Paraiso
na Fumaça - Chris Simunek
por
Carlos Eduardo Moura
kello@terra.com.br
Chris Simunek trabalha numa revista
maconheira chamada "High Times", uma das principais revistas alternativas
norte-americanas, famosa por seu discurso pró-legalização
da maconha. Na revista, Chris é "editor de cultivo", ou seja, é
o responsável por viajar pelos EUA analisando plantações
de erva. Não só analisando, vai experimentando e descrevendo
as sensações de todo o tipo de alucinógeno (não
só maconha, mas ácido, ecstasy, anfetamina, cogumelo etc.).
O livro "Paraíso da Fumaça - Viagens de um jornalista da
High Times", lançado no Brasil pela Editora Conrad, é uma
espécie de diário, no qual o jornalista vai narrando todas
as suas melhores "investigações jornalísticas" já
publicadas na revista. Na realidade, as histórias são verdadeiras
egotrips de um Chris sempre muito chapado.
Antes de trabalhar na "High Times",
Chris Simunek era um professor de ensino médio que, de saco-cheio
do seu trabalho, resolveu largar tudo e acabou conseguindo emprego na revista.
Em seu texto, Chris pratica o "jornalismo maconheiro", uma mistura do "new
journalism" de Tom Wolfe e companhia e o jornalismo "gonzo" de Hunter
Thompson.
Com seu jornalismo-viagem, vai mostrando
ao leitor diversos modos e experiências de vida, desde rastafaris
em Trench Town na Jamaica, motoqueiros amantes de Harley Davidson, fazendeiros
do interior dos EUA, metaleiros em crise, hippies, astros – falidos - do
rock (uma impersível conversa com Lemmy do Motörhead
sobre metal e rock, além de falar da volta dos Sex Pistols nos anos
90), jovens descerebrados em Cancún e por aí vai... Chris
é um excelente contador de histórias, mais do que apenas
ir narrando o que acontece, a perfeição de sua escrita nos
transporta para dentro do que se passa na sua cabeça.
Tudo isso com seu espírito
auto-depreciativo (gozador) e loser de encarar o mundo. Seja em touradas
espanholas, seja em reuniões dos Maconheiros Anônimos e da
Rainbow Family, Simunek sente-se um estranho no ninho, um cara que esperava
na sua juventude "sexo, drogas e rock and roll", mas acabou encontrando
"Aids, Guerra Contra as Drogas e a MTV". Além disso, ele se sente
mal por ser um usuário de drogas num país tão conservador
como os EUA (é por isso que as histórias da Jamaica são
as melhores do livro). Talvez venha daí a sua visão loser,
e a sua pitada de arrogância não-assumida.
"Depois de quatro anos procurando
respostas, no entanto, estou mais confuso do que antes. A linha de frente
dessa guerra é invisível. O inimigo não usa mais casaca
vermelha e os mutantes não se destacam na multidão. Até
os garotinhos caretas de Kent usam camisetas de Marilyn Manson", diz, na
introdução do livro. "Ainda não sei se achei o que
procurava. Em certos momentos, encontrei o que precisava, e isso é
o máximo que se pode esperar duma revista", diz mais pra frente.
Mas quem precisa de respostas?
S&Y
- Como surgiu a idéia de fazer o "Paraíso na Fumaça"?
Chris Simunek - Eu estava tentando
vender a um editor da St. Martin's (editora de livros) um romance meu,
mas ele não quis. Quando eu tive a atenção dele novamente,
eu pensei em entregar um livro sobre minhas experiências com drogas,
e ele acabou comprando.
Quanto tempo
você demorou para escrever o livro?
Simunek - O livro é baseado
em quatro anos de artigos. E isso levou mais ou menos mais um ano para
ficar do jeito que está agora.
Que tipo
de jornalismo você faz?
Simunek - Na maior parte do meu trabalho,
eu não me considero muito um jornalista. Daniel Pearl foi um jornalista,
eu sou apenas um idiota com muitas contas a prestar. E isso leva a muitas
situações engraçadas, e eu escrevo sobre isso. Então,
eu não sei como você pode chamar isso, talvez jornalismo literário?
Algumas pessoas chamam isso de "gonzo", mas, na verdade, essa viagem foi
somente Hunter Thompson quem fez e ninguém mais.
