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Individualidades em discussão

O Roda Viva especial Mídia Ninja e o depoimento da cineasta Beatriz Seigner colocaram o coletivo Fora do Eixo sob holofote, para o bem e para o mal. No meio de tanta informação surgida recentemente de ambos os lados (enormes relatos pró e contra que merecem serem lidos na integra – há links no final), surge a necessidade de fazer alguns questionamentos buscando entender não só o motivo de tanta discórdia, mas a própria natureza do viver em sociedade.

Partindo deste ponto, os relatos emocionados de participantes do Fora do Eixo não podem ser minimizados nem desvalorizados. Liberdade é escolher o modo que se quer viver, e neste quesito não há certo ou errado, mas sim diversas opções que vão agradar cada pessoa de forma diferente. É preciso respeitar as individualidades e escolhas de cada um, pois cada pessoa pode fazer da vida dela o que bem entender.

A maneira com que pessoas ligadas ao Fora do Eixo escolheram para viver tem que ser respeitada. É uma escolha, e em uma sociedade em que grande parte das pessoas vive em uma zona de conforto que diz mais sobre a incapacidade de alguns de se desprender daquilo que os oprime do que uma escolha consciente da melhor forma de viver, isso é admirável. Cada um tem o direito de fazer o que quiser desde que não interfira no direito do próximo.

A questão toma outro rumo exatamente quando observada como um todo, no exato momento em que interesses se chocam. Cada um pode viver da forma que quiser, mas obrigar outro a agir segundo seu modo de vida é, no mínimo, desrespeitoso. Se a economia solidária funciona dentro do coletivo, perfeito. Isso não quer dizer que pessoas de fora do coletivo precisem trabalhar da mesma forma, caso o coletivo se interesse pelo trabalho delas.

A grande discórdia em relação ao modus operandi do Fora do Eixo (e, principalmente a atuação controversa de seu líder, Pablo Capilé) é exatamente não entender e respeitar individualidades. Esse fato pode surgir de um processo nublado de realizar parcerias, algo que não deixa claro o formato de negócio para a pessoa que está pensando em trabalhar com o coletivo, e pode ser derivado tanto de uma má-gestão de projeto quanto de má-fé, que pode juridicamente ser encaixado no artigo Falsidade Ideológica.

O artigo 299 do Código Penal Brasileiro diz o seguinte e é bastante claro: “Omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia constar, ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, com o fim de prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante.”. Em seu depoimento, Beatriz Seigner afirma que o coletivo recebeu dinheiro em seu nome, sem informa-la previamente do fato. Se provado (não desconfiando da cineasta, mas o benefício da dúvida é necessário numa discussão como essa), pode mostrar que a maneira como o Fora do Eixo vem trabalhando não é transparente.

Essa decantada não transparência serve a que? Essa é uma das várias questões direcionadas ao coletivo, que, sim, precisa se manifestar, porque é um órgão não governamental que se utiliza de editais públicos para sobreviver, e independente se o valor final arrecadado é de 7% ou de 90% do montante que faz a roda do Fora do Eixo girar, é dinheiro de contribuinte, e assim como se cobra políticos, o Fora do Eixo tem um dever frente à sociedade.

É o caso de demonizar o Fora do Eixo? Não. O que está sendo feito é uma cobrança de posição do coletivo, transparência e o respeito à individualidade. Há pessoas que não querem viver como os membros do Fora do Eixo, e elas tem direito de fazer essa escolha. Há pessoas que não querem receber em moeda solidária, e é uma opção delas. Se o Fora do Eixo quiser organizar um festival sem pagar cachê, e alguém quiser tocar, é opção do músico, ainda que necessário, se o festival foi contemplado por edital, um acerto de contas da organização. Tocar de graça (mesmo com o coletivo recebendo financiamento público para isso) é um lado do mesmo jeito que se recusar a tocar de graça é outro, e ambos precisam ser respeitados.

O que está vindo à tona agora são fatos sabidos e discutidos aqui e ali (em mesas de bar e bastidores de festivais) desde 2008 (a discussão gerada pela Carta Aberta de João Parayba, publicada em 2010 no Scream & Yell, traz muitos pontos em comum com diversos depoimentos que estão pipocando aqui e ali), e a novidade é que o Fora do Eixo cresceu (não se pode negar a influência do coletivo nos importantes protestos de junho/julho tal qual o valor, ainda que partidário, da Mídia Ninja), e como adulto, precisa se ater a direitos e responsabilidades.

Isso apaga os possíveis erros do passado (recente) juvenil do coletivo? Não, e a Justiça está ai para quem quiser aciona-la. O que está sendo proposto aqui é que o Fora do Eixo haja, a partir de agora, com transparência e respeito à individualidade de cada um. O ponto de partida para isso é esclarecer todas as dúvidas que incomodam os detratores tanto quanto aprofundar os temas elogiosos que encantam os admiradores. Transparência (que nunca houve) acima de tudo.

Abaixo, alguns links importantes para se entender (e estender) a discussão, alguns bastante reflexivos, mas com itens importantes que pontuam essa longa discussão, que não é apenas sobre o coletivo, mas sobre o Brasil no século XXI, um país que passou muito tempo sucateado por administradores interessados em bens próprios, e que parece, agora, interessado no social. Questionar é preciso. Seja a respeito do Mensalão, do Trensalão, da importância da Mídia Ninja em contraponto a velha mídia (ambas partidários, defendendo interesses comuns de lados opostos), do Fora do Eixo, do Estado Laico, sobretudo do direito de cada pessoa ser… livre.

Leia também:
– Passa Palavra: A esquerda fora do eixo
– Beatriz Seigner: Fora do Fora do Eixo
– Rafael Vilela: Dentro do Fora do Eixo
– CMI: Coletivo-empresa: bote pra correr!

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