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Histórias de Viagem: Um hotel e Cherry Coke

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Minha primeira vez em Paris começou com o pé esquerdo. Foi em um longo mochilão, em que por razões de economia, optei por pegar um voo de Madri (Barajas) para Paris às 6 da manhã por uma companhia barateira. Ou seja: cochilei durante a madrugada no aeroporto (lotado), e cheguei em Paris (Beauvais) às 8 da manhã – Beauvais é uma pequena cidade vizinha a Paris que atende voos da Ryanair.

Após quase 50 minutos de ônibus de Beauvais para o centro de Paris, comecei minha aventura francesa sofrendo para comprar o ticket de metrô (eu queria o de uma semana, mas na primeira tentativa só consegui fazer a senhora atendente me vender o unitário mesmo), e parti dali até o albergue que eu havia reservado via Hostel Word, o 3-Ducks, no 15º distrito, pertinho da Torre Eiffel.

Ao entrar no hostel, passado 10 horas da manhã, começou o sofrimento. Detonado pela noite mal dormida, eu só pensava em banho e cama. Queria tirar um cochilo e colocar a mala em algum locker antes de bater perna pela cidade luz. Primeira decepção: o 3-Ducks tem um horário de limpeza dos quartos de 11h até às 16h. Isso mesmo: nenhum quarto fica liberado neste horário (mesmo que você o reserve para uma semana – como eu havia feito).

Depois de argumentar bastante (e ouvir muita contra-argumentação; os franceses adoram), cansado e puto, pedi para guardar minha mala em um locker. Outra surpresa: não havia locker nem armário, mas sim uma sala de livre acesso a todos com todas as malas e mochilas de todos os hospedes. Eu já estava viajando há 30 dias, com uma mochila enorme, e duas mochilas menores (uma delas apenas com CDs comprados), e não havia a mínima condição de deixar as coisas ali.

Pedi para ir ao quarto, aproveitando o pouco tempo que havia antes das 11h, e tomar um banho. Mais uma surpresa negativa: o chuveiro era terrível. Voltei ao quarto extremamente puto, decidido a arrumar as coisas e ir embora, quando um japonês, de New Jersey, (percebendo meu “bad day”) salvou o dia: “Percebi que você está tenso. Você tem um mapa? Faz o seguinte: nos estamos aqui. Pega a Rua do Commercio que você vai sair na Torre Eiffel. Depois atravessa, vai no Arco do Triunfo e desce a Champs Elysees. Seu dia irá melhorar”.

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 E melhorou. Levei comigo a mochila de CDs, que deixei em um locker de metrô, cochilei em um passeio de balsa no Rio Sena (lembra do “Antes do Por-do-Sol”?) e decidi que iria procurar um hotel no dia seguinte. Durante a noite, até cogitei passar toda a estadia no 3-Ducks, mas não tinha como. Na manhã seguinte bati perna no 15º distrito, olhei alguns hotéis e acabei optando por um de… 1 estrela. No Mondial Hotel. E foi a melhor coisa que eu poderia ter feito.

Acho que paguei 38 euros por dia (a atendente, esforçada, entendia mais espanhol que inglês), mas o quarto (no quinto andar – sem elevador) era simples, limpo e aconchegante. Típico de Paris: havia pia e chuveiro, mas não vaso sanitário, que ficava no corredor (em muitos hotéis são assim). Lembrei-me de Paul Auster em “O Inventor da Solidão”. E sorri. Aquele seria o meu cantinho em Paris durante a próxima semana, e Paris (apesar do 3-Ducks) já tinha me conquistado no primeiro dia.

Havia uma estação de metrô na porta (La Motte-Picquet – Grenelle?, que virou a minha estação Nelson Piquet – não tinha como esquecer), mas uma caminhada direta de 10 minutos pelo Boulevard de Grenelle (uma longa avenida) me colocava de frente com a Champ de Mars, e consequentemente com a Torre. A região, repleta de bistrôs e alguns bares escoceses, demorava a dormir, o que permitia jantar mais tarde, ou encarar um bom pint de Jenlain, a melhor cerveja francesa (quase na fronteira com a Bélgica, mas é francesa!).

Durante o dia fiquei freguês de uma vendinha ao lado do hotel. Redescobri a Cherry Coke, e acho que nesse período bebi mais o refrigerante do que água. Em uma das tardes, após voltar do Louvre, abri a geladeira da vendinha, e havia apenas duas. Fiquei na dúvida se pegava ambas, mas levei só uma torcendo para que a outra ficasse até a manhã seguinte. Bobagem: quando entrei na vendinha no outro dia, o dono (um senhor grisalho, quieto e sério) me olhou, sorriu e mandou um “more Cherry Coke”: ele havia reposto a geladeira. Abri um sorriso, peguei o refri e, ainda, um pacote de madeleines.

Quando voltei a Paris no ano seguinte, pensei seriamente em reservar esse mesmo hotel, mas descobri um apartamento aconchegante em Les Halles (esse aqui), numa travessa da mítica Rua Montorguei (que já havia sido pintada por Monet em 1878 – olhe aqui), e foi paixão a primeira estadia (e a hospedagem mais barata de toda aquela viagem). Possivelmente nunca volte a ficar no Mondial Hotel, mas sempre vou me lembrar dele (e da Cherry Coke), pois ele salvou a minha primeira passagem pela cidade.

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Leia também:
– Histórias de Viagem: D’akujem (aqui)
– Diário de Viagem Europa 2008: 40 Dias (aqui)
– Diário de Viagem Europa 2009: 37 Dias (aqui)
– Top 15 Museus: L’Orangerie, D’Orsay e mais (aqui)
– Cinco fotos: Paris (aqui)
– “Se Bardot fosse engarrafada, seria a Jenlain Six” (aqui)
– Uma foto de viagem e outras lembranças (aqui)
– Quatro itens para economizar em Paris (aqui)
– Paris: um festival de cheiros, cores e sabores (aqui)
– Coisas sobre Londres e Paris (aqui)
– “Parri, Parri” (aqui)
– Nem Sadine, nem o anao de jardim… (aqui)
– Pere Lachaise: Sobre Oscar Wilde e Jim Morrison (aqui)

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