Houve Uma Vez Dois Verões

por Angélica Bito

Houve Uma Vez Dois Verões (2002), filme de Jorge Furtado, totalmente gaúcho, é um elogio à adolescência, aquela época cheia de dúvidas, questionamentos, descobrimentos e decepções que passa e sempre deixa saudade.

O filme foi feito de forma quase independente, com câmeras digitais e atores desconhecidos, mas que já tinham alguma experiência com teatro. Sem pretensões, sua força está no roteiro bem amarrado e descontraído, tão descontraído como os atores. O elenco é encabeçado por Ana Maria Manieri e André Arteche, Roza e Chico, casal-fofinho do filme.

Eles se conhecem em uma praia gaúcha em um desses verões inesquecíveis que toda história de vida tem. Depois de uma noite de amor sob as estrelas (clichê, mas fofo!), ela some de vista. Chico, então, resolve procurá-la naquele verão, mas nada da guria. De volta a Porto Alegre, ela mesma acaba achando Chico, mas com uma notícia desagradável: está grávida e precisa do dinheiro para abortar. É aí que eles saem dessa vidinha adolescente e caem na real sobre as obrigações e responsabilidades de uma vida adulta. O coitado faz de tudo para arranjar a grana, mas não deixa de pensar nela. E o filme é assim, cheio de passagens, mostrando a ambiguidade que é ser adolescente.

André Arteche, o Chico, empresta suas feições frágeis ao romântico personagem, que sai à caça de sua não tão romântica Roza, seu objeto do desejo. Ana Maria Manieri/ Roza, por outro lado, não é nada frágil, muito pelo contrário. Esse equilíbrio da relação - caça/ caçador, frágil/ forte - é temperado pelo bom humor de Juca, vivido pelo filho do diretor, Pedro Furtado. Juca é o melhor amigo de Chico e o protagonista das cenas mais engraçadas.

Não há como negar que Houve Uma Vez Dois Verões é um filme adolescente, feito por e para jovens. Tudo isso dado à temática e também ao cuidado com a trilha sonora. Mas, quem disse que isso diminui um filme? Muito pelo contrário, e é exatamente esse o mérito e o atrativo desse filme, carregado no sotaque gaúcho, assim como as músicas que embalam o longa. No set list, a nata do pop gaúcho: Wander Wildner faz uma versão meio bêbada de Without You, clįssico do Badfinger; Ultramen contagia em uma das melhores cenas do filme com a não menos contagiante My Pledge Of Love; Cássia Eller e Pato Fu representam o rock "não regional", e muito bem.

De jovens e sobre eles, mas não somente para espectadores com menos de vinte anos. Houve Uma Vez Dois Verões é daqueles filmes aos quais se assiste sorrindo, nos fazendo lembrar o que passou, ou mesmo o que pode vir, no caso dos mais novos. São situações comuns e sinceras, partes do universo de qualquer adolescente. Isso faz com que esta seja uma produção, antes de mais nada, realista. Sem deixar de ser romântico, engraçado e, o mais importante, cativante. Afinal, de que vale um filme se não há o mínimo de identificação entre o espectador e aquilo que se passa na telona? Qualquer semelhança com a vida real não é mera coincidência; é sinal de bom filme pela frente.