Idlewild – The Remote Part
Por Leandro Miguel de Souza
leandro_pixies@bol.com.br

O troço aqui é poderoso.

Não leva mais do que 40 minutos.

Não parece ser nada de mais.

Mas quando menos se espera...

BANG!

Você está convertido.
 

Uma semana. Faz uma semana que escutei Idlewild pela primeira vez. Depois da primeira audição de "100 Broken Windows" (disco lançado em 2000), não sabia o que pensar. Roddy Woomble, Rod Jones, Bob Fairfoull, Colin Newton. Voz, guitarra, baixo, bateria. Letra-ponte-refrão-letra-ponte-refrão-ponte-refrão. Basta. Vibrante como poucos discos na história recente, o álbum é o resultado que se obtém quando uma banda faz certinho o tema de casa: o melhor dos anos 80 (Smiths, R.E.M.) e a sonoridade esporrenta dos anos 90 somadas à letras ferozes. Tirando essas comparações confusas, dá pra dizer que o som parece um Buzzcocks mais sujo. Punk? Pode até ser, mas é mais do que isso. "These Wooden Ideas" e "Roseability" pertencem ao panteão daquelas músicas que podem ser consideradas DO CARALHO! 

Nessa onda, corri atrás de "The Remote Part", o novo disco da banda, lançado lá fora dias atrás e que provavelmente nunca vá ver selinho nacional. Graças a um amigo, descolei uma cópia do álbum, junto com a advertência: "Não é tão bom quanto o anterior". Meio ressabiado, fui conferir o que o último álbum dos escoceses oferecia. Ao ouvir a primeira faixa, cheguei a desconsiderar o aviso. "You Held The World In Your Arms", é a canção mais Smiths que Morrissey não conseguiu gravar em sua carreira solo. Contando até com o apoio de violinos, o grupo escancara o lado oitentista, mostrando que as coisas mudaram um pouco, conforme os próprios versos de Woomble: "Everything changed since yesterday".

Em algumas faixas, as guitarras estridentes foram amenizadas para valorizar as melodias trabalhadas e as letras mais introspectivas do disco. Certas canções de "The Remote Part" trazem violões no lugar das guitarras que sempre caracterizaram o som da banda. Os fãs mais ardorosos podem reclamar que os rapazes perderam parte da sua pegada, já que "100 Broken Windows" era uma sucessão de pedradas e os primeiros discos (a EP "Captain" e "Hope Is Important") eram espetáculos de guitarreira. Mesmo parecendo um tanto que precoce, essa evolução enriqueceu o som da banda, atirando certeiramente em novas direções. O segundo single do álbum, "American English", poderia inclusive ser confundido com um Coldplay da vida, se não fosse a excelente letra e o vocal destacado de Woomble, demonstrando uma notável evolução desde o último disco, arriscando floreios inéditos para quem vivia à beira da desafinação (embora isso desse um charme extra). Outro exemplo dessa perigosa, mas bem sucedida investida é "Living In a Hiding Place", levada por um piano esperto e refrão extremamente grudento. Até a baladinha meia-boca "Tell Me Ten Words" encontra-se acima da média (seria melhor ainda se não tivesse um bandolim capenga). A melancolia bate forte na linda "I Never Wanted", com um riff de guitarra fluído e o baixo de Bob Fairfoull sustentando um loop de bateria que se encaixa perfeitamente no clima da canção. Lembra um pouco do Verve.

Para não perder a manha, os "scottsmen" largaram nesse disco alguns de seus melhores rocks. "A Modern Way of Letting Go" é 2 minutos e meio de guitarras incendiárias e vocais brilhantes (como sempre). "Out of Routine" parece um out-take de "Document" (álbum clássico do R.E.M., de 1987) incrementado com camadas densas de guitarra e uma bateria esmagadora (só para constar: isso é um puta de um elogio). "(I Am) What I Am Not" deixa a raiva de lado e mostra um sarcasmo inédito nas letras da banda: "If all this wisdom is true. Then I doubt it could really have come from you". "Stay The Same" vai num crescendo de distorção que chega às raias do inaudível (Jesus And Mary Chain?). "Century After Century" evoca os anos 80 de uma maneira diferente: unindo uma guitarreira poderosa a uma batida sintetizada, a banda propõe um cruzamento de "Bullet With Butterfly Wings", dos Smashing Pumpkins, com "This Time of Night", do New Order (seja lá o que você entender com isso). Muito bom.

É difícil dedicar um parágrafo inteiro à uma música, mas aqui vai ser fácil:
Voltando a falar de Coldplay, Travis e outras bandas que alguns críticos chamam de "coxinhas" (seja lá o que eles querem que nós entendamos com isso, hehe), fico triste em saber que alguns possam comparar as baladas que o Idlewild gravou nesse disco com as baladas das "coxinhas". Não que eu não goste dessas bandas (Tenho todos do Travis e o novo do Coldplay é muito bacana), mas o Idlewild se encontra num patamar superior. A maior prova disso é a faixa que encerra "The Remote Part": "The Remote Part/Scottish Fiction" transborda daquilo que as "coxinhas" fingem ter: simplicidade. 

Simples, mas verdadeira. Ah, e Roddy Woomble não chora: ele canta. O dedilhado certeiro de Rod Jones ampara os versos de Woomble: "So I’ll wait ‘til I find the remote part of your heart". A bateria acompanha tímida, só pra marcar. A música poderia fechar desse jeito mesmo, com dois minutos, enxuta e perfeita, mas não, eles tinham que transformá-la numa maldita OBRA-PRIMA. "And even if the breath between us smells like alcohol, calling confusion in the best way possible".

Depois dos maravilhosos versos de Woomble, a banda explode em pura energia. O dedilhado certeiro vira uma massa avassaladora de distorção. A bateria tímida vira um animal selvagem. A melodia doce continua lá, mas intensa. Muito mais intensa. Então uma voz messiânica invade a tempestade sonora e começa recitar um belíssimo poema. O poeta escocês Edwin Morgan compôs e recitou "Scottish Fiction" especialmente para a música, criando um efeito arrepiante. Fantástico.

Agora a minha opinião: "The Remote Part" não é melhor que "100 Broken Windows", mas chega muito perto. Ficam recomendados os dois. Enquanto o anterior aperfeiçoa o punk (eu falei punk?) com as melhores melodias possíveis – sem perder a pegada – "This Remote Part" é um álbum que desenha a linha entre o pop-rock de qualidade e o completamente dispensável. Perto de um proto-Hanson qualquer, o Idlewild parece um trator passando sobre uma formiga. Graças a bandas como essa, nunca iremos passar mal de rock (seja lá o que você entender com isso). É triste saber que discos como este nunca chegarão ao público nacional (não foi lançado nem nos EUA). Injustiça cruel. Mais uma vez estamos privados de um dos melhores discos do ano, sem sombra de dúvida. Sei que eu serei um dos únicos a colocá-lo na lista, mas isso não importa. É a minha lista. E pra mim, isso é o que importa. 
Egocentrismos à parte, dê uma chance ao Idlewild. E prepare-se para a conversão.

Leandro Miguel de Souza, 18 anos, estudante de jornalismo, está ciente da dificuldade para comprar discos importados, mas afirma que este aqui vale cada centavo. Não tem dinheiro? Tudo bem, dá pra entender, tá muito caro... mas ei, pega na internet! Não tem internet? Tudo bem, eu entendo...
...mas peraí! Como é que você tá lendo o texto?