Moulin Rouge
por Marcelo Costa
24/05/2001

"Por que as pessoas romanticamente mais infelizes são aquelas que gostam de música pop?".  A frase de Nick Hornby (aqui adaptada, meu livro está encaixotado em algum lugar por ai), chave do romance/filme/peça Alta Fidelidade, poderia estar encaixada em alguma cena perdida de Moulin Rouge, novo filme de Baz Luhrmann com o casal Ewan McGregor e Nicole Kidman esbanjando carisma na tela e pulando do tolo ao sublime como se cavalgassem estrelas. Incomoda, às vezes, mas o resultado final é ok.

Baz Luhrmann você conhece. Ele é o cara responsável pela adaptação versão videoclipe de Romeu e Julieta com Di Caprio e Claire Daines. Assim como fez com a obra do bardo inglês, Baz pesa a mão nos excessos em Moulin Rouge e acaba, por vezes, enjoando visão e audição. Isso tudo sem contar que estamos diante de um... musical, um pastiche musical.

Não sei de vocês, mas descobri que não gosto de musicais. Alias, não gosto desses musicais estilizados (os antigos com Ginger Baker e Fred Astaire eu adoro). Descobri quando uma garota me disse "assista Hair e se apaixone". Eu assisti. Me apaixonei pela garota, não pelo filme. O segundo golpe (Woody Allen em Todos Dizem Eu Te Amo não conta) veio com Dançando no Escuro, que eu detestei (e eu esperava muito desse filme). O golpe de misericórdia vem agora com Moulin Rouge (sem contar que The Wall e Tommy são só legaisinhos, vai). Uma das chaves para se ler essa resenha está exposta: se você gostou de algum desses filmes acima, possivelmente você goste de Moulin Rouge. Possivelmente...

O que me fez interessar e até me divertir em Moulin Rouge foi que, para construir sua ópera pop, Baz juntou em uma centrifuga: Nirvana (Smells Like A Teen Spirit), U2 (Pride), Beatles (All You Need Is Love), David Bowie (Diamond Dogs, Heroes), Police (Roxanne) Madonna (Like a Virgin) e mais um "livro" de citações (eu lembro de Fatboy Slim, Beck, Queen e Christina Aguilera - os nomes são muitos). O roteiro parece montado com música pop sobre música pop. Por mais estranho que possa parecer, as citações orquestradas funcionam a perfeição. Há, até, resquícios de Monty Python na atmosfera de Moulin Rouge.

Os primeiros vinte minutos do filme não fariam feio no "Piores clips do Mundo" da MTv. A câmera de Baz não para quieta, sobrevoa a cidade, busca as cores quentes e preenche a tela com zooms. O resultado frenético incomoda, mas não será isso que Baz Luhrmann estava procurando?

Moulin Rouge acaba mostrando o mundo pós-moderno do diretor, ancorado em cultura pop do mesmo jeito que Nick Hornby o faz em seus livros. O senão é que o inglês soa sincero enquanto o australiano soa exagerado. Moulin Rouge é colorido demais. A história acontece na virada de 1899 para 1900. O centro boêmio do mundo é Paris. Moulin Rouge é a atração principal da cidade que é a capital boêmia do mundo, e é um bordel de alta categoria. É pra lá que um jovem e ingênuo escritor (Christian – Ewan McGregor), que acredita no amor (sem nunca ter amado), parte ao encontro de seu destino.

A tragicidade veste sua roupa e ele se apaixona por uma prostituta (Satine – Nicole Kidman). A peça que o destino irá pregar nos dois é a reciprocidade desse amor. É um jogo bastante simples. O escritor deseja a prostituta. A prostituta se apaixona pelo escritor, mas já está prometida para um marajá, ou melhor, um duque. A impossibilidade desse amor acaba inspirando o escritor que escreve uma peça, Spetacular, Spetacular. Uma peça, bancada pelo marajá, perdoe-me, duque, que conta à história de uma cortesã que invade o coração de dois homens, um pobre e um rico. A grande pergunta: amor ou diamantes? Alguém quer uma dose de cinismo? Só os mortos não disfarçam.

A história segue com Ewan e Nicole cantando bem, muito bem. Mcgregor deixa seu coração sangrar em Your Song (de Elton John) enquanto Kidman inspira suspiros em Sparkling Diamonds. Shakespeare diria que o amor faz tolo todos os mortais o que me faz imaginar, por analogia, que todas as canções de amor são tolas. O problema é dizer isso prum mundo de pessoas que cresceu ouvindo canções de amor...

Moulin Rouge, o puteiro, existiu. Era freqüentado por grandes escritores e artistas da época. Satine, dizem, também existiu. Se era tão bonita quanto Nicole...

O fim? Bem, nunca se apaixone, afinal, só os mortos podem amar para sempre. Mas, lá no cantinho da memória, Vinicius me lembra: que seja infinito enquanto dure. Ou como os Beatles cantaram na última canção do último disco deles: e no final, o amor que você leva é o mesmo amor que você faz. Amém.