"Deus" esteve aqui
Jon Spencer Blues Explosion
Sesc Pompéia 28/04/01
por Marco Bezzi
fotos Ana Antoniolli

Sábadão perfeito: véspera de feriado, ruas vazias, céu de brigadeiro, noite anterior com um baita show do Asian Dub Foundation. Dá pra pedir mais? Deixa ver... duas apresentações do Jon Spencer Blues Explosion e, por que não com um intervalo de 3 horas de diferença entre as duas? Mas isso é parada pra rolar em Nova York ou Londres. 

Não!!!!! Isso aconteceu em São Paulo mesmo na sua versão reduzida do Abril Pro-Rock. Puta merda!!!! Com ingresso pro show das nove só uma coisa me remoía a cuca: e se o cara se esgoelar no show extra das sete e não tiver mais força pra segunda e derradeira apresentação? Bom, pensei, ia ser uma puta sacanagem pra galera que se matou em comprar os ingressos do antes único concerto. O cara não ia fazer isso, mas... Sete e dez e Jon e sua trupe adentram o palco do Sesc Pompéia com metade do povo ainda fora. 

Eu, gripado e febril, tinha tomado um coquetel de remédios e ainda não acreditava que ia ficar de cara com Jon Spencer, Judah Bauer e Russell Simins a menos de 2 metros de distância. As guitarras falavam alto, a bateria parecia pedir trégua tamanha a força que era atacada e a voz.... é, essa tava baixinha. Talvez pro povo que ficou sentado (como?), o som do P.A. amplificasse mais os gritos de Jon, o que de maneira nenhuma tirou o vigor que foi a apresentação desses mestres do barulho. A imagem de Mr. Spencer caido no meio do palco, jeitão psicótico e se esgoelando, parecendo pedir clemência por todos seus pecados, foi uma dessas cenas que não devem sair da cabeça de ninguém que testemunhou aquele momento. Virou Jesus Christ Blues Explosion, vestindo uma calça de couro, camisa azul, mais parecendo uma mistura de Elvis com Charles Manson. Com seus pulos, gritos, interjeições, Jon é o rock n’roll. 

E o que foram os shows? Do primeiro eu não lembro muita coisa, tal a miscelânea passada na minha cabeça quando ouvi os primeiros acordes de Get Down Lover. Deu pra sacar que os caras tocaram muitas músicas novas e que talvez pela galera mais fria, tenham se poupado um pouco (entenda o se poupar dos caras: se jogar no chão, subir nos amps e tudo mais). Uma das coisas mais impressionantes foram os timbres de guitarra: Judah, com um jeitão mais cool impossível rasgava os agudos de sua Tele com ajuda de um Vox e um Fender Twin Reverb de dar inveja. Jon com uma guitarra e amp bem estranhos fazia os graves soarem mais graves ainda. 

Depois de uma hora e dez mais ou menos a banda deu o seu primeiro adeus depois de um bis sublime que contou com a swingada Magical Colors  do bonzaço Acme. Descanso pro segundo ato, regado de cerveja, um pouco de Wander Wildner e mais comprimidos. Todos apostos pro show que deve ter se iniciado lá pelas onze e meia. Galera mais do rock, mais agitada como era de se esperar. E parece que Jon brindou o público com um dos shows da vida de quem esteve lá - apesar do próprio ter me confessado que gostou muito do primeiro. Aí foi covardia. Afro (do insuperável Extra Width), Flavor, Full Grown, Wail e a maravilhosa Bellbottoms do CD de 94 Orange. Inacreditável!!! Jon, percebendo a gana maior da galera parecia interagir mais, pedindo os gritos dos 750 hipnotizados presentes.  Russel nas duas últimas músicas estava mortão, mas continuava cumprindo seu papel e Judah subia na batera para delírio das meninas. 

Final do show, Russell Simins estava de cara fechada, não sei se tinha tomado alguma coisa, mas o mais provável era que o cara tava acabado mesmo. Quando a gente volta pro hotel?, indagou para a tour manager. Judah era o mais receptivo da banda e o mais assediado pelos  poucos que permaneceram lá. Acho que vou sair pra algum lugar depois daqui. Tem alguma sugestão?, perguntava. 

Jon sai com cara de esgotado (tem um boato que ele se separou da maravilhosa Cristina Martinez, e quem sabe quem é a moça deve dar todas as razões pro cara estar assim) e vou perguntar quais tinham sido as impressões dos show? Em Maringá tivemos o melhor público da turnê. É muito difícil achar um lugar nos Estados Unidos com uma galera tão receptiva. Um fã pede licença pra uma foto. Aqui em São Paulo o único problema foi o lugar que é uma merda, tocar pra parede é foda, mas apesar da galera parecer as vezes não entender esse jeito meio solto da gente, respondeu super bem ao show

Falo que as músicas novas são do caralho e pergunto quando vamos ser brindados com o próximo JSBX? Cara, a gravadora nos pede toda hora pra esse próximo álbum ser lançado, mas queremos fazer a coisa no nosso ritmo e não temos ainda uma previsão disso

Antes de voltar pra Nova York, Jon passou na Hi-Fi do Shopping Iguatemi (acredite se quiser) e levou um álbum do Mutantes (Tecnicolor) e mais dois que meu amigo que trabalha lá não lembra. É isso. Fim de semana inesquecível em que “Deus” deu uma passadinha aqui e conseguiu transformar a cabeça de muita gente.