Você
está escrevendo alguma coisa nova? Sobre o que é?
Simunek - Sim, eu terminei "No Easter",
mas não foi publicado. O livro segue o caminho de Gene Gumellis,
um porteiro de 22 anos que é em parte do tempo um filósofo,
no despertar de uma catástrofe global sem precedentes, onde há
uma repentina aparição de um monstro tipo o Godzilla. Desconsiderando
certos fantásticos desenvolvimentos, esse livro é a vida
real com problemas reais. Descreve uma imagem sobrecarregada da geração
jovem que precisa de estímulo para mudar tão freqüentemente
como piscam os olhos. Nada como um cataclismo para poder trazê-los
a um plano espiritual mais alto. A ironia aqui é que esse livro
é uma procura pela redenção espiritual e de muita
coisa que os está destruindo (os jovens). Algo do tipo...
Em "Paraíso
na Fumaça", você parece ser um cara um pouco niilista, uma
espécie de "loser". Você se considera um "loser"?
Simunek - Uh... Essa foi a questão
mais
engraçada que eu já respondi. Você tem que entender
a tradução. "Loser" é um termo muito negativo, um
insulto, haha. É a mesma coisa que você me perguntar: "você
é um babaca?" Mas eu acho que entendi o que você quis dizer.
Não! Eu não sou um "loser"! Quanto ao niilismo, eu não
acho que isso se aplica a mim. Eu tenho grandes esperanças que dificilmente
serão alcançadas. Às vezes elas são, e eu acho
que você encontrou isso em certos momentos do livro, como com os
rastafaris ou com os motociclistas.
O que você
pensa sobre ser um drogado nos EUA, que é um país muito conservador?
Simunek - Os EUA têm uma atitude
prejudicial e freqüentemente hipócrita a respeito das drogas.
Os políticos aceitam milhões e milhões de dólares
das companhias de tabaco, mas não deixam as pessoas fumarem maconha,
que não faz mal. Eles estão realmente preocupados em relação
à saúde pública? Ou há outra coisa por trás
disso? A Guerra contra as Drogas (muito mais que a Guerra contra o Terror)
basicamente deu aos EUA uma desculpa para invadir outras nações,
para violar a privacidade das pessoas de acordo com a vontade deles. Os
EUA não querem ganhar a Guerra contras as Drogas, porque se as drogas
forem repentinamente erradicadas, a polícia vai perder sua força.
Então
você acha que a maconha deve ser descriminada?
Simunek - Sim!
Como você
vê a cultura alternativa hoje? Está morrendo?
Simunek - Parece morta, eu tenho
medo. Basicamente, se você não pode comprar na Wal-Mart (uma
grande loja nos EUA), ela não existe. Há a arte "alternativa"
– música, pintura, filmes, etc. – mas eu não sei se há
uma "cultura" (que é uma palavra muito importante) alternativa,
pelo menos não nenhuma que me interesse direito agora.
TRECHO
"Na reunião de editores, argumentei
que, com o novo milênio, outras revistas estariam fazendo suas listas
de personalidades pro século XXI. Então por que a High Times
não lançava um olhar realista sobre o futuro e escrevia sobre
os moleques? Se você quer um retrato detalhado da próxima
geração, tem que observar a maioria, ou seja, aqueles que
no futuro vão cancelar o teu plano de saúde ou te recusar
um empréstimo bancário. Se existe uma coisa que os anos 60
deveriam ter nos ensinado é que, enquanto os porta-vozes duma geração
estão ocupados em sair bem na foto, as formigas fazem a história.
O feriadão de primavera é
como o Muro das Lamentações das formigas. É uma viagem
que os estudantes fazem pra provar um último gosto de liberdade
antes de virarem a graxa que lubrifica a grande máquina americana
que vai atropelando as vidas das outras pessoas. Parecia uma boa idéia,
pelo menos até a aterrissagem do avião e o nosso embarque
no ônibus de turismo da School Spirit Inc. que nos levaria até
o hotel.”
De “Gringo Que Nem Eu: Feriadão
de Primavera em Cancun”
"Paraíso na Fumaça
- Viagens de um jornalista da High Times"
Autor: Chris Simunek, Ed. Conrad,
194 páginas, R$ 33,00. |