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Música: “Intimacy”, Bloc Party

Kele Okereke está procurando arduamente, mas ainda não conseguiu traduzir fielmente em música aquilo que traz na alma. “Intimacy”, terceiro trabalho de sua banda lançado virtualmente em agosto (nas lojas só em outubro), é o típico álbum de transição, cuja indefinição de rumo atira para todos os lados. A culpa, neste caso, pode ser jogada sobre os produtores do disco: Paul Epworth moldou a estréia da banda, destacando riffs metalizados; Jacknife Lee produziu o segundo álbum injetando eletrônica na mistura. Juntos, os dois parecem não querer brigar por terreno, e o repertório cede aos dois lados.

Discos de transição são estranhos por natureza. A banda está caminhando, mas ainda não ainda colocou os pés no chão, então o registro flagra o grupo no ar, flutuando sobre diversas nuvens e tempestades que os arrastam para cá e para lá. No caso do Bloc Party, a influência máxima parece ser “Kid A”, disco (forçado) de transição do Radiohead, um break necessário na escadaria que levava a banda ao céu – sem que os integrantes soubessem realmente se era isso mesmo que queriam. Kele parece ainda não saber o que quer, então mistura tudo. O resultado, apesar de esquizofrênico, surpreende.

“Intimacy” abre com “Ares”, uma porrada incendiária que ousa misturar Chemical Brothers com Prodigy (como ninguém nunca pensou nisso antes?). Guitarras no talo ameaçam deixar ouvintes desatentos surdos enquanto a bateria atropela e Kele dança ao som das sirenes e deseja declarar uma guerra. “Mercury”, o primeiro single de forte batida eletrônica, apóia-se em astrologia: quando Mercúrio está retrogrado, a natureza do planeta muda radicalmente, e aquilo que era para ser rápido pode sofrer atrasos devido a fatores diversos. “Este não é o momento para iniciar um novo amor”, avisa Kele.

“Halo”, terceira faixa, deixa a eletrônica de lado e remete às primeiras canções da banda, com bateria sincopada, guitarras cortantes no refrão e vocal gritado. “Biko” é uma desesperada canção de amor que abre com dedilhados de guitarra até receber pontadas de eletrônica que soam estranhas casadas com a letra dramática: “Meu amor era forte o suficiente para lhe trazer de volta dos mortos / Se eu pudesse comer seu câncer, mas eu não posso”. Em “Trojar Horse”, o Bloc Party de “Silent Alarm” volta a dar as caras. Clima nervoso que seduz com um riff circular de guitarra na entrada, que salta à frente no refrão.

A baladinha eletrônica sonhadora e ordinária “Signs” poderia ser um lado b de “Kid A” enquanto “One Months Off”, com guitarras metalizadas e alfinetas de eletrônica (o mais próximo que os produtores conseguem chegar de unir os dois lados da banda numa mesma canção), é mais uma das músicas do álbum que fariam bonito no disco de estréia do quarteto. Chega a ser engraçado como a banda alterna aquilo que acredita ser seu passado e futuro, um karma contra o qual não podem lutar, e se entregam quase que matematicamente. Desta forma, então, natural que a próxima faixa, “Zepherus”, com um coral vocal climático dispensável, seja arrastadamente eletrônica.

Em “Better Than Heaven”, os dois mundos novamente parecem querer se aproximar, mas a canção apenas sugere isso, não realizando o encontro, e sim repartindo a melodia em duas partes (como a banda fez com o próprio álbum). A letra cita uma passagem da Bíblia – Corinthians (15:22) – e crava: “Verdade é verdade”. “Ion Square”, faixa que encerra “Intimacy”, tem letra inspirada no poema “I Carry Your Heart with Me”, de EE Cummings, e uma batida eletrônica repetitiva que testa a paciência do ouvinte ultrapassando os seis minutos de duração (parabéns para quem conseguir chegar ao final).

Kele Okereke está procurando arduamente uma forma de se expressar no cenário pop, e entrega sua intimidade em um álbum que supera o tropeço de “A Weekend In The City”, mas não define rumos para a banda. “Intimacy” é meio guitarreiro, meio eletrônico e totalmente dolorido tematicamente. Suas letras narram paixões fracassadas em que a falsa felicidade dá as cartas (”Eu amo a minha mente quando estou fodendo você”, “Eu poderia dormir para sempre porque verei você em meus sonhos novamente”, “Em qualquer bar, em todo o mundo, você poderá escolher outro estranho e se apaixonar”, “Paralise-me com o seu beijo, limpe essas mãos sujas em mim, talvez estejamos procurando a mesma coisa”) num disco de transição que merece atenção.

Em tempo: o Bloc Party disponibilizou no dia 10/09 em seu site oficial a música “Talons”, segundo single de “Intimacy” que não havia sido liberado quando do lançamento virtual do álbum, mas fará parte da versão fisica do disco.

“Intimacy”, Bloc Party (Wichita)
Preço: US$ 10 apenas em MP3; US$ 20 em CD e MP3 (blocparty.com)
Nota: 7,5

 

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