belchior nos shows...
Pedrão - O que é mais legal de tudo, já que a influência pode estar ali diluída de uma forma única.

Exato. Mas diz aí: O que vocês assumem como influência mesmo? Eu vi uma foto de um show uma vez onde você usava uma camisa do Gênesis...
Pedrão - (fingindo histeria) Você viu aquilo? Você viu?

Edinho - (se lamentando) Todo mundo viu aquilo cara. Todo mundo.

Ronei - Influência é algo meio escroto de dizer por que você limita o que você está fazendo, o que você está propondo. É mais legal se referir a gosto. Tem coisas que eu gosto e que não estão no som da banda, pra felicidade dos outros caras também... (risos)

Pedrão - (risos) É , vai colocando a culpa nos outros...

Edinho - Você vai falar do Echo and The Bunnymen também...

Ronei - Pois é... (risos)

Ian McCulloch agradece (risos)
Ronei - Tem coisas que são legais. Pedrão curte rock progressivo, então tem coisa no som que está no progressivo, mas às vezes é interno. Tipo, para a gente tem, mas pra quem está ouvindo pode ter, sei lá, algo como Chitãozinho e Xororó...

Por mais surreal que isso pareça.
Ronei - Pois é. Então se torna muito difícil delimitar ou determinar: "A gente tem influência disso ou daquilo". Agora, sim, a gente gosta de Milton, Caetano, Gil, Led. Acho que o Led é a única unanimidade da banda.

Pedrão - Eu até brinquei certa vez dizendo que uma boa forma de definir (a banda) é que algo que todo mundo gosta aqui é Edu Lobo e Led Zeppelin. (risos)

Edinho - E entre um e outro, está tudo o que a gente gosta. (risos)

Esses são clássicos. E na cena atual? Já me disseram que vocês parecem com o Franz Ferdinand...
Pedrão - Já ouvi isso também.

Ronei - Eu também.

Pedrão - Inclusive, essa é uma das poucas bandas atuais que acho legal, mas não acho tãããão assim não...

Edinho - A gente não chega a comprar um disco do Franz Ferdinand não, mas...

Ronei - ...mas é engraçado. Já rolou realmente isso, mas também rola um monte de coisa que a gente não enxerga em nosso som, mas isso é que é legal. A pessoa que está ouvindo é que vê. Diz que parece com algo e a gente se assusta, mas acha legal também.

Pedrão - Depois pensa um pouco e diz: "é, até que tem a ver mesmo..." (risos)

Edinho - Na verdade, cada pessoa enxerga no som um pouco de suas próprias referências. De repente aquele cara ouve muito aquele som, ouve muito o Franz Ferdinand e então achou naquelas conexões ali do som, alguma coisa que tem a ver com o que ele gosta. Se ele gostou do som, então ele faz associação com coisas que ele gosta, entendeu? Isso é normal...

E chegando em casa, apertando o play, o que vocês ouvem?
Pedrão - Cara, rola uma suruba musical.

Ronei - É, a gente fica trocando discos.

Pedrão - Acho que uma das melhores coisas da banda é ficar trocando discos. Só que às vezes o disco não volta (risos). Bom, eu vou assumir: eu escuto basicamente jazz. Agora, assim, antes da banda eu ouvia mais rock. Hoje em dia eu ouço pouco; como tem a banda, então eu já ouço muito rock com ela.

Edinho - Hoje em dia o lance é mais pop chique.

Pedrão - Pop chique? (risos) O que é pop chique, Edinho, diga aí?

Edinho - É, tipo Steely Dan (risos)

Pedrão - Steely Dan é massa!

Quero ver uma versão de Josie...
Edinho - Exatamente!

Pedrão - É o mais perto da gente que o Edinho pode chegar. (risos)

O Steely Dan??
Edinho - Isso é ele quem está dizendo...

