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EUA 2013: Feliz em Memphis

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Chegamos a Memphis na segunda-feira, e a cidade pareceu logo de cara mais real. Na verdade, Lili matou a charada logo assim que começamos a caminhar pelas ruas de Nashville: “Ela parece uma cidade cenográfica”. E parece mesmo. As coisas devem funcionar em Nashville como na Galeria do Rock, como diz um amigo: você entra normal pela Rua 24 de Maio e sai na Avenida São João roqueiro com piercing, tatuagem, All Star, jaqueta de couro, calça surrada e o escambau. Em Nashville, basta entrar em algumas lojas da Broadway para se transformar em um autêntico fã de country. Em Memphis, no entanto, a coisa parece diferente.

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Para começar, blues e rock são muito mais interessantes que o country de boutique que é praticado por gente que ser o novo Garth Brooks ou a nova Taylor Swift. Mas, além disso, o clima na cidade que viu Martin Luther King Jr. ser assassinado é, inevitavelmente, pesado (e assistir ao episódio de Mad Men desta semana antes de ir ao Museu dos Direitos Civis não poderia ter sido mais perfeito para nos colocar no clima). Além, Lili acha uma tremenda injustiça ver o povo que criou tudo que conhecemos em termos de r&b e rock and roll tocar por uns trocados na Beale Street enquanto os plagiadores estão por ai garfando milhões.

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No entanto, essa é América. Ok, estou olhando o lado do copo meio vazio, eu sei, mas estou gostando tanto das pessoas nesta viagem que é complicado aceitar a forma com que o país mais rico do mundo trata seus filhos com base em uma igualdade que não funciona. Primeira emenda? Sei. A crise que atinge Donald Trump não é a mesma que atinge uma pessoa de classe média baixa. Muito menos as oportunidades. Porém, como disse uma senhora num ponto de ônibus assim que falamos que o Brasil era um país ótimo, mas cheio de problemas: “A América também tem muitos problemas”.

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Sentir a América viva em Memphis já me fez admirar a cidade, que também tem seus momentos de cidade fantasma. Você já ouviu isso 10 mil vezes, e agora irá ouvir mais uma: sem carro, a vida por aqui é bem mais complicada. Os quatro pneus são uma extensão do ser-humano por estes lados, e basta alguns dias para perceber porque o Oriente Médio é o tendão de Aquiles dos presidentes norte-americanos: se faltar ouro negro esse país para. E são só as pessoas mais comuns, os homeless e turistas, como eu, que tem tanta vontade de tirar carteira de motorista quanto de tirar um dente, que andam de transporte público.

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Memphis tem Bondinhos que fazem o trajeto central, e uma linha que se estende até um pouco além da Rodovia, mas esta longe da periferia. Pra lá e pra Graceland, se você não tiver carro, ou alugar um, só ônibus ou morrer uma grana com taxi. Optamos em encarar o busão num trajeto de meia hora, e fomos os únicos dois turistas daquele ônibus lotado a descer na mansão que foi de Elvis Aaron Presley – e olha que o complexo, hoje museu e um pequeno shopping de bugigangas relacionadas ao mito, estava completamente lotado por vovôs e vovós que deviam ter 15 anos quando Elvis cravou “Heartbreak Hotel” nas paradas.

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Graceland, a residência oficial de Elvis em Memphis, é bem menor do que a expectativa supõe. E tão brega quanto você pode imaginar (no estilo “dê um monte de dinheiro para uma pessoa, e observe o mau-gosto tomando forma”). Ok, não é tãooo assim, só um pouco. A mansão tem espelhos para todo canto fortalecendo a ideia de que ídolos precisam constantemente se olhar no espelho para reafirmar poder (Freud deve explicar), algumas salas com cortinas no teto, objetos africanos, carpete na cozinha e muito mais. Mas tem também um corredor com discos de ouro para deixar Jay-Z (que escreveu “10 número 1 em seguida, quem pode ser melhor do que eu? Só os Beatles. Eu esmago Elvis Presley em seu sapato de camurça azul”) corado.

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A casa não é tão grande, mas a propriedade é imensa e abriga outras exposições como uma que exibe os carrões de Elvis e seus dois aviões e outra com os filmes do ex-caminhoneiro. Além da sala de discos de ouro, outro destaque é a sala que exibe as roupas da fase Elvis Gordo e mais discos de ouro (referentes à venda dos álbuns do Rei em CD e cassete) e o trecho final, com o túmulo da família – embora teorias conspiratórias insistam que Elvis vive na Argentina, vê jogos do Boca Júniors e come parrilada semana sim, semana não. No gift shop há desde compactos 7 polegadas por 5 dólares até reedições lindas em CD de cada álbum. Ainda assim, deixei o local de mãos abanando (felizmente! A conta agradece).

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Antes disso, na manhã, batemos ponto no mítico Sun Studio, e ali, confesso, não teve como segurar as lágrimas. Quando, após descobrir algumas curiosidades no salão superior (como a história do The Prisonaires, quinteto que gravou um hit pelo selo em 1953 – numa história bastante semelhante a do filme dos Irmãos Coen “E Ai Meu Irmão, Cade Você?”: eles gravaram algemados, com bolas de chumbo presas aos pés e acompanhados por policiais do Estado), a guia (de cabelo azul) dirige os turistas para a sala de gravação que ecoou Elvis cantando “That’s All Right”, Johnny Cash tinindo com “Cry, Cry, Cry”, “Folsom Prison Blues” e “Walk The Line”, Jerry Lee Lewis quebrando tudo com “Great Balls of Fire”, a emoção toma conta.

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Ainda temos mais um dia para admirar Memphis, mas a cidade já nos conquistou, embora nos assuste. Diferente do parque de diversões sertanejas que é Nashville, Memphis te olha nos olhos e quer resposta. Acredito que New Orleans também deva ser assim, mas estou feliz de estar numa das cidades que foram berços do rock and roll, um estilo de música grisalho, como as centenas de pessoas que fazem esse mesmo roteiro turístico que estou fazendo, e que também deve ter mudado a vida delas como mudou a minha. Se eu devo alguma coisa à música (e devo muito), Memphis era um lugar que eu precisava realmente conhecer. E não há como escrever isso sem estampar um sorriso por estar aqui.

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Leia mais: Diário de Viagem Estados Unidos 2013 (aqui)

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