Lobão ao vivo em Taubaté
por Leonardo Vinhas
leonardo.vinhas@bol.com.br

E então? Como foi? Legal? Que bom!

22 horas de 18 de outubro de 2001. Chove lá fora e aqui (Sesc Taubaté) faz tanto frio... É, Lobão está de volta à cidade. Sua última apresentação fora em 1995, naquela turnê "banquinho-e-violão" que acompanhou o álbum Nostalgia da Modernidade. O que o senhor João Luis Woerdenbag tem feito desde então você sabe: disco eletrônico (Noite), fracasso; disco de trip-hop nas bancas (A Vida É Doce), sucesso. Prestes a lançar um disco ao vivo, o artista passa pelo Vale do Paraíba na sua rotina de cinco shows por semana. O que esperar?

Não o que aconteceu. O Lobo Mau, que há anos diz que não faz rock, fez um bom show de... rock. Sim, acompanhado apenas de baixo e bateria e com o volume da guitarra nas alturas, o homem combinou sucessos, músicas quase esquecidas e boas canções do "disco das bancas" em arranjos mais pesados e intensos, às vezes até bastante diferentes (como em "Decadence avec Élegance").

No geral, peso e intensidade nortearam todas as canções, a não ser na delicadeza ímpar de "Noite e Dia", sempre desnorteante (ainda que a versão da Gang 90 & Absurdettes seja insuperável). Mesmo faixas harmonicamente sutis como "Universo Paralelo" soavam agressivas e canções naturalmente pesadas como "Tão Menina" e "A Vida É Doce" ganharam um peso inaudito em estúdio. E, se os competentes músicos não se mexiam muito, Lobão esbanjava caras e bocas, arrebentava cordas da guitarra, fazia poses de guitar hero, conversava com o público, "batia  cabeça"... tão roqueiro como alguém que se diz "não-rock" pode ser.

Com 1h10min de duração, Lobão encerrava o show com "Rádio Blá" (apresentada como "a música do corno pós-moderno" e com letra mudada para se adequar às vagabundas de hoje em dia). O público, surpreso com a fúria da apresentação e com sua curta duração urrava pelo bis. Que veio com "Sob o Sol de Parador", tocada com um pique que fez com que sua letra adolescente adquirisse algum sentido. Momento "Tim Maia": Lobão aproveitou os "questionamentos" da letra para "alfinetar" os responsáveis pelo som (que, se não estava 100%, também não estava ruim): "quem é o filho da puta que tá cuidando do som? Tá dando o cu". Muito rocker, velhinho...

Após "Vida Bandida" e "Corações Psicodélicos" (essa ficou engraçada com distorção), a apresentação acaba de verdade. Na entrevista que fiz para o jornal Alternative Voices, Lobão reclamou do pessoal dos anos 80 (se declarou pertencente aos "anos 70"), afirmou 35 vezes que "não faz rock", se bravateou, xingou Caetano Veloso, puxou o saco do Caetano Veloso, se bravateou, reclamou da bunda music, se bravateou, reclamou da burrice do público, se bravateou, meteu o pau em todas as edições do Rock in Rio e se bravateou. E acima de tudo, não admitiu nenhuma pergunta que expusse suas contradições. Ao ser perguntado por um colega que dividia a entrevista comigo se seus protestos contra as gravadoras não funcionavam como marketing pessoal, o lobo rugiu e nos chamou de imorais, se recusando a responder a pergunta.

Esse é Lobão. Como "ideólogo", suas idéias têm a consistência de uma gelatina. Como músico (ou "artista", como ele prefere), à exceção de coisas inomináveis como "Presidente Mauricinho" ou "Dé dé dé dedéu", costuma fazer boas canções e excelentes shows - como o dessa noite em questão. Curiosamente, canções e shows que lembram muito uma coisa chamada rock... 

Leonardo Vinhas é professor de inglês, relações públicas e colaborador do jornal Alternative Voices.



Set list

Universo Paralelo
Tão Menina
Canos Silenciosos
Decadence avec Élegance
Noite e Dia
Me Chama
El Desdichado II
Sozinha Minha
A Vida é Doce
Vida Louca Vida
Blá, Blá, Blá... Eu te Amo (Rádio Blá)

Bis
Panamericana (Sob o Sol de Parador)
Vida Bandida
Corações Psicodélicos