E a música eletrônica, Ronei? Você que fez parte do Clube do Silêncio...
(www.clubedosilencio.hpg.com.br)

Ronei - (risos) Não, eu não entendo de música eletrônica, não. Quando eu fiz o trabalho, eu o fiz da mesma forma que fazemos aqui com a Ladrões. Eu levei a música e a gente ficou discutindo o arranjo. Como foi com o Gilberto Monte, da (banda) Tara Code, e ele saca muito de música eletrônica, então foi um lance mais de experimentação. Ele ficava mexendo lá e me ligava: (imita a empolgação de Gilberto Monte) "Ronei, vem aqui ver como é que tá". E eu chegava lá e me deparava com aquela coisa estranha (risos). E eu falava: "Está ótimo!" E quando eu voltava, tinha mais coisas (risos). Foi ótimo. Um outro tipo de trabalho. Uma coletividade diferente. Foi bacana, mas eu não conheço muito de música eletrônica. Conheço por curiosidade. Portishead, Kraftwerk...

Edinho - Fatboy Slim e Chemical Brothers eu acho muito bacana. O que acho mais legal na música eletrônica é quando usa samplers de coisas tocadas mesmo. Sons de bumbo, baixo, bateria, riffs, ou seja, quando ela faz aparecer o rock. É isso que o Kraftwerk faz. Eu não curto muito o eletrônico puro. Aquela coisa house. Não é muito minha praia.

Alguma intenção de usar isso para um próximo trabalho, disco ou música, Ronei?
Edinho - Posso responder essa pergunta? NÃO! (risos)

Uma mudança brusca de estilo?
Ronei - Algo radical?

Pedrão - Não, não... Eu não acredito em revoluções. (risos)

Edinho - Profundo isso, cara. (risos)

Pedrão - (risos) Eventualmente, contradizendo tudo que eu acabei de dizer, pode aparecer alguma coisa de eletrônica, mas nada assim que chegue de uma hora pra outra.

Ronei - Mas nunca a gente chega com uma idéia pronta assim: "Hoje faremos uma canção mod, agora vamos fazer uma canção psicodélica". Isso não rola.

Edinho - Ela vira o que ela se transforma.

Pedrão (gargalhando) Você leu isso num livro??

Ronei - A gente vai se segurando um pouco: "Pô, isso não. Isso não é legal. Vamos colocar isso aqui" e é aí que surge a sonoridade.Mas não tem nada pré-estabelecido.

E o processo de composição? Por exemplo, Sete-Sete. Explica o título.
Pedrão - (risos) Essa é boa! Essa é uma boa pergunta.

Ronei - É, boa pergunta. Isso tem um pouco a ver com aquele lance do Franz Ferdinand que você falou antes. Por que eu gosto muito do Talking Heads. Aí eu fiz a batida da guitarra e falei com o Pedrão que parecia Talking Heads, e ele emendou: "Talking Heads modelo 77". Virou apelido. E ficou Sete-Sete. Mas não tem relação nenhuma.

Pedrão - A gente começou a tocar e a música não tinha título, então... "Vamos tocar aquela do 77, do Talking Heads. E o apelido virou nome". (Em tempo: Sete-Sete é a primeira música do RJLB a ganhar clipe).

Edinho - O engraçado é que a musica tem o compasso diferente. Em 3 e depois acumula pra 4. Aí as pessoas ficavam tentando achar nexo com o título...

Pra fechar: o que a Ronei Jorge e os Ladrões de Bicicleta esperam para esse final de ano?
Ronei - A gente tem um disco pronto, que gravamos no carnaval com o Luis Brasil. Já está pronto a um tempo e a gente quer lançar até o final do ano. E tem também o Festival da Claro. Queremos fazer uns shows lá em São Paulo (um já está confirmado: Centro Cultural São Paulo, dia 3/12, com a Numismata).

O disco sai antes do festival?
Ronei - A gente está decidindo. Masterizou agora e estamos na reta final. Doze músicas.
As quatro do EP A Dois e mais oito.


Links
Site Oficial Ronei Jorge e os Ladrões de Bicicleta
Download do EP A Dois, da Ronei Jorge e os Ladrões de Bicicleta, no Trama Virtual
Site do Festival Claro Que é Rock