De Olhos Bem Fechados

Por Marcelo Costa
Novembro de 1999

Como falar de relacionamentos sem ser redundante? Difícil. Quase tudo foi lido, escrito, encenado. Talvez o que diferencie uma obra de outra seja a personalidade de seus criadores. Atores? Bem, Marlon Brando já disse que atores são impostores, representam um papel, uma dor que não sentem, um tiro que não lhes atravessa a carne. Diretores? Sim, são eles. Mas hoje são poucos os capazes de imprimir uma característica própria a uma obra, fazendo assim com que ela se diferencie das demais.

Eyes Wild Shut (De Olhos Bem Fechados) foi dirigido por Stanley Kubrick, um cineasta genial, autor de obras a frente de seu tempo e que hoje servem como referência não só ao cinema mas também a diversas outras áreas. Uma característica básica do cinema de Kubrick é que seus filmes nunca foram fáceis de assistir, entender. Não são filmes para serem vistos a toda hora, mas todos necessitam de, no mínimo, uma segunda vez. Kubrick morreu no dia em que os executivos recebiam a cópia original de Eyes Wild Shut. Dizem que costumava mexer muito no filme até que por fim, os mesmos chegassem ao grande público. Nesse não teve tempo e talvez por isso falte ao filme um acabamento perfeito.

O tema desse filme: relacionamentos! Como Kubrick consegue fugir da redundância? Bem, ele consegue fugir imprimindo a obra todas as características que faziam dele um gênio das telas. O roteiro é pra lá de previsível mas toda essa previsibilidade vai por água abaixo quando Kubrick nos decidi afastar da realidade. O filme angustia. Um piano minimalista percorre o sangue nos deixando incomodados na poltrona. São estranhos os prazeres que o cinema nos proporciona.

É tudo sonho ou será tudo real? Ou então imaginação? Imagine-se então no lugar de Bill (Tom Cruise) ouvindo os relatos de Alice (Nicole Kidman). Difícil? Não. E é propriamente nessa hora que Kubrick consegue uma das tomadas mais belas do rosto de Nicole, tornando o sonho, real. Transformando um sonho do passado em um pesadelo do presente. Ruas vazias. Escuras. O que você faria? Quais são os enigmas do amor que fazem de uma pessoa qualquer um ser importante, a ponto de fazer com que um belo casamento fique a beira do desastre? Presente de natal.

Não existem respostas. Apenas dúvidas. E o filme segue, lento, perturbador, belo. Dispense as pipocas e fique de olhos bem abertos, bem abertos.